Filho sem mãe

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“Ele teve mãe.” Na redação do jornal, usamos a frase para definir homens cada vez mais raros. São os que, a qualquer hora, estão de barba feita e adequadamente vestidos. Parecem ter saído do banho naquele momento. Não só. São educados e gentis. Não poupam obrigados, desculpe-me e com licença. Bom-dia, boa-tarde e boa-noite estão sempre na ponta da língua. Dão prioridade à mulher, abrem-lhe a porta do carro e lhe puxam a cadeira no restaurante. Convenhamos: o produto é cada vez mais raro, mas existe.
 
Jérôme Valke não teve mãe. É a explicação para a referência deselegante feita por ele ao Brasil. Ao comentar os atrasos das obras para a Copa de 2014, o secretário-geral da Fifa disse que o país merecia um pontapé… ops! na bunda ou no traseiro? Uns jornais optaram por bunda. Outros por traseiro. Por quê?
 
O significado é o mesmo. Mas a conotação muda. Bunda é termo mais cru, mais direto. Traseiro vem com cobertura de açúcar. Parece menos ofensivo. A escolha tem a ver com dois fatores. Um: a indignação do falante. O outro: a preocupação com o leitor. Eis o que diz o Manual de redação e estilo para mídias convergentes:
 
“Seja respeitoso. Boa parte das pessoas se indigna com palavrões, obscenidades e expressões chulas. Só as acolha em situações excepcionais. É o caso de manifestação de alguém quando a palavra tiver indiscutível valor informativo ou refletir a personalidade de quem a profere.”
 
Vale a pergunta: bunda é desrespeitoso? Não. “A pele dela parece bunda de bebê”, costumamos elogiar cútis nutridas e sem manchas. Desrespeitoso foi o secretário. A palavra, como diz o manual, “reflete a personalidade de quem a profere”.