Ronaldinho, travestis e polícia

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E Ronaldinho, hein? Saiu das páginas esportivas para as policiais. Cabelo desgrenhado, olhar gozador, o craque apareceu diante das câmeras. Explicava por que se envolvera com três travestis. “Foi engano, disse ele. Pensei que fossem garotas de programa.” O trio dá outra versão. Alega que o atacante não quis pagar o valor combinado. Os quatro acabaram na delegacia.
 
Do vexame ficam muitas lições. Uma levantada por Luciana Liviero. A apresentadora do Fala, Brasil, da Record, dava pormenores da história. Ao se referir a Andréia, uma das barraqueiras, engasgou:
 
— A travesti? O travesti? Ah… tanto faz!
 
Verdade? Os dicionários dizem que não. Na acepção de homossexual que se veste com roupas do sexo oposto, a palavra é tolerante. Aceita os dois gêneros. Mas o artigo distingue o masculino do feminino. Ele é o travesti. Ela, a travesti: Ronaldinho disse que o travesti Andréia tentou extorquir R$ 50 mil dele. Bruna Lombardi interpretou a travesti Diadorim na minissérie Grande sertão.
 
 
Por falar em extorquir…

 
Dizem as línguas maliciosas que Ronaldinho se assustou com a ameaça de Carla:
 
— Eu vou extorquir você, disse ela.
 
— Me extorquir?, perguntou ele, olhos arregalados e beiços caídos. Nem pensar!
 
Explica-se. quem extorque extorque alguma coisa de alguém. Nunca extorque alguém. A criatura teria enchido a carteira de notas se tivesse dito:
 
— Eu vou extorquir R$ 50 mil de você.
 
 
Você sabia?

 
A palavra travestire nasceu na Itália. No século 16, pulou a cerca. Foi pra França. De lá, passou pra este país tropical. Quando veio ao mundo, o vocábulo dava nome aos homens que se vestiam de mulher em baile de carnaval. Mais tarde, passou a indicar opção sexual.
 
 
Outra lição

 
A segunda lição ronaldina levanta questão lingüística. Travesti se escreve com acento? Não. Oxítonas terminadas em i jogam no time das terminadas em u. Livres e soltas, não aceitam acento nem a troco de montanhas de euros e dólares: aqui, ali, caqui, oiti, colibri, caju, urubu, umbu, tatu. Aracaju. E por aí vai.
 
 
Eis a razão

 
Amá-lo, vendê-lo, compô
lo aparecem devidamente acentuados. Mas parti-lo, dividi-lo e adquiri-la dispensam o acessório. Por quê? Pela mesma razão do aqui, ali, colibri. São oxítonas terminadas em i. PT saudações.
 
 
Olha a guilhotina

 
Abra os dois olhos. Há oxítonas terminadas em i e u acentuadas. No caso, o grampinho funciona como guilhotina. A invenção francesa separava a cabeça do corpo. A nacional, ditosos ditongos. Compare: pais, país; cai, caí; saudar, saúda; saudade, saúde.
 
Pra desempenhar o papel, o i e o u têm de preencher três condições. Uma: serem antecedidos de vogal. Outra: formarem sílaba sozinhos ou com s. A última: não serem seguidos de nh: sa-í-da, sa-í, ca-ís-te, e-goís-ta; ba-ú, Tam-ba-ú, sa-ú-de. Mas: ra-i-nha, ba-i-nha, cam-pa-i-nha.
 
 
Conversar é…

 
“A verdadeira conversação”, ensinou Dorothy Nevil, “não consiste apenas em dizer a coisa certa, mas — o que é muito mais difícil — em deixar de dizer a coisa errada no momento mais tentador.”
 
 
Quero saber

 
Emmanuel carrega uma dúvida antiga. Ele explica: “Quando usar haver e a ver? A pronúncia é a mesma. Mas o significado não se conhece nem de passagem”.
 
A confusão se explica. Haver e a ver se pronunciam do mesmo jeitinho. Mas um não tem nada a ver com o outro. O haver aparece em locuções verbais. Anda, pois, acompanhado de auxiliar. O ajudante se conjuga. Ele se mantém no infinitivo: Vai haver transtornos nas Olimpíadas? Deve haver cerca de 50 pessoas na sala. Pode haver informações importantes entre os documentos encaminhados à CPI.
 
A locução a ver joga em outro time. Significa ter relação: Minhas palavras não têm nada a ver com insinuações sobre o 3º mandato. Talvez o comentário dele tenha algo a ver com a pesquisa. O pai de Isabella diz que não tem nada a ver com a morte da filha.
 
 
Comentário
Roldão Simas Filho escreve: “No noticiário sobre o fantástico caso do austríaco que manteve em prisão domiciliar durante 24 anos a filha e os filhos dela, frutos incestuosos, o Correio Braziliense comete dois erros. 1. No início do texto, chama o pai dela de engenheiro elétrico embora corrija mais adiante, dizendo que o sr. Fritzl é engenheiro eletricista. 2. Emprega o termo sótão como sinônimo de porão, talvez induzido pelo texto em espanhol recebido de agência de notícias internacional. Em espanhol, sótano é porão. Em português, o sótão fica debaixo do telhado. O porão é subterrâneo”.
 
 
Recado de Buda
“As palavras têm o poder de destruir e de curar. Quando são ao mesmo tempo sinceras e gentis, elas podem mudar nosso mundo.”