O Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro (RJ) moveu uma ação civil pública que aponta a inconstitucionalidade de item do edital do concurso da Polícia Federal, que prevê a eliminação do candidato pelo exercício passado da prostituição, pela prática de “ato atentatório à moral e aos bons costumes” e de “outras condutas que revelem a falta de idoneidade moral”. O concurso oferece vagas para delegado de polícia, perito criminal, agente de polícia federal, escrivão e papiloscopista.
No item 6 do edital, consta serem “fatos que afetam o procedimento irrepreensível e a idoneidade moral inatacável do candidato”: a “prostituição” (inciso V); a “prática de ato atentatório à moral e aos bons costumes” (inciso VI) e “outras condutas que revelem a falta de idoneidade moral do candidato” (inciso XIII).
No item 7 do mesmo edital, consta que “será passível de eliminação do concurso público, sem prejuízo das sanções penais cabíveis, o candidato que: (…) VI – tiver sua conduta enquadrada em qualquer das alíneas previstas no item 6 deste anexo”
Para o MPF, o item é inconstitucional em razão do emprego de “expressões vagas, carregadas de subjetivismo e discriminatórias”. De acordo com a ação, o STF já declarou que “o Legislador não pode escudar-se em uma pretensa discricionariedade para criar barreiras legais arbitrárias e desproporcionais para o acesso às funções públicas”.O MPF evidencia também que o Superior Tribunal de Justiça decidiu que não se pode negar proteção jurídica aos que oferecem serviços de cunho sexual em troca de remuneração, desde que essa troca de interesses não envolva incapazes, menores de 18 anos ou vulneráveis e desde que o ato sexual seja consentido. De acordo com o Código Brasileiro de Ocupações de 2002, a atividade relacionada ao comércio sexual do próprio corpo não é ilícita e que, portanto, é passível de proteção jurídica.
“Uma vez que a prostituição é atividade perfeitamente lícita e regulamentada, não está a autoridade administrativa autorizada a estabelecer qualquer tipo de discriminação com relação a outras profissões igualmente regulamentadas”, diz a ação.
Para o procurador da República Sergio Gardenghi Suiama, que assina a ação, a União não está autorizada a estabelecer no edital do concurso qualquer tipo de discriminação com relação a outras profissões igualmente regulamentadas. “Em que pese a relevância de se impedir o ingresso de pessoas que mantenham vínculos com atividades e redes ilegais, o critério de discriminação indicado no edital não guarda relação com o finalidade do ato, pois o edital, objetivamente, não impede o ingresso de pessoas que mantenham vínculos com redes ilegais que circundam a prostituição, mas sim o de candidatos que sejam ou tenham sido profissionais do sexo, discriminação vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro”, afirma o procurador.
A ação do MPF pede que a União deixe de incluir critérios de discriminação que não constem de lei em sentido formal ou que sejam constitucionalmente vedados ou excessivamente abertos ou subjetivos.
Confira aqui a íntegra da ação.
O concurso
O concurso contou com 147.744 candidatos inscritos. As primeiras provas foram aplicadas em 14 de setembro. O cargo com o maior número de inscritos foi o de agente de polícia, com 92.671 cadastros, seguido pelo cargo de delegado, com 17.816 participações.
Estão em jogo 500 vagas, sendo 150 são para delegado, 60 para perito criminal, 180 agente, 80 para escrivão e 30 para papiloscopista. Os salários iniciais vão de R$ 11.983,26 e R$ 22.672,48, para jornadas de trabalho de 40 horas semanais.