Lixo precioso

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Querida Dad,

 

Adoro juntar coisas que encontro na rua. Aqui, uma placa de loja; ali, um folheto de cartomante; mais adiante é um pedaço de conversa ouvido de passagem, que guardo com carinho. Ou então leio os jornais, ouço o rádio ou assisto a tv e termino juntando algumas preciosidades encontradas no meio do lixo. São meu melhor tesouro. Na semana passada achei três pepitas preciosíssimas.

 
A primeira foi uma construção que vem se repetindo: “comentar sobre”. Parece que o verbo “comentar” mudou de regência, porque nunca mais o encontrei na simplicidade de outrora: “comentar alguma coisa”. agora é um tal de “comentar de que” e “comentar sobre” que não há quem aguente.
 
A segunda foi achada em teu Correio Braziliense, numa matéria sob o título “Achados calcinha e sutiã do século 15”. O redator escreveu: “As peças estão em posse da universidade austríaca”. A expressão “de posse” se misturou com a expressão “em poder” e gerou esse híbrido aí, “em posse”. (Convenhamos, não sejamos ranzinzas: ficou até bonitinho. Pena que a construção esteja errada, ou eu é que estou errado?)
 
A terceira também é uma expressão resultante da mistura de duas outras. Saiu na edição matinal do Jornal da CBN. A repórter disse que as vítimas de um acidente haviam sido “socorridas ao Hospital de Base”. Claro que ia dizer “socorridas no Hospital de Base” ou “pelo Hospital de Base”, mas se lembrou que podia dizer que foram “recolhidas ao Hospital de Base”, misturou ulhos com bagulhos e saiu esta coisa aí.
 
Viu como é bom estar de olho no lixo? A gente descobre coisas inimagináveis, e de valor incalculável, como pode notar. Como tenho bom coração, divido meu tesouro com você.
 
Um beijo grande do
 
Paulo José Cunha