Por Daniel Augusto Teixeira de Miranda e Luís Cláudio Casanova*
Quando a pandemia de COVID-19 assolou o mundo, muitas foram as alternativas que surgiram buscando a garantia de emprego. Dentre essas várias soluções (redução de jornada, de salário, suspensão do contrato), a concessão de férias antecipadas foi amplamente utilizada.
Ainda na esteira desse evento inesperado, empresas dos mais diversos ramos foram afetadas por uma redução no fornecimento de produtos e mão de obra.
Mais recentemente, ainda em razão dos eventos que atingiram o mundo, várias montadoras de automóveis anunciaram a concessão de férias coletivas aos seus empregados, em antecipação, em razão da baixa atividade econômica.
Na busca de garantir o emprego em hipóteses de calamidade pública, entrou em vigor Lei 14.437/22.
Direito Constitucional a férias remuneradas
A Constituição (art. 7º, XVII) e a CLT (art. 129 e ss.) preveem o direito de 30 dias de férias remuneradas por ano trabalhado. Ou seja, a cada 12 meses trabalhados (período aquisitivo), o empregado terá o direito de gozar, no ano seguinte (período concessivo), de 1 mês de férias remuneradas e acrescidas do adicional de 1/3. Certamente existe também o direito de o empregado “vender” 10 dias de suas férias, mas essa possibilidade não influi na questão que apresentamos.
Ou seja, os empregados que cumprirem seus períodos aquisitivos entre 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2023, terão o direito a 30 dias de férias remuneradas no ano de 2024, em seus respectivos períodos concessivos, de fruição. Vale relembrar, que as férias poderão ser dividias em até 3 períodos distintos.
Caso as férias não sejam usufruídas no ano subsequente, com a acumulação de dois períodos aquisitivos, o empregador deverá pagar o valor correspondente ao mais antigo deles, em dobro (!), a título de indenização ao empregado. Assim, a lei prevê um período máximo de 2 anos de trabalho ininterrupto aos empregados, sob pena de multa ao empregador e o dever do pagamento em dobro.
Férias antecipadas e direito ao repouso
Conforme mencionado acima, muitos foram os casos em que os empregados, em razão de pandemia, dificuldades econômicas, calamidade púbica ou falta de insumos, tiveram suas férias antecipadas. Ou seja, mesmo sem ter cumprido o período aquisitivo (trabalhado 12 meses), o empregado foi colocado em férias.
O empregado, portanto, ficaria “devendo” ao empregador o complemento do período aquisitivo. Em um cenário normal, bastaria a compensação entre período aquisitivo e concessivo, como ocorre há muito, inclusive.
A perplexidade surge, no entanto, para os casos como acima mencionados em que vários períodos de férias antecipadas foram concedidos aos empregados. Como compatibilizar essa situação com a previsão constitucional que garante o repouso anual?
Uma proposta de solução com base na legislação
Imagine-se, por exemplo, a hipótese em que um empregado teve 3 meses de férias antecipadas pelas mais variadas razões. Nesse caso, em tese, o empregado que teve férias antecipadas poderia ficar até 4 anos trabalhando de forma direta, sem qualquer ilegalidade. Afinal, estaria apenas “pagando” os períodos aquisitivos antecipados.
É totalmente razoável a expectativa da empresa de que, em um momento de reaquecimento econômico, o empregado compareça e exerça as suas atividades pelo período necessário para compensação das férias já antecipadas.
No entanto, em casos de cumulação de férias em antecipação, nos parece que a própria legislação já prevê um limite ao trabalho ininterrupto. Como dissemos, o prazo limite previsto pela CLT entre o início do trabalho e a concessão de férias é de 2 anos (arts. 130 e 134 da CLT).
A sugestão, portanto, é a de que esse limite de 2 anos seja levado em consideração pelas empresas que se encontrem em situações hipotéticas como a que apresentamos, as quais devem buscar entendimento com o Sindicato dos empregados, para juntos encontrarem alternativas que preservem, sobretudo, a saúde física e mental dos empregados.
Como dissemos anteriormente, em casos excepcionais, é recomendado que as empresas e os representantes dos trabalhadores negociem critérios para garantir a compatibilização de suas pretensões.
Assim, à luz da Tese fixada pelo STF, em repercussão geral (Tema 1046), que expressamente indica que “São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis”, poderão, empresa e sindicato dos empregados, definir, por exemplo, novos períodos especiais de descanso, de 5 a 10 dias, mas sem que haja quaisquer pagamentos adicionais, como o 1/3 de férias), até que o transcurso de novos períodos aquisitivos esgote o saldo de férias antecipadas.
Com essa sugestão, ousamos crer que a maioria dos casos estarão solucionados, sem a necessidade de movimentação do já assoberbado Poder Judiciário.
* South America Legal Director na empresa Ford Motor Company e Ford Credit Company
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