Deus às vezes erra na medida. Dá muito prauns. Pouco pra outros. Mas, generoso, não deixa os filhotes na mão. Oferecesoluções. Uma delas são os Pitanguys da vida. Eles fazem milagres: passam ferronas rugas, tiram barriga, aumentam seios, incrementam bumbuns.
O furor do momento é a lipoaspiração. O motorzinho aspira os excessos de Deus e da mesa. Pneuzinho nas costas? Estômago exibido? Coxas atrevidas? Nada de lamentações. Lipo neles. Quem não se enfeita, diz o outro, por si se enjeita.
A língua também tem vaidades. Adora ser enxutinha. E ter tudo no lugar. Gordurinhas aqui e ali? Nem pensar. Bisturi nelas. Vale visita ao cirurgião plástico. Ele manda as adiposidades bater em retirada. Quais?
Artigo indefinido
As palavras, como os remédios, podem matar. O artigo indefinido é medicamento de tarja preta. Causa dependência. Deve ser usado com redobrado cuidado. Erva daninha, amortece a força do substantivo. Torna-o vago, impreciso, desmaiado. Em 99% das frases, é gordura pura. Corte-o. O texto agradece:
Ingrid Betancourt deu (uma) entrevista logo que foi libertada.
Os movimentos libertários da década de 60 quiseram dar (uma) nova cara ao mundo.
Lula parece (uma) outra pessoa.
Pronome possessivo
George Simenon escrevia romances policiais pra lá de bons. O segredo: “Livro-me dos vocábulos que estão na frase só para enfeitar ou atrapalhar”. Um deles: os pronomes seu, sua. Eles parecem inofensivos. Mas causam estragos. Tornam o enunciado ambíguo. Ou viram belo Antônio. Não têm função. Pau neles:
No (seu) pronunciamento, Lula condenou as Farcs.
No acidente, quebrou a (sua) perna, fratuou os (seus) dedos, arranhou o (seu) rosto.
Antes desair, calçou os (seus) sapatos, vestiu a (sua) blusa e pôs os seus óculos.
Pronome demonstrativo
Pegue o jornal. Abra-o em qualquer página. Leia artigos, reportagens, notícias. Lápis na mão, assinale os aqueles, aquelas e aquilo que aparecem no caminho. A conclusão é inevitável. O artigo (o, a) e o demonstrativo (o, a) caíram em desuso. A turma esqueceu-os. Em vez do discreto monossílabo, empanturra a frase com o pesadão trissílabo. Xô!
Meirelles critica aqueles que o criticam.
Melhor: Meirelles critica os que o criticam. Meirelles critica quem o critica.
Jesus disse que os mansos — aqueles que não recorrem à violência — possuirão a Terra.
Melhor: Jesus disse que os mansos — os que não recorrem à violência — possuirão a Terra. Jesus disse que os mansos — quem não recorre à violência — possuirão a Terra.
Aquilo que é escrito sem esforço é lido sem prazer.
Melhor: O que é lido sem esforço é lido sem prazer.
Pronome todos
Ser claro é obrigação de quem escreve. O artigo definido se presta a confusão de significados. Dobre a atenção quando for usá-lo. Ao dizer “os candidatos fazem campanha”, englobam-se todos os candidatos. Se não são todos, o pequenino não tem vez: candidatos fazem campanha. Para quem sabe ler, pingo é letra. Se o artigo engloba, o todos sobra em muitas situações. Corte-o sem pena:
Vou ao teatro todas as terças-feiras. (Vou ao teatro às terças-feiras.)
Todos os alunos que saíram perderam a explicação. (Os alunos que saíram perderam a explicação.)
Forma adiposa
Os textos abaixo estão louquinhos por uma lipoaspiração. Leia-os com cuidado. Depois, passe o motorzinho nas gordurinhas. Mande artigos e pronomes engordantes pro quinto dos infernos:
1. O índice de famílias governadas por mulheres constitui uma grande agressão. Elas são obrigadas a segurar aquela barra toda. É um absurdo.
2. Não considero nenhum progresso mulheres de negócio receberem rapazes de programa em seus escritórios. É uma desvirtuação total daquilo que foi o projeto feminino.
3. Por que todos os aposentados não recebem o que lhes é devido?
Forma enxuta
1. O índice de famílias governadas por mulheres constitui grande agressão. Elas são obrigadas a segurar a barra toda. É absurdo.
2. Não considero nenhum progresso mulheres de negócio receberem rapazes de programas nos escritórios. É desvirtuação total do projeto feminino.
3. Por que os aposentados não recebem o que lhes é devido?