Everardo Leitão escreve

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Professora Dad,

              Queria comentar que a tão divulgada informação de que a jabuticaba é fruta brasileira parece menos fato que patriotada do país do Fuleco. Como nós todos vivemos repetindo, discursou recentemente o senador Álvaro Dias: “No Brasil, sabemos que a jabuticaba é autóctone, é exclusivamente brasileira, não dá em outro lugar do mundo”.

      Sabemos, mas será certo? O dogma é mesmo tão generalizado que virou até mote para ditados, porém a decepcionante verdade é que a fruta também adoça a boca e tinge a roupa de hermanos, alguns vizinhos e outros nem tanto.

           Não sou do ramo e não tenho autoridade para expedir a certidão de batismo da jabuticaba, mas posso dizer que os paraguaios, por exemplo, ignorando solenemente nossa pretensão a pais da criança, chupam yvapovo como se não se tratasse de nossa jabuticaba. Não pagam royalties, não pedem licença nem ficam vermelhos por invadir o pomar privativo do país da Riroca.            

E pior: acham que estão chupando uma fruta paraguaia! Isso pelo simples detalhe de que colhem yvapovo no quintal de casa desde o tempo dos avós dos bisavós. Também porque a árvore nasce lá sem precisar plantar. Ah, também porque é registrada na internet como “árbol tipicamente paraguayo”. Só por isso.

   Na verdade, sofrem de uma espécie de miragem, porque a jabuticaba é – como o samba, a feijoada e a impunidade antes de Joaquim Barbosa – exclusividade do país da Zabelê. Não importa que seja nativa também da Argentina, da Bolívia e até, dizem, de Honduras e de El Salvador. É nossa e ponto.              

            Pois é: não é.            

        Não é fruta brasileira. Pelo menos não apenas brasileira como se acredita. Parêntese: nem o equívoco ufanista é coisa nossa – cruzada a Ponte da Amizade, é comum ouvir a expressão “tão paraguaio quanto a mandioca”. Diga-se uma coisa dessas a um nordestino diante do escondidinho, da vaca atolada ou da macaxeira com mel do café da manhã!

           Aliás, o certo é que alguns outros frustrantes golpes contra nosso grito de Procedência ou morte! podem ser apontados sem sair da vizinhança americana. Beiju ou tapioca é o mbeju guarani que meio mundo faz e come; canjica é a mesma mazamorra que se degusta em Assunção ou no interior da Argentina; pé de moleque tem um sósia no ka’i ladrillo. Nossos pão e biscoito de queijo flertam com a chipá paraguaia.

         Pamonha, então, é um prato verdadeiramente internacional: chamada por nomes como tamal, ka’i ku’a ou humita, frequenta mesas desde a Argentina até os enclaves hispano-brasucas dos Estados Unidos, passando por Chile, Paraguai, Peru, Cuba e México. Sempre com pequenas variações, é claro. Mas na essência a mesma iguaria de milho cozida na palha.            

         Como se vê, ainda que o país da Nana Shara viva de costas para os vizinhos, somos mais latino-americanos que sonha nossa vã gastronomia.   Um abraço,

Everardo Leitão