Alguns colecionam selos. Outros, paliteiros. Há os que preferem carrinhos. Ou bonecas. Ou xícaras. José Mindlin se dedicou aos livros. Nos 95 anos de vida, formou o maior e mais importante acervo literário do Brasil. Dizia cheio de prazer: “Tenho compulsão patológica pelos livros. Chamo-a de loucura mansa.” Ele não comprava livros para tê-los na estante. “Livro é para ser lido”, repetia.
Antes que a indesejada das gentes lhe batesse à porta, conjugou dois verbos. O primeiro: ler. Ele leu, leu muito. O segundo: doar. Doou quase metade da coleção à Universidade de São Paulo. Ambos os verbos sofreram com a reforma ortográfica. Ler deixou pra trás o acento que exibia na 3ª pessoa do plural. Agora, eles leem sem lenço e sem chapeuzinho. Doar entrou na onda do oo. Nas paroxítonas, perdeu o acento: eu doo, voo e perdoo.
“Não faço nada sem alegria”, anuncia o ex-libris das obras que o bibliófilo acariciou. Cheio de alegria, bom humor e espontaneidade, ele tratava funcionários, amigos e familiares. Com o sorriso aberto e olhos luminosos de sempre, Mindlin chegou ao céu no domingo. Lá encontrou a mulher, Guita. Ao vê-la, repetiu dedicatória que Drummond fizera pra ele, e ela adorara: “Procuro no dicionário. Falta rima para corpo. Não é nada extraordinário. Sua rima é outro corpo”.
Paixão incurável
Mindlin era bibliófilo. Tinha paixão pelos livros. As partes que compõem a palavra são velhas conhecidas. Biblio quer dizer livro. O dissílabo aparece em biblioteca, biblioteconomia, bibliografia. Filo significa amor, paixão, “compulsão irresistível”. Daí filosofia, o amor à sabedoria.
É assim
O contrário de bibliófilo? É bibliófobo — horror aos livros.