O verão vem aí. Com ele, acentua-se a preocupação com o corpo. As academias ganham clientes. Os calçadões conhecem novos caminhantes. Os bares perdem consumidores. Vale tudo pra entrar em forma. Até bater à porta dos Pitanguys da vida. Eles fazem milagres. Passam ferro nas rugas. Tiram barriga. Incrementam bumbuns.
Destaque do momento é a lipoaspiração. O motorzinho aspira os excessos de Deus e da mesa. Pneuzinho nas costas? Estômago exibido? Coxas atrevidas? Nada de lamentações. Lipo neles. Quem não se enfeita, diz o outro, por si se enjeita.
A língua também tem vaidades. Adora ser enxutinha, Gordurinhas aqui e ali? Nem pensar. Bisturi nelas. Vale visita ao cirurgião plástico. Ele manda as adiposidades bater em retirada.
Cai fora, indefinido
As palavras, como os remédios, podem matar. O artigo indefinido é medicamento de tarja preta. Deve ser usado com cuidado. Erva daninha, amortece a força do substantivo. Torna-o vago, impreciso, desmaiado. Em 99% das frases, é gordura pura. Corte-o:
O presidente deu (uma) entrevista coletiva à imprensa. Impõe-se implantar (um) novo Judiciário no Brasil. Nas eleições de 2010, houve (uma) renovação no Congresso.
Suma, possessivo
George Simenon escrevia romances pra lá de bons. O segredo: “Livro-me dos vocábulos que estão na frase só para enfeitar ou atrapalhar”. Um deles: os pronomes seu, sua. Eles parecem inofensivos. Mas causam estragos. Tornam o enunciado ambíguo. Quer ver?
O presidente do banco estava preocupado com o jovem diretor que, depois de trabalhar algum tempo sem parar nem para comer, passou a ausenta-se ao meio-dia. Encucado, o chefão contratou um detetive para segui-lo. Uma semana depois, o araponga deu conta do recado:
Ao meio-dia, ele pega o seu carro, vai à sua casa almoçar, namora a sua mulher, fuma um dos seus cubanos e volta ao trabalho.
O presidente suspirou. Não havia nada de mal naquilo. Incomodado, o detetive pediu para tratá-lo por tu. E contou tudo de novo:
Ao meio-dia, ele pega teu carro, vai à tua casa almoçar, namora a tua mulher, fuma um dos teus cubanos e volta ao trabalho.
É isso. Seu e sua têm dupla função. Referem-se a ele e a você. Daí a confusão. Pau neles!
No (seu) pronunciamento, Lula criticou o candidato tucano. Que estrago! Quebrou a (sua) perna, fraturou os (seus) dedos, arranhou o (seu) rosto. Antes de sair, calçou os (seus) sapatos, vestiu a (sua) blusa e pôs os (seus) óculos.
Rua, todos os
Ser claro é obrigação de quem escreve. O artigo definido se presta a confusão de significados. Dobre a atenção quando o usar. Ao dizer “os procuradores fazem campanha contra a mordaça”, englobam-se todos os procuradores. Se não são todos, o pequenino não tem vez: procuradores fazem campanha contra a mordaça.
Para quem sabe ler, pingo é letra. Se o artigo engloba, o todos os sobra em muitas situações. Corte-o sem pena:
Vou ao teatro todas as terças-feiras. (Vou ao teatro às terças-feiras.) Todos os alunos que saíram perderam a explicação. (Os alunos que saíram perderam a explicação.) Todos os funcionários em férias perderam a festa de confraternização. (Os funcionários em férias perderam a festa de confraternização.)
Etc. Etc. Etc.
Cultivar a economia verbal sem prejuízo da completa e eficaz expressão do pensamento tem dupla vantagem. Uma: respeita a paciência do leitor. A outra: poupa tempo — bem pra lá de escasso. Ao escrever, livre-se dos excessos. Como? Leia o texto com cuidado. Depois, mande as gorduras arder nas fogueiras do inferno. Xô, satanás!