Concurseiros estão em polvorosa. Uns saltam de alegria. Outros põem a barba de molho. Sentimentos tão diferentes têm um motivo. Número cada vez maior de candidatos tira nota 10 na prova de português. Interpretação de textos, gramática e redação não constituem pedra no caminho de pessoas que não pouparam horas nem esforços para estudar. Elas sabem que, para conquistar uma vaga no serviço público de elite, não basta ser bom. Impõe-se ser melhor que os concorrentes.
A língua, sabem eles, é um conjunto de possibilidades. Hábeis, aprenderam a trocar seis por meia dúzia. Na dúvida, não correm riscos. Partem para a substituição. Adequar tem manhas? Deixam-no pra lá. Adaptar faz as vezes do verbo caprichoso. Em vez ou ao invés de? Sem certeza, melhor recorrer às locuções em lugar de ou ao contrário de. Elas dão o recado e não roubam pontos.
Mas nem tudo são flores. Há ocasiões em que a criatura fica contra a parede. Em questões objetivas, por exemplo, ela não pode fugir. Tem de enfrentar o desafio. Aí, pormenores fazem a diferença. Muitos procuram a coluna. Expõem dúvidas e buscam soluções. Uma das preocupações constantes é a reforma ortográfica. Mais especificamente: o emprego do hífen. “Há jeito de dominar o assunto?”, perguntam. “Em disputas tão acirradas, um tracinho de mais ou de menos pode definir a classificação.” É verdade. Quatro verbos
A reforma conjugou quatro verbos — manter, mudar, cassar e acrescentar. Os estudos insistiram nas mudanças. Deram, assim, um nó nos miolos da moçada. A questão mais importante hoje não é saber o que mudou. É saber o que não mudou. Comecemos por aí.
Primeiro passo: o hífen problemático se usa na formação de vocábulos. Há dois processos:
1. a composição: Com o auxílio de prefixo, a palavra mantém a classe gramatical. Mas acrescenta ideia nova — de tamanho (minissaia), de oposição (anti-herói), de associação (coautor). E por aí vai.
2. a prefixação: duas ou mais palavras se unem e formam uma terceira. É o caso de beija-flor. Beija é verbo. Flor, belezura que enfeita vasos e jardins. A duas ligadas dão nome a um pássaro. É o caso também de guarda-noturno, arco-íris, bom-dia.
Composição
A reforma dividiu os nomes compostos em dois times. O primeiro: formado de duas palavras (guarda-costas, porta-retratos, para-raios). O segundo: formado de mais de duas palavras em que uma funciona como ligação (pé de moleque, pôr do sol, joão-de-barro). Duplinhas
Nas duplinhas, imperou o verbo manter. Praticamente não houve mudanças. O que tinha hífen continuou com o tracinho: arco-íris, mestre-sala, bom-dia, boa-tarde, boa-noite, porta-bandeira, porta-luvas, para-choque.
Houve alterações? Houve. Quais?
1. Paraquedas, paraquedista, paraquedismo e outros membros da família amortecedora perderam o tracinho. Os demais compostos com para conservam-se firmes e fortes — para-raios, para-lama, para-choque.
2. Tão só, tão somente e à toa tinham hífen. Mandaram-no plantar batata na Terra do Nunca.
3. Palavras onomatopaicas que se escreviam juntas ficaram com um pedaço lá e outro cá: zum-zum, zigue-zaga, tim-tim. Mais de dois
As composições com mais de duas palavras foram divididas em dois grupos:
1. os pertencentes aos reinos animal ou vegetal. Eles mantiveram o tracinho: joão-de-barro, castanha-do-pará, pimenta-do-reino, cana-de-açúcar.
2. os outros — não pertencentes ao mundo das plantas ou da bicharada. Eles perderam o tracinho: pé de moleque, tomara que caia, calcanhar de aquiles, dor de cotovelo.
Exceções? Claro que há. Permanecem com o hífen água-de-colônia, pé-de-meia, cor-de-rosa. Por quê? Porque hífen é castigo de Deus.