Al Martin
O sufixo ável (ével, ível), acrescentado ao radical de verbos, transmite a ideia de ser passível de. O mesmo mecanismo, com as devidas adaptações ao espírito de cada língua, está presente nos outros falares românicos.
Assim, temos:
condenável = que se pode condenar
incompreensível = que não se pode compreender
utilizável = que se pode utilizar
indelével = que não se pode apagar
separável = que se pode separar
respirável = que se pode respirar
“Até aí, morreu o Neves”, retrucaria Nélson Rodrigues. Ou, mais brutalmente: “E daí?”
Daí que alguns adjetivos construídos assim destoam, deixam como um mal-estar, uma impressão de que alguma coisa está fora de lugar. Durante um bom tempo perguntei-me o porquê desse desconforto. E acabei descobrindo.
Na esmagadora maioria das vezes, o sufixo vem colado a um verbo transitivo direto. É fácil identificar — o transitivo direto rejeita preposição e responde sempre à pergunta que? o que? ou quem? Retomemos nossos exemplos:
condenável = que é que se pode condenar?
incompreensível = o que é que não se pode compreender?
utilizável = que é que se pode utilizar?
indelével = o que não se pode apagar?
separável = quem não pode ser separado?
respirável = o que é que se pode respirar?
O problema aparece quando, em raríssimos casos, o sufixo é unido a verbos transitivos indiretos, aqueles que exigem preposição. Embora alguns casos sejam abonados por bons dicionários, continuam deixando a impressão de que algo está errado. Por exemplo:
decisão irrecorrível = decisão da qual (ou contra a qual) não se pode recorrer
decisão inapelável = decisão da qual (ou contra a qual) não se pode apelar
ministério imexível = ministério no qual não se pode mexer
destino inescapável = destino do qual não se pode escapar
Apesar do jeitão meio esquisito, a língua oficial acolhe essas expressões. Portanto, todos podem usá-las sem medo de errar. Mas ninguém é obrigado a fazê-lo. Generosa, a língua oferece diversos caminhos mais tranquilizantes.