Luis Fernando Verissimo
Comecei no jornalismo trabalhando como copidesque — uma função que já deve ter sido substituída por uma tecla de computador. Naquele tempo, você podia começar como estagiário, sem diploma. Quanto tempo faz isso? Basta dizer que a manchete na Zero Hora do dia seguinte ao da minha estreia foi “Castelo hesita em cassar Lacerda”. E a manchete saiu com um terrível erro de ortografia. “Exita” em vez de “hesita”.
Na minha casa, duas certezas conflitantes — a de que eu era analfabeto e a de que já começaria no jornalismo fazendo as manchetes da primeira página se chocarem, criando o pânico. Mas eu era inocente. Eu tenho conseguido me manter inocente de grandes pecados ortográficos e gramaticais desde então, pelo menos se você não for um fanático sintático.
Vez por outra, um leitor escandalizado me chama a atenção por alguma barbaridade que eu prefiro chamar de informalidade, para não chamar de distração ou ignorância mesmo. Afinal, se a gente não pode tomar liberdades com a própria língua… E nenhum pronome fora de lugar justifica a perda de civilidade.
Mas tenho um temor e uma frustração. Jamais usei ponto e vírgula. Já usei “outrossim”, acho que já usei até “deveras” e vivo cometendo advérbios, mas nunca me animei a usar ponto e vírgula. Tenho um respeito reverencial por quem sabe usar ponto e vírgula e uma admiração ainda maior por quem não sabe e usa assim mesmo, sabendo que poucos terão autoridade suficiente para desafiá-lo.
Além de conhecimento e audácia, me falta convicção: ainda não escrevi um texto que merecesse ponto e vírgula. Um dia o escreverei e então tirarei o ponto e vírgula do estojo com o maior cuidado e com a devida solenidade e o colocarei, assim, provavelmente no lugar errado, mas quem se importará?
(Colaboração de Dalva Aguiar)