Até quando os técnicos brasileiros recorrerão ao “se” para minimizar o sucesso dos colegas estrangeiros?

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A guerra fria entre Flamengo e Grêmio antes das semifinais da Copa Libertadores da América começou com um técnico brasileiro usando discurso batido para desmerecer o trabalho de um colega de profissão estrangeiro. Renato Gaúcho só mudou o discurso para rebater o português Jorge Jesus, mas adotou o mesmo argumento de Muricy Ramalho quando o então treinador do Santos desmereceu o auge do sucesso de Pep Guardiola e José Mourinho: recorreu ao “se”.

Eufórico depois de levar o Flamengo de volta às semifinais da Libertadores após 35 anos se seca, Jorge Jesus declarou que o clube carioca tem o melhor futebol do país. “No Campeonato (Brasileiro), quem joga melhor é quem está na frente. Ninguém que joga mais bonito está atrás (no Brasileiro)”, contra-atacou o lusitano na entrevista da última quinta-feira sobre a opinião de Renato Gaúcho de que o Grêmio pratica o futebol mais agradável do Brasil.

O comandante tricolor poderia rebater, por exemplo, dizendo que o Grêmio está nas semifinais de duas competições, que o Brasileirão ainda nem está na metade, blábláblá. Ou, de repente, sair com uma daquelas tiradas dignas de Renato Gaúcho. Só que não. Escolheu um discurso batido, surrado. Atribuiu o sucesso de Jorge Jesus ao poder aquisitivo rubro-negro.

“A minha opinião não vou mudar, respeito a opinião do Jesus, está fazendo um bom trabalho. Ouvi da boca dele que era porque era o primeiro no Brasileiro. Se perder, quer dizer que não tem mais? Se o Grêmio me der R$ 160 milhões para contratar, vou montar uma seleção. O Grêmio não gastou nem R$ 10 milhões. Óbvio que o Jesus vai puxar a sardinha para o lado do Fla, eu faria a mesma coisa. Joga um futebol bonito, sim, mas há pouco tempo. O Grêmio joga há três anos. O que tem a diferença, enorme, é financeiramente”, disparou Renato Gaúcho, esquecendo-se de que recebeu convite da atual diretoria para assumir o Flamengo no fim do ano passado. E de que foi vice da Libertadores em 2008 contra a LDU, quando o patrocínio da Unimed montou uma seleção para o Fluminense, acrescenta o leitor @brunor78 em um comentário no meu Twitter.

SE o Grêmio me der R$ 160 milhões para contratar, vou montar uma seleção

Renato Gaúcho, técnico do tricolor gaúcho

Futebol tem a ver com investimento, sim, claro. Mas o próprio Renato Gaúcho provou recentemente que não necessariamente. Com muito menos verba do que Flamengo e Palmeiras, o time dele empilhou seis títulos em quase quatro anos à frente do Grêmio: Copa do Brasil (2016), Libertadores (2017), Recopa Sul-Americana (2018), Gaúcho (2018 e 2019) e Recopa Gaúcha (2019). No mesmo período, o Palmeiras faturou o Brasileirão duas vezes; e o Flamengo faturou bem menos que isso: o Campeonato Carioca (2017 e 2019).

Infelizmente, Renato Gaúcho recorreu ao discurso viciado presente na ponta da língua da maioria dos técnicos brasileiros quando se deparam com o sucesso de estranhos no ninho como o argentino Jorge Sampoli e o português Jorge Jesus — o tal do “se”.

Muricy Ramalho agiu assim ao ser questionado sobre Pep Guardiola antes da final do Mundial de Clubes da Fifa 2011. Aproveitou até para incluir José Mourinho no argumento. Desafiou ambos a trabalharem no Brasil. “O Guardiola, o Mourinho, são os melhores. Mas só vou dizer que vão ganhar nota 10 se trabalharem no Brasil e forem campeões”, surpreendeu à época.

O Guardiola, o Mourinho, são os melhores. Mas só vou dizer que vão ganhar nota 10 SE trabalharem no Brasil e forem campeões

Muricy Ramalho, em 2011, antes da final do Mundial de Clubes

Terminou este post refrescando memórias curtas. Independentemente de orçamento, Jorge Jesus é o quarto treinador estrangeiro a levar time brasileiro a semifinal e/ou final de competição sul-americana. O uruguaio Diego Aguirre chegou entre os quatro com o Inter na Libertadores 2015. O argentino Edgardo Bauza fez milagre com o São Paulo em 2016. Caiu contra o campeão Atlético Nacional. O colombiano Reinaldo Rueda era o comandante do Flamengo no vice-campeonato de 2017 diante do Independiente na decisão da Sul-Americana. Quatro “cases” distintos de que nem sempre o orçamento desses clubes fez a diferença.

E nem falei que Jorge Sampaoli e Jorge Jesus lideram o Brasileirão…

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Marcos Paulo Lima

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