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Na natureza, não é incomum que animais criem, como seus, filhotes que pertencem a outras espécies. Uma pesquisa da bióloga Susan Lingle, especialista em cooperação animal na Universidade de Winnipeg, no Canadá, constatou que fêmeas respondem rapidamente ao ouvirem o som de choro de espécies diferentes das delas (inclusive de bebês humanos), e correm para o local de onde ele parece vir. Além disso, Lingle publicou um estudo na revista Naturalist descrevendo como cervos defendem uma subespécie geneticamente diversa sem que, aparentemente, leve alguma vantagem nisso. Também já foram relatados vários casos de animais em cativeiro que “adotaram” outros. Koko, uma gorila que viveu até os 46 anos no Zoológico de San Francisco, nos EUA, ficou famosa por criar um gatinho como filho: carregava no colo, alimentava e até tentava amamentar.
Ainda que muita gente ainda torça o nariz para isso, não é apenas no mundo selvagem que animais de outras espécies são adotados. Que o digam as “mães de pets”, para quem é natural criar gatos e cachorros, por exemplo, como se fossem filhos. Mais uma vez, a ciência já investigou o assunto. Um estudo publicado na mais importante revista científica do mundo, a Science, demonstrou que, ao olhar para o animal que cuida, a mulher produz ocitocina, o “hormônio do amor”, relacionado à criação de vínculos sociais. Os cães também têm esse hormônio, e a mesma pesquisa, da Universidade Azabu, no Japão, comprovou que eles, igualmente, aumentam a produção da substância ao trocar olhares com os tutores. Nos Estados Unidos, um estudo do Hospital Geral de Massachusetts mostrou que, ao olhar fotografias de seus pets, mulheres tinham as mesmas regiões cerebrais ativadas comparado a quando viam fotos de seus filhos humanos. Já diante de imagens de crianças e animais aleatórios, essas áreas, associadas às emoções, não eram ativadas.
Mãe de pet também é mãe? “Sim”, diz o médico psiquiatra Diego Marques, em entrevista ao blog. A mente humana, segundo ele, não quer saber se é um filho biológico ou um animal: o que ela identifica são sensações. “A certeza da realidade externa não é julgada pela psique, apenas as sensações. Então, seja um pet, seja um filho biológico, adotivo, um sobrinho de grande afeto… a psique interpreta como o amor, que é onde se liberam as substâncias, sendo que a principal relacionada ao afeto é a ocitocina. Então, quando a gente vê níveis elevados de ocitocina serem liberados em mulheres que se encontram com seus pets, a gente correlaciona o mesmo neurotransmissor do afeto, do amor, que as mães também liberam na maternidade, principalmente no processo de amamentação. Então, sim, pai de pet é pai e mãe de pet também é mãe”, afirma.
A bacharel em direito Domitila Gomes concorda plenamente. Ela enxerga o dachshund Fubá e a lhasa apso Amora como filhos e não abre mão do título de “mãe de pet”. “Me considero mãe de pet porque eu cuido, amo, me dedico. São mais importantes que tudo para mim”, afirma. Sobre pessoas que discordam que mãe de pet é mãe, Domitila é taxativa: “São pessoas que não entendem esse amor, não sei se não tiveram esse vínculo durante a vida, ou só falta compreensão mesmo”.
A médica veterinária Joana Barros lembra, porém, que, para o bem-estar do próprio animal, os tutores precisam respeitar o fato de que eles não são humanos. “Quando afastamos os cães e gatos de sua natureza e de sua família e os colocamos simbolicamente em posições que não lhe pertencem (como a posição de filhos) podemos causar doenças físicas e emocionais”, afirma. “Cães e gatos precisam ter contato com a natureza, são carnívoros e precisam de alimentação adequada para a espécie, precisam de estímulo de caça (nem que seja em brincadeiras). Humanizar e querer que eles sejam como crianças não é amar, afinal, amor é respeito”, destaca.
“Isso não significa que nós não possamos chamar nossos pets de filhos, mas que precisamos respeitar o lugar deles na família e lembrar que eles também têm mãe e pai. Portanto: ame! Reconheça que seu pet é de uma espécie diferente da sua e que também tem uma ancestralidade diversa, apesar de estar inserido na sua família”, diz a médica veterinária.
Diego Marques também ressalta a responsabilidade de criar um animal. “Temos que perceber que cuidar de um pet gera responsabilidade, entender que todo bônus também, muitas vezes, vem de ônus ou renúncia sobre alguns aspectos. Se viajar, precisa se pensar, se passa muito tempo fora de casa, pensar com quem esse pet poderia passar o tempo. Todas essa logística que um filho também necessitaria. Então, deve-se lembrar da responsabilidade de se cuidar de um pet”, diz.
O psiquiata lembra que o bônus de ter um filho pet é grande. “Sabemos que os animais têm se demonstrado positivos para vários adoecimentos emocionais. Um deles é a depressão”, diz. Ele lembra que, na pandemia, o contato com o pet ajudou muita gente a enfrentar melhor esse período sombrio. “Foi uma oportunidade, inclusive, pra muitas pessoas que não se permitiam ao amor, ao cuidado de um pet inicialmente. Aquelas pessoas que se permitiram a esse cuidado vivenciaram um isolamento menos isolado, como eu costumava dizer.”
A todas as mães de pet, um feliz dia das mães!