Aos 56 anos, o executivo de futebol goiano Marcelo Segurado, 56 anos, é uma das apostas do novo presidente do Goiás, Paulo Rogério Pinheiro, para o processo de reestruturação do clube. Quando assumiu o cargo, em outubro do ano passado, o primeiro desafio do profissional era manter o time alviverde vivo até a última rodada do Campeonato Brasileiro na luta contra o rebaixamento. Isso ainda é possível. A chance de queda é de 93%. Vencer Botafogo e Bragantino, em casa; e o Vasco, em São Januário, é obrigação, mas não basta. Há necessidade de secar Vasco, Bahia, Fortaleza e Sport na disputa contra a queda.
Paralelamente à espera por um milagre, Marcelo Segurado planeja a nova temporada do time. Espera retomar os bons tempos da primeira passagem pelo clube. Na época, levou o Goias ao bicampeonato goiano, ao título da Série B e ao sexto lugar no Brasileirão 2013. O Goiás também chegou à final da Copa São Paulo de Futebol Júnior em 2013.
Na entrevista a seguir ao blog, o executivo formado em sociologia e geografia conta como a ciência o ajuda a lidar com as demandas do dia a dia do Goiás. Um dos responsáveis pela consolidação do Ceará na primeira divisão do Brasileirão, ele fala da amizade com Hailé Pinheiro, pai do atual presidente esmeraldino e critica o atual sistema do futebol brasileiro. Sem papas na língua, detona a “MP do Flamengo” ao chamá-la de ilusão, critica o comportamento esnobe de alguns cartolas nas reuniões entre os clubes na CBF e se posiciona contra a moda de contratar treinadores estrangeiros.
Boa leitura!
A sua primeira passagem pelo Goiás, de 2011 a 2014, levou o Goiás ao bicampeonato goiano em 2012 e 2013, ao título da Série B em 2012 e ao sexto lugar na Série A 2013. É possível repetir ou ir além desse desempenho neste novo ciclo no clube?
Quando assumi em 2011, nós estávamos em um momento delicado, na parte inferior da tabela na Série B. Fizemos alguns ajustes, conseguimos a permanência e chegamos até a brigar pelo acesso à Série A. A partir disso, montamos um planejamento para 2012 e 2013 que gerou ótimos resultados. Apesar da situação na tabela neste ano ser parecida, as dificuldades fora de campo são maiores. Para conquistarmos um ciclo vitorioso, nós iremos, com o suporte do presidente Paulo Rogério Pinheiro, realizar um planejamento para profissionalizar o clube, melhorar a infraestrutura e aprimorar a parte tecnológica do Goiás, para colhermos bons frutos esportivos e administrativos nos próximos anos.
O que o motivou a retornar ao Goiás como executivo de futebol em parceria com o Harlei?
Ao receber o convite do senhor Hailé Pinheiro, conversamos sobre o clube. O que me motivou foi o desafio de tentar manter o Goiás na primeira divisão. Quando assumimos, o time era o último colocado, com uma distância de 12 pontos para o primeiro fora da zona de rebaixamento. Nós buscamos estabelecer uma estratégia para potencializar as nossas chances. Reduzimos o elenco, ajustamos alguns detalhes e continuamos acreditando na permanência do clube na série A para a próxima temporada.
Quando o senhor assumiu, em 2011, o Goiás estava à beira da Série C. Agora, arrisca cair para a B. Qual foi o momento mais delicado?
O momento atual é o mais delicado. Nós fizemos a reestruturação do nosso elenco em três meses, com poucas opções de contratação. Trouxemos cinco reforços, subimos jogadores da base e dispensamos aproximadamente 20 atletas que não tinham identificação com o clube e não mereciam vestir a camisa do Goiás. Reestruturar o time durante a temporada é algo muito complexo. Foi preciso muito empenho e dedicação.
O senhor deixou o Goiás em 2014. Como foram as experiências fora do clube e o período de aperfeiçoamento profissional?
Em 2014, nós fizemos um campeonato sem sustos, tranquilo. A base do time foi formada pelo nosso sub-20, vice-campeão da Copa São Paulo de 2013. Era um momento de reestruturação financeira do clube, com poucos investimentos, e nós fizemos uma boa campanha. Após a minha saída, fiz cursos de gestão, intercâmbios em clubes para agregar conhecimento, e me preparei durante dois anos, na expectativa de novas oportunidades. Em 2016, eu recebi o convite para fazer parte do planejamento e reestruturação do Ceará, que, hoje, colhe ótimos resultados, consequentes da sua estruturação. Vale lembrar que, no Ceará, fui bicampeão em 2017/2018, conseguimos o acesso depois de 10 anos e também a permanência pela primeira vez na Série A por quatro anos consecutivos.
Após a minha saída, fiz cursos de gestão, intercâmbios em clubes para agregar conhecimento, e me preparei durante dois anos, na expectativa de novas oportunidades. Em 2016, eu recebi o convite para fazer parte do planejamento e reestruturação do Ceará, que, hoje, colhe ótimos resultados, consequentes da sua estruturação. Vale lembrar que, no Ceará, fui bicampeão em 2017/2018, conseguimos o acesso depois de 10 anos e também a permanência pela primeira vez na Série A por quatro anos consecutivos
Qual é o seu projeto para o Goiás?
Meu projeto a curto prazo é lutar pela permanência na Série A. Quando nós chegamos estava difícil de enxergar uma luz no fim do túnel, mas hoje isso se tornou possível. A médio e a longo prazo, a nossa ideia é não repetir erros que são comuns no futebol brasileiro. Utilizaremos critérios rígidos e bem definidos para a contratação de jogadores, escolha de comissão técnica e staff. A potencialização das áreas de tecnologia e informação do clube e qualificação dos nossos profissionais também são prioridades para a nossa gestão. Nosso plano é aproveitar melhor a nossa base. O Goiás é um clube formador, com uma estrutura excepcional, cultura de lançar novos craques no mercado do futebol. Sendo assim, o nosso planejamento, estando na Série A ou na B, será de contratações pontuais, uso de atletas da base, qualificação de profissionais e investimento em tecnologia e informação.
Glauber Ramos e Augusto continuarão no clube ou o Goiás irá ao mercado?
O Glauber e o Augusto estão fazendo um trabalho que dificilmente seria realizado por outros treinadores. A reformulação foi feita com jogadores da base que eles já conheciam. Isso tornou a aquisição de resultados mais rápida. Sou contra a troca rápida de treinadores. Quando você contrata um técnico, precisa ter convicção no trabalho desse profissional. O clube precisa traçar seus objetivos e buscar profissionais que se encaixam nesse perfil. Eu acompanho o trabalho da nossa comissão, é muito bem feito, e eu acredito muito no sucesso deles no mercado brasileiro.
Meu projeto a curto prazo é lutar pela permanência na Série A. Quando nós chegamos estava difícil de enxergar uma luz no fim do túnel, mas hoje isso se tornou possível. A médio e a longo prazo, a nossa ideia é não repetir erros que são comuns no futebol brasileiro. Utilizaremos critérios rígidos e bem definidos para a contratação de jogadores, escolha de comissão técnica e staff. A potencialização das áreas de tecnologia e informação do clube e qualificação dos nossos profissionais também são prioridades para a nossa gestão. Nosso plano é aproveitar melhor a nossa base
O Goiás nunca teve treinador estrangeiro. O senhor é a favor da moda que pegou no Brasil com o sucesso de Jorge Jesus, Abel Ferreira e Jorge Sampaoli?
Quanto à contratação de estrangeiros, eu sou contra qualquer tipo de modismo, mas entendo que eles agregam conhecimento ao nosso futebol com novas ideias e filosofias. O Jesus, o Abel e o Sampaoli vieram para equipes de boa estrutura, com bons times, e conseguiram ótimos resultados. Outros estrangeiros não tiveram o mesmo sucesso. Nós temos bons profissionais no Brasil e fora, mas a mentalidade de futebol profissional por aqui, baseada no resultado, precisa ser reformulada. Alguns treinadores brasileiros jogam pelo próximo jogo, porque se eles não tiverem um bom resultado, serão demitidos. A construção da ideia atual, baseada no resultado, e a crença de que se o time ganhou está tudo perfeito e se perdeu está tudo errado precisam mudar. Isso passa pelos dirigentes, torcedores e pela imprensa.
O Goiás é a maior potência do Centro-Oeste, mas passa por um momento financeiro difícil. Quais são os seus planos para ajudar a amenizar a crise econômica do clube?
No ano passado, todos os clubes do Brasil enfrentaram dificuldades, e o planejamento financeiro do início de 2020 não conseguiu ser executado, por isso enfrentamos um momento difícil. Mas a nova gestão já está trabalhando essa questão. Os salários estão em dia, a nossa dívida é uma das menores no futebol brasileiro e hoje temos um equilíbrio excelente entre receitas e despesas. O nosso maior problema foram as escolhas do futebol, com contratações sem critérios de atletas e comissão técnica que custaram caro aos cofres do clube. O maior impacto financeiro do Goiás foram os erros de planejamento no futebol.
O que explica a ascensão do Cuiabá, a manutenção do Atlético-GO na Série A e o iminente rebaixamento do Goiás. Por que a distribuição de forças no Centro-Oeste mudou?
A expansão econômica do Centro-Oeste é muito recente, e a evolução dos clubes de futebol acompanha o fortalecimento financeiro da Região. É preciso apenas que o crescimento seja sustentável. Não adianta subir e, logo depois, cair. Em 2015, Santa Catarina tinha quatro clubes na Série A, e em 2020 não teve nenhum. Temos o Vila Nova em um momento promissor; o Atlético-GO que se reestruturou, está bem administrado, e tem tudo para continuar na Série A; o Cuiabá, com um bom projeto, e precisa entender que a Série A e B são duas competições muito diferentes em nível de estrutura, investimento, e para conseguir se manter na primeira divisão precisa entender as diferenças entre as competições o quanto antes e se preparar adequadamente. Nosso clube foi pioneiro na Região, nas décadas de 1970 e 1980, e saiu na frente da maioria dos clubes no quesito organização. Hoje, a nossa estrutura de futebol está entre as sete melhores do Brasil. A crise atual é consequência de erros de planejamento. O Goiás é um clube tradicional da Série A, disputou campeonatos internacionais, foi vice-campeão da Copa Sul-Americana e tem tudo para voltar a ser a grande força do Centro-Oeste.
Quanto à contratação de estrangeiros, eu sou contra qualquer tipo de modismo, mas entendo que eles agregam conhecimento ao nosso futebol com novas ideias e filosofias. O Jesus, o Abel e o Sampaoli vieram para equipes de boa estrutura, com bons times, e conseguiram ótimos resultados. Outros estrangeiros não tiveram o mesmo sucesso. Nós temos bons profissionais no Brasil e fora, mas a mentalidade de futebol profissional por aqui, baseada no resultado, precisa ser reformulada
Houve um tempo em que havia a disputa da Copa Centro-Oeste. Inclusive, o Goiás conquistou três das quatro edições. O senhor é favorável à retomada daquela competição como ferramenta de desenvolvimento dos clubes da região?
O calendário brasileiro atual não permite novas competições. O calendário precisa ser reformulado. É preciso achar um formato mais adequado para que os clubes disputem as competições em alto nível. O foco não deve ser na criação de novas competições, mas de mudanças no formato atual para que os clubes possam competir com qualidade.
Sem o Serra Dourada, o Estádio da Serrinha virou uma espécie de alçapão do Goiás mesmo sem torcida. O Goiás planeja continuar mandando jogos na casa própria no novo normal? Quais são as vantagens e desvantagens de mandar partidas de ponta na Serrinha? Algum plano de monetizar com naming rights?
É uma tendência natural os clubes terem os seus próprios estádios, suas próprias arenas, em virtude da demanda do futebol brasileiro. Eu sou totalmente a favor. A Serrinha é a casa do Goiás. Temos que mandar os nossos jogos lá, tem que ser o nosso alçapão, e o Serra Dourada precisa passar por uma adequação, se modernizar. Eu acho muito difícil isso acontecer por uma questão de investimento público. Não sei se há interesse do governo do estado em fazer isso. Acredito que, para acontecer, necessitaria de investimentos privados para o Serra Dourada estar preparado para grandes jogos com grandes públicos. A vantagem de ter uma arena própria é que ela se torna uma fonte de receitas não só pelo futebol, mas também por meio de eventos e diminuição de custos com impostos e aluguéis. Em relação a naming rights, não vejo que seja viável atualmente. Nosso único desejo é que ele se torne o nosso estádio e seja temido pelos adversários.
O Goiás sempre foi um clube revelador. Quando não ganhava dinheiro com pratas da casa, era com jogadores que se destacavam no clube, como Michael, Araújo, Dimba, Grafite, Josué, Túlio Maravilha e tantos outros. É possível resgatar essa excelente fama do clube?
Além de sempre ter sido um clube revelador, o Goiás também resgatou vários jogadores para o cenário do futebol brasileiro em função da sua estrutura, das condições que a cidade oferece. Nós sempre tivemos exemplos de jogadores que brilharam no cenário nacional, como Dimba, Paulo Baier, Grafite, Léo Lima, jogadores que vieram, se deram muito bem e ascenderam para o futebol brasileiro e mundial. Nós formamos atletas como Fernandão, Túlio Maravilha, Araújo, Rafael Tolói, a gama de jogadores formados pelo Goiás é muito grande. Por isso, acredito que é possível resgatar essa excelência, que nunca deixou de existir. O Fernandão, por exemplo, vem sendo comentado no Brasil inteiro e antes de chegar ao Goiás estava esquecido no Bahia. Ele está fazendo um grande campeonato mesmo com o time oscilando em alguns momentos, e vem se destacando. O Goiás é tradicionalmente um clube revelador e culturalmente projeta bons nomes para o futebol brasileiro.
Sobre a ‘MP do Flamengo’, eu sou contra e entendo que ela é uma catástrofe para os clubes menores. Uma equipe como o Goiás teria um bom retorno de venda em 5 ou 6 partidas das 38 no ano, que são os confrontos contra os grandes times do país, capazes de atrair o interesse das emissoras. Nós teríamos que buscar soluções como vender para mais de um canal, e as cotas teriam serem melhor distribuídas para que os menores tenham mais condições de ter investimento para a montagem do elenco e estrutura e, a partir disso, conseguir competir. Essa MP é uma ilusão e vários times entraram nesse sonho
Os executivos de futebol estão cada vez mais em evidência no mercado. Alguns mais até do que jogadores e técnicos. O que explica essa mudança de conceito?
O executivo, gerente, gestor, exerce função que não deve ser de exposição, mas de organização, suporte, diminuição dos erros e solução dos problemas. Ultimamente, houve grande exposição do cargo, que é de suma importância nos clubes por possuir um papel centralizador, em que todos os problemas do clube afetam o departamento de futebol, e o executivo precisa estar preparado para resolvê-los. Ele é o elo de todos os departamentos do clube, e tudo passa pelas mãos dos executivos de futebol. Eu acredito que essa exteriorização acontece em função da profissionalização do futebol no Brasil. Ela exige que os clubes tenham profissionais cada vez mais qualificados para lidar com a pressão do cargo, similar à cobrança enfrentada por jogadores, treinadores e presidentes.
O senhor é sociólogo e geógrafo. Por que decidiu migrar para o futebol?
A minha trajetória com o futebol se encontra na minha história pessoal. Meu pai foi um grande jogador, o primeiro ídolo da história do Goiás. A história da família Segurado se entrelaça com a do clube, que praticamente foi fundado na casa da minha vó. Meus tios mais velhos também jogaram no Goiás e participaram desse processo de construção do clube. Era na casa da minha avó que aconteciam as reuniões. Ela lavava a roupa de jogo dos atletas no começo, cozinhava para os jogadores, então eu cresci no meio do futebol, joguei nas categorias de base daqui e quando terminei o Ensino Médio, prestei o vestibular, passei a trabalhar em escolas, mas sempre estive envolvido com o futebol. Eu dava aulas de geografia, depois fui estudar sociologia, que era algo que me chamava atenção, gostei muito e por isso minha vida foi sempre dentro desses dois pilares. Comecei a dar aula em 1986 e me mantive envolvido com o futebol. São minhas duas paixões, a bola e a sala de aula.
Como as formações em sociologia e geografia o ajudam no dia a dia do futebol?
Estar em sala de aula trabalhando com jovens e adolescentes proporciona um feedback muito positivo. Auxilia na interação com os atletas e com as pessoas do meu convívio, porque o professor ensina ao mesmo tempo que aprende, e essa experiência que eu tive com os alunos me deu uma habilidade muito grande de gestão de pessoas. Na minha visão, é a minha grande qualidade como executivo de futebol. Eu me tornei muito habilidoso na gestão de pessoas e de conflitos. Isso me ajuda muito no vestiário e no cotidiano do futebol. A geografia e a sociologia ajudam mais nesse aspecto, mas obviamente que também o fato de estudar a sociedade, comportamento social, a questão do espaço geográfico, favorece o entendimento em muitos aspectos. Busco compreender as dificuldades dos atletas, visto que muitos cresceram em dificuldades sociais. Por isso, essa ideia sociológica que eu adquiri permite uma compreensão muito maior do lado humano, a capacidade de enxergar o jogador como ser-humano, e não como mercadoria. Analiso o jogador como um ser que possui suas dificuldades, tristezas, decepções e individualidades, e as ciências humanas me dão essa consciência de humanidade, principalmente nesse momento em que essa compreensão se encontra escassa.
O executivo, gerente, gestor, exerce função que não deve ser de exposição, mas de organização, suporte, diminuição dos erros e solução dos problemas. Ultimamente, houve grande exposição do cargo, que é de suma importância nos clubes por possuir um papel centralizador, em que todos os problemas do clube afetam o departamento de futebol, e o executivo precisa estar preparado para resolvê-los. Eu acredito que essa exteriorização acontece em função da profissionalização do futebol no Brasil. Ela exige que os clubes tenham profissionais cada vez mais qualificados para lidar com a pressão do cargo, similar à cobrança enfrentada por jogadores, treinadores e presidentes
O jogador é tratado como robôs?
As pessoas falam dos atletas como se fossem máquinas que não podem errar. Esses jovens muitas vezes não têm apoio suficiente para suportar. Por isso, sempre me fiz presente nesse aspecto. Essa consciência é fruto de uma herança que tenho da época de professor e das ciências humanas, que me tornaram mais compreensivo e me ajudaram a saber lidar com profissionais das mais diversas áreas, tanto do staff, quanto da comissão e da diretoria. São indivíduos de camadas sociais diferentes, pensamentos distintos e origens diferentes.
Por falar em geografia, acha possível, um dia, que um clube de fora do eixo Rio-São Paulo-Minas-Rio Grande do Sul conquiste o Campeonato Brasileiro nos pontos corridos?
Acho dificílimo que times do Centro-Oeste, Nordeste e Sul, com exceção de Grêmio e Inter, ganhem o campeonato. A disparidade econômicas e de divisão de cotas são muito grandes. Analisando o Goiás, Fortaleza, Ceará, Atlético-GO, são times que disputam um campeonato com adversários que possuem orçamentos até 15 vezes maiores. É humanamente impossível competir nesse contexto. Isso poderia acontecer em outros cenários, como já aconteceu com o Athletico-PR, Bahia, Sport, mas em outros formatos. Pontos corridos, não.
É contra ou a favor do atual formato?
Essa forma de disputa parte do princípio da meritocracia, o que eu discordo, porque ela só deve ser usada quando todos largam na mesma condição. Se todos tivessem a mesma estrutura seria possível competir. Caso contrário, isso não existe. Da maneira que é hoje, fica impossível competir no mesmo nível. Estamos caminhando a passos largos para um campeonato similar ao espanhol, com no máximo três times pretendentes ao título. O Brasil está assim e isso não é bom. Somos um país continental. Temos uma população de mais de 210 milhões de habitantes, com diferenças regionais, e deveria haver um processo mais igualitário. O capitalismo determina que eles devem ser mais valorizados, mas essa estrutura pode engolir a eles mesmos, visto que o desaparecimento de clubes médios faz com que eles percam força. O grande deixa de ser grande quando não há mais o médio e o pequeno. Defendo uma divisão de receitas mais equilibrada para que o campeonato se torne mais justo e disputado.
A geografia e a sociologia ajudam mais nesse aspecto, mas obviamente que também o fato de estudar a sociedade, comportamento social, a questão do espaço geográfico, favorece o entendimento em muitos aspectos. Busco compreender as dificuldades dos atletas, visto que muitos cresceram em dificuldades sociais. Por isso, essa ideia sociológica que eu adquiri permite uma compreensão muito maior do lado humano, a capacidade de enxergar o jogador como ser-humano, e não como mercadoria. Analiso o jogador como um ser que possui suas dificuldades, tristezas, decepções e individualidades, e as ciências humanas me dão essa consciência de humanidade, principalmente nesse momento em que essa compreensão se encontra escassa.
O que pensa sobre a criação de uma Liga Nacional nos moldes das europeias? O que o futebol brasileiro ainda precisa aprender com a organização do Velho Mundo?
Comparar o Brasil com os Estados Unidos ou a Europa é complicado. São sociedades diferentes. Apesar da globalização, são outros comportamentos. O que nós temos que ter no Brasil é uma postura ética maior, isso em todas esferas, política, esportiva e na sociedade em geral. Em relação a essas federações que são bolsões de empregos, sem alternância de poder, sempre com as mesmas pessoas, fica difícil fazer algo diferente porque as ideias não mudam. Sou a favor da criação de uma liga dos clubes para que eles se fortaleçam e tenham mais força para discutir e buscar receitas, sejam elas da televisão, da iniciativa privada, das instituições ou dos patrocinadores. O Goiás, o Bahia e o Cuiabá sozinhos não darão conta de competir com Palmeiras e Flamengo na captação de recursos. É muito difícil, hoje, pensar em um cenário de clubes pensando juntos, mas é necessário.
Impossível então?
A reunião da CBF é uma conferência de vaidades na qual os presidentes dos principais clubes sequer cumprimentam os mandatários das equipes menores. Isso enfraquece a construção da ideia de união. O que temos que buscar do modelo de organização europeu é, principalmente, a mudança de comportamento de querer levar vantagem em cima dos outros, porque essa postura vai para o futebol. É por isso que esses 5 ou 6 principais clubes do país querem buscar as coisas baseadas nos seus interesses, sem tentar entender a necessidade dos outros clubes e buscar uma divisão mais justa, eles se consideram mais importantes, falta inteligência social.
O sistema é ultrapassado…
O sistema capitalista só vai funcionar se houver equilíbrio. Em cenários com disparidades, ele tende a acabar, e o futebol brasileiro está nesse caminho. Eu não acredito mais que teremos um campeão mundial. O último vai ser o Corinthians (2012) e ponto. Nós não temos como concorrer com as potências europeias. Para conseguir competir com eles precisamos mudar a nossa mentalidade. Precisa ser mais corporativa, mais justa. O embrião era o Clube dos 13, mas também foi finalizado por conta de vaidades.
A reunião da CBF é uma conferência de vaidades na qual os presidentes dos principais clubes sequer cumprimentam os mandatários das equipes menores. Isso enfraquece a construção da ideia de união. O que temos que buscar do modelo de organização europeu é, principalmente, a mudança de comportamento de querer levar vantagem em cima dos outros, porque essa postura vai para o futebol. É por isso que esses 5 ou 6 principais clubes do país querem buscar as coisas baseadas nos seus interesses, sem tentar entender a necessidade dos outros clubes e buscar uma divisão mais justa. Eles se consideram mais importantes. Falta inteligência social.
O que pensa sobre temas da política esportiva como clube-empresa, profut…
O clube-empresa depende muito de como vai ser feito, por exemplo: O RedBull tinha um projeto no Brasil, e como não alcançou o objetivo de chegar na primeira divisão, resolveram encurtar o caminho comprando o Bragantino. Eles possuem um projeto na Alemanha que deu certo, tem na Áustria, nos Estados Unidos e só não deu certo no Brasil. Como aqui não bateram as metas, fizeram o aluguel de um clube para chegar na Série A. Eu não acredito que esse formato vai dar certo. Uma hora vai ter um choque de interesses e dar errado. Se for ter um projeto de clube-empresa aqui no país, acho muito difícil que os clubes com formatos de conselho e modelos administrativos estabelecidos deem certo. Eu penso que transformar o clube em uma empresa não é o caminho. Você tem que profissionalizar o setor administrativo e os departamentos do clube. A administração não pode ser realizada por apaixonados pelo futebol. Para gerir uma equipe, precisa ser profissional.
Então estamos distantes disso…
Visto os moldes que as equipes daqui funcionam, eu acho que é improvável que algum investidor compre um clube e o torne uma empresa privada. Sobre a divisão de cotas, começou a dar uma melhorada com a atual divisão de 30% na primeira parte, 40% na segunda e depois mais 30%. Depois dessa mudança houve uma evolução notória e gradativa na divisão, que precisa ser mensurada por rankings, os clubes que tiverem as melhores performances vão receber mais, dessa forma seria mais justo.
E a polêmica dos direitos de transmissão?
Sobre a ‘MP do Flamengo’, eu sou contra e entendo que ela é uma catástrofe para os clubes menores. Uma equipe como o Goiás teria um bom retorno de venda em 5 ou 6 partidas das 38 no ano, que são os confrontos contra os grandes times do país, capazes de atrair o interesse das emissoras. Nós teríamos que buscar soluções como vender para mais de um canal, e as cotas teriam serem melhor distribuídas para que os menores tenham mais condições de ter investimento para a montagem do elenco e estrutura e, a partir disso, conseguir competir. Essa MP é uma ilusão e vários times entraram nesse sonho.
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