Piauês

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No Brasil fala-se português. OK. Mas os estados põem um tempero local nos falares. A dicção ganha, então, marcas particulares. Em Pernambuco impera o pernambuquês. No Ceará, o cearês. Na Bahia, o baianês. No Rio Grande do Sul, o gauchês. No Piauí, o piauiês. O dicionário da simpática língua de Teresina & cia. foi lançado ontem na Feira do Livro de Brasília. A seguir, o comentário que dele faz o piauiense da gema Cineas Santos.
 
Assunte e atente: esta Enciclopédia, mais encorpada, de liforme novo e ar de “obra de referência”, por mais que tente, não consegue disfarçar a desnobreza de sua origem. É cisco de quintal, miudezas catadas nas conversas descansadas dessa gente sem eira nem beira. Deu-se que esse vivente, que atende pelo nome de Paulo José Cunha, ente industrioso e malino que só guia de cego, cansado das vastidões do Planalto, voltou as vistas e, principalmente, as oiças para a Chapada de onde, diga-se a bem da verdade, nunca se desgarrou emocionalmente, e pariu essa tranqueira. Nasceu de sete meses, com jeito de quem não vingaria, mas foi-se encorpando com a contribuição graciosa e quase sempre maliciosa de uns tantos de sua laia; o resultado aí está: um trem quase sério, usado em sala de aula de universidades e compulsado até pela atenta equipe do Houaiss.
 
Que préstimo poderá ter obra de tal “qualistria”? Isso aí depende das conveniências de cada freguês. Moça bem criada, estudante de escola decente, encontrará pretexto até para dissertação de mestrado; já a cambada de desocupados, movida pela curiosidade malsã, só descobrirá o escracho. Fazer o quê? Para os piauienses, notadamente os que ainda não se deixaram contaminar pelo alastrante dialeto global, o livro propiciará um reencontro com o que temos de mais nosso: esse falar que nos distingue no “rebanho urbano”.
 
Particularmente, sou um tantinho culpado pela existência deste livro: ajudei a fazer a primeira edição e tive o desplante de editar a segunda e a terceira. Para mim, a Grande Enciclopédia Internacional de Piauiês é uma espécie de manual, que consulto diariamente para não me apartar de mim. Longa vida a este livro que é, “escarrado e cuspido”, a nossa cara.