Depois de 2 meses, papagaio volta para casa

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No fim ano passado, recebemos o email do leitor Mauro Burlamaqui, pedindo ajuda para divulgar o sumiço de Benta, papagaio congo que desapareceu do Guará I. Pois Benta voltou para a alegria da família. A saga da bichinha, que passou dois meses “avoando” por Brasília, mereceu uma crônica escrita por Mauro, que é jornalista. Na história, que ele compartilha com o blog, Mauro conta como Benta foi encontrada, depois de confundida com um pombo no bairro do Sol Nascente, em Ceilândia. Divirta-se!

Benta e Mauro: final feliz para a família Crédito: Arquivo pessoal
Benta e Mauro: final feliz para a família Crédito: Arquivo pessoal

 

A volta ao Lar da Benta (a prometida história completa)

Por Mauro Burlamaqui

– Sr. Mauro?
– Sim, sou eu…
– Boa tarde! Aqui é da polícia civil…

(Gelo – o que foi que eu aprontei que não consigo nem lembrar?!?)

Foi assim que começou a viagem de volta da papagaia Benta ao seu lar, depois de quase dois meses perdida pela cidade. Era começo da tarde de sexta-feira, 16 de fevereiro último, recém tinha chegado ao trabalho. O agente, que falava pausado, perguntou-me se eu tinha perdido algum animal de estimação recentemente.

– Siiim, um papagaio…, respondi de pronto.
– Certo. Mas… que tipo de papagaio?, 
perguntou o agente.
– Um papagaio do congo, africano, cinzento.
– Uhmmm, certo, certo. Pois é, senhor Mauro. Parece que ele foi encontrado.

(Novo gelo, agora de pura emoção)

O policial contou que a ave estava na Ceilândia, ou no Sol Nascente. E que iria, então, marcar com a pessoa que a achou para nos encontrarmos. E que me retornaria depois.
A torrente de emoções que me tomou por inteiro é indescritível. 50 dias depois de seu desaparecimento, essa notícia. Assim, de repente!

Assumo que fiquei em estado de choque, mas também com muito receito. Seria um trote? Afinal, eu tinha espalhado cartazes pela cidade com a foto da Benta, meu nome e meu telefone. Mas, espera um pouco, o agente me ligou no telefone do trabalho. Então podia ser fato. Procurei na internet e vi que o telefone anotado no bina era o mesmo que constava da página da Delegacia do Meio Ambiente. Então não parecia ser trote. A Benta podia ter sido encontrada. Exatos um mês e 19 dias depois de se perder, ela podia estar voltando.

O agente retornou a ligação poucos minutos depois, dizendo que tinha feito contato com a pessoa que encontrou a ave e pediu-me que fosse à delegacia na segunda-feira, às 13 horas, levando a documentação e fotos com a papagaia, se tivesse.

E pronto. Foi o pontapé inicial para um fim de semana de ansiedade total. Seria a Benta mesmo? Será que estava bem? Ou estaria machucada, assustada, traumatizada? A pessoa iria mesmo levá-la para a Delegacia? Iria pedir alguma recompensa para devolver o animal? Foram três longos dias de questionamentos rondando a cabeça, a mil.

Foi mesmo muita agonizante a espera. Achei melhor não contar para ninguém. Podia não acontecer o que esperava, e apenas geraria expectativa em pessoas queridas, que tanto se dispuseram a ajudar.

Na segunda, como combinado, chegamos eu e minha esposa à delegacia às 13 horas. Ansiedade vazando pelos poros. E logo um banho de água fria: o agente que havia me contatado disse que a pessoa que encontrou a ave não pode comparecer na delegacia. Mas que ficássemos tranquilos que iríamos juntos até onde ela estava, para buscá-la. Primeiro, é claro, conferiu os documentos da Benta, olhou algumas fotos da papagaia comigo e com a Luciane, que estavam no meu celular, para se certificar de que era a ave que eu procurava.

Tudo confirmado, foi aí que começou a parte aventureira do retorno de Benta. De acordo com o agente, Benta estava na casa de uma senhora que mora no Sol Nascente – para quem não é de Brasília, dizem que se trata de uma das maiores favelas do país, e os jornais contam histórias de que é um lugar inseguro a não poder mais, onde nem os carteiros têm coragem de entregar correspondências, tamanha a insegurança.

O bairro fica a menos de 30 quilômetros do centro da cidade. Nem é tão longe assim mas, realmente, é um lugar que aparenta não ter qualquer segurança. Sol Nascente tem a maior parte das suas ruas de terra batida, muito esburacadas, sem indícios de existência de sistema de escoamento de esgoto, sem rede de iluminação. Durante o trajeto, não vi um único policial ou uma viatura. Em suma, sem a menor presença do Estado. Com certeza, andar sozinho por ali, qualquer hora do dia, sem conhecer o lugar, não parece ser uma boa ideia. Foi a sensação que tive.

Por sorte, fomos no carro da delegacia, acompanhados de três agentes da polícia civil. Durante o trajeto, que durou cerca de uma hora, uma agente começou a nos contar a história. A tal senhora era moradora do Sol Nascente desde quando o local não tinha casas – na época, era uma área de chácaras. Funcionária pública aposentada, ela viu o bairro crescer, desorganizadamente e, por sua condição socioeconômica, passou a ser uma espécie de salvadora da pátria do local. Ela é conhecida por cuidar de pessoas doentes, levar pessoas a hospitais, ajudar a comprar remédios, cuidar dos filhos de pessoas que precisam sair, cuidar de animais da região.

Daí que, pelo que contou a agente, parece que outra pessoa havia encontrado a papagaia, aparado suas asas, e a deixado no muro da casa da senhora, sobre o canil. Disse que não sabia quem, nem quando, nem o que aconteceu até essa data. Esse mistério teremos que carregar para o resto da longa vida da Benta.

Dona Graça, como é conhecida, foi quem continuou contando a história, assim que chegamos em sua casa. Disse que na terça-feira de carnaval (coincidentemente, dia do meu aniversário), quando acordou e foi olhar o terreno, avistou um pombo estranho no muro. Chegou mais perto para conferir e reparou que a ave não levantou voo para fugir. Ela, então, se aproximou mais e mais, até estar perto o suficiente para oferecer a mão para a ave, que de pronto se apoleirou na querida senhora. Dona Graça, então, levou a ave para a varanda e a colocou em uma gaiola que tem por ali, oferecendo comida – a mesma que serve para suas galinhas, que andam soltas pelo terreno.

Passaram-se dois dias até que Dona Graça, ainda curiosa com o pombo, decidiu ligar para uma amiga, exatamente a agente que trabalha na delegacia de proteção ao meio ambiente – e que nos acompanhava nessa diligência policial para recuperação da conguinha perdida. A policial, então, pediu que dona Graça enviasse, pelo celular, uma foto da tal pomba. Ao ver a imagem, a agente reparou na anilha presente na pata e pediu que a senhora informasse o código que estava escrito.

Pronto. A partir daí tudo foi aparentemente tranquilo. Os investigadores da delegacia pesquisaram os bancos de dados, a partir do código inscrito na anilha, e conseguiram meu contato.

– Sr. Mauro?
– Sim, sou eu…
– Boa tarde! Aqui é da polícia civil…

(Gelo)

Foram exatos 53 dias perdida pela cidade. Uma ave exótica, que não existe na natureza aqui no Brasil, nascida em criadouro legalizado, criada sempre à mão, com menos de um ano de vida – um bebê ainda. As chances de sobreviver todo esse tempo longe de casa, sem comida e água à disposição e proteção contra predadores, sol e chuva, eram mínimas.

Mas as pessoas que foram se interligando – a pessoa que colocou Benta no muro de uma boa senhora que por sua vez conhecia uma agente da delegacia do Meio Ambiente que por sua vez se empenhou, junto com os colegas, para fazer com que ela retornasse a seu lar, fazem-me quase crer que um milagre se operou.

Agradeço à doce senhora, aos agentes da Delegacia Especial de Proteção ao Meio Ambiente (DEMA) e aos amigos que compartilharam a história pelo Facebook e tanto torceram e oraram para esse final feliz.

Ah, só para conhecimento, Benta está ótima, cheia de saúde, carinhosa e gentil como sempre foi. E, aparentemente, super feliz e aliviada por estar de volta ao seu lar.