Dos 11 titulares do Brasil na Copa da África do Sul em 2010, oito estão aposentados: Julio Cesar, Lúcio, Juan, Michel Bastos, Gilberto Silva, Elano, Kaká e Luis Fabiano. Maicon defende e Ter Penne de San Marino, Felipe Melo é reserva do Palmeiras e Robinho segue afastado do futebol tentado se defender depois de ser condenado pela Justiça italiana a nove anos de prisão por estupro. De todos eles, Elano é quem levou a sério o plano de virar técnico.
Cobri a Seleção na Copa de 2010. Segui passo a passo todos os jogos do ciclo comandado por Dunga. Elano tinha a melhor leitura de jogo entre os titulares — o Dunga do Dunga dentro das quatro linhas. Kaká posava de maestro, Robinho carregava fama de Rei das Pedaladas, Luis Fabiano fazia gols a rodo, Julio Cesar ostentava o prêmio de melhor goleiro do mundo, Lúcio e Juan formavam dupla de zaga segura, Gilberto Silva gastava a bola na função de cão de guarda da defesa, mas Elano, sim, era o ponto de equilíbrio, O cara que fazia a engrenagem funcionar.
Bastou Elano se machucar na fase de grupos para o Brasil perder a estabilidade na Copa. Dunga não conseguiu reinventar o meio de campo. A perda foi irreparável. A Seleção estava sem técnico dentro das quatro linhas. Sem ele, o Brasil foi eliminado pela Holanda. Fez falta. Alguns colegas de imprensa vislumbravam à época Elano como treinador depois da aposentadoria. Onze anos depois, Elano é o que estava no script.
O detalhe é que Elano não caiu de paraquedas na profissão. Ele se preparou para isso. Aos 40 anos, acumula estágio no Santos como auxiliar, comandou Inter de Limeira e Figueirense e assumiu o desafio de tocar o projeto da Ferroviária na quarta divisão do Brasileirão. Mais do que isso: o ex-meia se preparou para trilhar o novo caminho.
Elano é um dos técnicos em formação no curso da CBF. Está matriculado na Licença Pro. Cumpriu o programa online e aguardava o retorno das aulas presenciais em tempos de pandemia para concluir o curso. A fama de estudioso vai além. Enquanto estava desempregado, montou um centro de análise na casa dele, com televisões e computadores. De lá, acompanhava campeonatos do mundo inteiro, inclusive da Ucrânia, onde atuou. Na Ferroviária, interage com o arsenal de informações fornecidas pelo clube paulista.
O jovem técnico também investiu em gestão de pessoas para aprender a lidar com o vestiário não mais no papel de jogador, mas de líder de todo o processo. Tecnicamente, pinçou um pouco de cada técnico com quem trabalhou. Admira o repertório tático dos bons tempos de Vanderlei Luxemburgo, com quem foi campeão do Brasileirão em 2004. Admira o estilo de liderança de Muricy Ramalho, treinador dele na conquista da Libertadores 2011. Elano usa métodos de treino do holandês Frank Rijkaard, treinador dele no Galatasaray da Turquia. Exalta a sensibilidade do escocês Mark Hughes, que levava flores para os funcionários do Manchester City. A partir do quebra-cabeças, montou o próprio perfil de treinador.
Mentor da segunda melhor campanha da fase de grupos da Série D à frente da Ferroviária-SP, Elano Blumer, como passou a ser chamado como técnico, é inquieto do ponto de vista tático. Não é refém de um sistema só. Arma o time com linha de quatro defensores ou de três zagueiros. Esse é um ponto importantíssimo do ponto de vista da modernidade do jogo.
A Ferroviária empatou por 0 x 0 com o Brasiliense no jogo de ida usando o 3-5-2 no sábado passado. Neste sábado, às 17h, decidirá a vaga em Araraquara, no endereço em que tem 100% de aproveitamento como mandante. A única derrota em casa nesta Série D foi para o Uberlândia no Estádio Walter Ribeiro, em Sorocaba, como mandante. A Ferroviária tem 10 vitórias, quatro empates e uma derrota em 15 jogos. O time de Elano fez 24 gols e sofreu cinco, três deles contra o Uberlândia e outros dois nos últimos dois compromissos na fase de grupos nas vitórias por 3 x 1 contra a Caldense e no empate por 1 x 1 com o Uberlândia.
Leia também: entrevista com Luan Carlos, jovem técnico do Brasiliense, adversário de Elano no mata-mata.
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