Na sabatina de sábado, uma entrevista com o técnico colombiano Francisco Maturana

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Ele levou o Atlético Nacional ao título da Copa Libertadores da América em 1989. À frente da Colômbia, goleou a Argentina por 5 x 0 no Estádio Monumental de Núñez, em Buenos Aires, nas Eliminatórias para a Copa de 1994. Em plena guerra civil, brindou a Colômbia, em casa, com o título da Copa América de 2001.

Campeão das duas competições mais importantes do continente, Francisco “Pacho” Maturana, 67 anos, conversou com o blog sobre a má fase do futebol sul-americano. Ao citar uma frase atribuída a Albert Einstein no conceito de insanidade, dá a receita para que clubes e seleções voltem a competir com os europeus. “Não podemos esperar outro resultado se continuamos fazendo as coisas do mesmo jeito, jogando da mesma maneira, com contra-ataques”, critica na entrevista a seguir. Maturana também fala dos favoritos ao título da Libertadores, da Copa América Centenário, sobre racismo, o talento de Neymar e se emociona ao revelar o técnico brasileiro que o inspirou a ser vitorioso no Atlético Nacional e na seleção da Colômbia.

Quem é ele
Francisco Antonio “Pacho” Maturana Garcia
15/2/1949, Quibdó, Colômbia
Carreira como jogador (zagueiro)
Atlético Nacional (1970-1980), Atlético Bucaramanga (1981), Deportes Tolima (1982) e Seleção Colombiana (1981)
Como técnico: Once Caldas (1986), Atlético Nacional (1977-1990), Colômbia (1987-1990), Valladolid (1990-1991), América de Cali (1992-1993), Colômbia (1993-1994), Atlético de Madri (1994), Equador (1995-1997), Millonarios (1998), Costa Rica (1999), Peru (1999-2000), Colômbia (2001), Al Hilal (2002), Colômbia (2002-2003), Colón (2004), Gimnasia La Plata (2007), Trinidad e Tobago (2008-2009) e Al Nasr (2011-2012)
Principais títulos: Copa Libertadores (1989), Copa América (2001), Campeonato Colombiano (1992), Copa América (2001) e Campeonato Árabe (2001/2002)

MPL – A América do Sul não conquista a Copa do Mundo desde 2002. Itália, Espanha e Alemanha são os últimos campeões. Por quê?
Francisco Maturana – Fomos superados com autoridade por cada um desses países. Eles, indubitavelmente, progrediram, aprenderam a se organizar como times, sem individualidades. Ficamos para trás. Não há mistério. A resposta está sempre no futebol.

MPL – Nos últimos 10 Mundiais de Clubes, a América do Sul só ganhou dois, com o Inter (2010) e o Corinthians (2012)…
Normal. Os nossos melhores jogadores estão nos elencos dos principais clubes do futebol europeu. Ao perdê-los, ficamos mais fracos tecnicamente.

MPL –  América do Sul precisa se reinventar?
Francisco Maturana – A América do Sul não pode esperar outro resultado enquanto continuar fazendo as coisas do mesmo jeito, jogando da mesma maneira, com contra-ataques. O Chile fez algo diferente na última Copa América, com Jorge Sampaoli. Mas é preciso ressaltar que a América do Sul abastece o futebol europeu, asiático, mexicano. É natural que o nível cresça lá fora e empobreça na América.

MPLO que está errado com Argentina, Brasil e Uruguai, as potências do continente?
É difícil emitir um juízo de valor. Eu prefiro que cada país citado por você se faça essa pergunta.

MPL – O Brasil perdeu o respeito?
Francisco Maturana – Respeito não se perde. A forma como se está buscando o resultado é que impõe o respeito. O mundo do futebol respeita a Holanda há 42 anos. O que eles ganharam? Mas todos se recordam da forma como tentaram conquistar a Copa de 1974 e se inspiram até hoje.

MPL – A Argentina tem Messi, mas não é campeã desde 1993. Dá para ser campeão dependendo de um só jogador?
Francisco Maturana – O futebol é coletivo. A presença de um fora de série não garante conquistas. A Holanda teve Johan Cruyff; Portugal conta com Cristiano Ronaldo; a Suécia tem Ibrahimovic… Mas nenhuma dessas seleções que citei ganhou nada.

“Não podemos esperar outro resultado se continuamos fazendo as coisas do mesmo jeito, jogando da mesma maneira, com contra-ataques. O Chile fez algo diferente na última Copa América com Jorge Sampaoli”

MPL – O que está achando da Copa América Centenário?
Francisco Maturana – Começou bem. Os favoritos são Argentina, México e Colômbia, mas não descarto o Chile. Tenho visto os jogos, gosto de aprender em qualquer cenário. Torço para que um país sul-americano seja campeão. A Copa América é nos EUA, mas a festa é do nosso continente.

MPL – Você é o único técnico negro campeão da Libertadores e da Copa América. É um orgulho?
Francisco Maturana – Não sabia, fico honrado.

MPL – Roger Machado, do Grêmio, era o único técnico negro na Libertadores deste ano…
Francisco Maturana – Era o único? Assustador. Precisamos superar isso.

MPL – Você já foi vítima de injúria racial?
Francisco Maturana – Nunca, nem na América nem em canto algum. Mas não posso afirmar que isso não existe.

MPL – Como você, membro do Comitê da Fifa, pode ajudar a combater isso?
Francisco Maturana – É um tema ao qual o futebol tem se dedicado. Mas o futebol é só uma parte da vida, não a origem absoluta dos problemas.

MPL – Por que as Eliminatórias para Copa de 2018 são as mais equilibradas da história?
Francisco Maturana – As distâncias se encurtaram. O trânsito de jogadores sul-americanos na Europa elevou a capacidade individual. Em contrapartida, a falta ou não existência de tempo para trabalhar a parte tática, por exemplo, deixa as seleções sul-americanas reféns da individualidade.

MPL – A Colômbia tem hoje a melhor geração desde aquela sua seleção (Rincón, Valderrama, Asprilla…) que goleou a Argentina por 5 x 0 em Buenos Aires?
Francisco Maturana – Não comparo gerações. Eu costumo dizer que, uma geração, um jogador de futebol, é ele mais suas circunstâncias.

“Para mim, é uma satisfação imensa ser campeão da América em nível de seleção e de clube. São os títulos mais importantes que se pode conquistar na América”

MPL – Foi a vitória mais inesquecível da sua vida?
Francisco Maturana – Como técnico, sim. Quando eu era jogador do Nacional, lembro uma vitória sobre o Cruzeiro, em Belo Horizonte. O Cruzeiro não perdia havia muito tempo e vencemos. O estádio estava cheio. Pensei que nós fôssemos apanhar. Mas, naquele dia, descobri uma coisa: quem entende futebol não agride, aplaude. Nós fomos aplaudidos naquele dia.

MPL – A Colômbia chegou à Copa de 1994 invicta há 24 jogos, mas não passou da fase de grupos. O que deu errado?
Francisco Maturana – Nós fizemos tudo certo e tenho ótimas lembranças. No futebol, não há nada que garanta o êxito. Não é algo pronto, é uma sucessão de fatores e do momento. O futebol que nós jogamos foi insuficiente para avançarmos na Copa. Há quem veja bruxas, fantasmas, mas, para mim, tudo de bom ou ruim passa pelo futebol.

MPL – Na Europa, você passou por Valladolid e Atlético de Madri. Por que não vingou em nenhum deles?
Francisco Maturana – Foram experiências enriquecedoras. Primeiro, em um clube que jamais foi campeão, mas serviu para que eu ganhasse visibilidade. A tal ponto de terminar a temporada com uma sondagem do Real Madrid. Fui para o Atlético, que, naquela época, tinha problemas administrativos. Havia muitas trocas de treinador, não havia estabilidade no emprego.

MPL – Quem é o melhor treinador sul-americano na sua opinião?
Francisco Maturana – Há muito técnicos respeitados aqui e na Europa, mas, para mim, Jorge Sampaoli, pelo legado que deixou no Chile.

“Respeito não se perde. A forma como se está buscando o resultado é que impõe o respeito. O mundo do futebol respeita a Holanda há 42 anos. O que eles ganharam? Mas todos se recordam a forma como eles tentaram ser campeões da Copa em 1974 e se inspiram nela até hoje”

MPL – Qual é a sua análise da Libertadores deste ano?
Francisco Maturana – Vimos times que mostraram um grande futebol, como o Atlético Nacional e o Rosário Central. Mas, nessa fase (mata-mata), não vale o que foi feito, mas, sim, o que se consegue fazer diante de adversários históricos como Boca Juniors e São Paulo. É até difícil fazer uma projeção da final por causa da paralisação para a Copa América. A pausa prejudica todo o planejamento feito até agora.

MPL – O Alético Nacional pode repetir o título de 1989, que tinha você como técnico?
Francisco Maturana – Há muita esperança…

MPL – O Brasil virou um eldorado para os técnicos sul-americanos. Por quê?
Francisco Maturana – O futebol está globalizado há muito tempo. O importante é a capacidade, não o lugar, o país de nascimento. Os brasileiros não perderam o prestígio. Aqui, na Colômbia, costumamos dizer que não há profeta na nossa terra (santo de casa não faz milagre). No futebol, isso é muito comum quando se diz respeito a treinadores.

MPL – Você foi campeão da Libertadores (Atlético Nacional) e da Copa América (Colômbia). É um técnico realizado?
Francisco Maturana – Para mim, é uma satisfação imensa ser campeão da América em nível de seleção e de clube. São os títulos mais importantes no nosso continente.

MPL – O que acha do Neymar?
Francisco Maturana – Vou ser objetivo: está condenado a ser o melhor jogador do mundo nos próximos anos.

MPL – Mas se tivesse de escolher um fora de série para o seu time…
Isso é uma questão de gosto, e gosto é sagrado. Eu gosto do Lionel Messi.

“Deixo a minha admiração e respeito à minha fonte de inspiração: Telê Santana”

MPL – E o treinador?
Francisco Maturana – Pep Guardiola, sem dúvida.

MPL – Você foi jogador, é treinador, mas é formado em odontologia?
Francisco Maturana – Adorei ser jogador. Vou morrer treinador. Mas sou um profissional da odontologia. Trabalhei na profissão por 14 anos. Por respeito a ela e amor ao futebol, eu me dediquei à odontologia durante um período da minha vida.

MPL – Por que James Rodríguez ainda não se firmou no Real Madrid?
Francisco Maturana – Ele é um excelente camisa 10, magnífico, estamos vendo na Copa América Centenário, mas eu costumo dizer que um jogador de futebol é ele e suas circunstâncias. Há algo pessoal.

MPL – Algum treinador brasileiro inspirou a sua caminhada?
Francisco Maturana – Deixo a minha admiração e respeito à minha fonte de inspiração: Telê Santana.

Marcos Paulo Lima

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