Mensagem
Em que ocasiões posso usar o ponto e vírgula? Nunca sei. (Juliana Duarte, 20 anos)
A dúvida, Juliana, não é só sua. Passeie os olhos por jornais e revistas. Raramente você verá o sinalzinho casado. Por quê? Poucos conhecem as manhas da criatura. Ele é muito sofisticado. Basicamente, tem dois empregos:
1. Separa termos de uma enumeração. Nesse caso, é arroz de festa de leis, decretos, portarias. Até Deus o usou:
São mandamentos do Senhor: A – Amar a Deus sobre todas as coisas; B – Não tomar seu santo nome em vão; C – Honrar pai e mãe; D – Não matar; E – Não roubar; F – Não desejar a mulher do próximo;
Reparou? O casadinho fica no meio do caminho. No lugar dele poderia estar a vírgula. Ou o ponto. Por isso, muitos nem se preocupam em dar-lhe a vez. No aperto, partem pra outra. E se dão bem.
2. Muitas vezes a duplinha torna o texto mais claro. Com isso, facilita a vida do leitor. Quer ver? Examine esta frase:
João trabalha no Senado, Pedro trabalha na Assembléia, Carlos trabalha no banco, Beatriz trabalha na Universidade, Alberto trabalha no shopping.
A frase está correta e clara. As vírgulas separam as orações coordenadas. Mas há um defeito. A repetição do verbo torna-a cansativa. O que fazer? Há uma saída. A gente mantém o trabalha na primeira oração. E mete-lhe a faca nas demais. No lugar deles, põe a vírgula:
João trabalha no Senado, Pedro, na Assembléia, Carlos, no banco, Beatriz, na Universidade, Alberto no shopping.
Cruz-credo! À primeira vista, o período virou o samba do texto doido. Quem bate o olho na frase não entende nada. O jeito é recorrer ao ponto e vírgula. Ele vai separar as orações coordenadas:
João trabalha no Senado; Pedro, na Assembléia; Carlos, no banco; Beatriz, na Universidade; Alberto, no shopping.
Chique, não? Veja mais exemplos:
Eu estudo na USP, Maria estuda na UFP. (Eu estudo na USP; Maria, na UFP.)
Alencar escreveu romances, Drummond escreveu poesias. (Alencar escreveu romances; Drummond, poesias.)
Podemos viver sem o ponto e vírgula. Mas, com ele, aumentamos as possibilidades de escolha. Talvez por isso Mário Quintana tenha escrito: “A Maria Eugênia é muito inteligente. Ela sabe usar ponto e vírgula”.
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Perdi pontos quando comecei uma narração no passado e não soube a hora de voltar a escrever no presente. Há alguma regra para isso? (Aline Santana, 18 anos)
Não seja murista, Aline. Decida-se. Você pode narrar um fato no presente. Mantenha o tempo até o fim. Pode preferir o passado. Conserve o pretérito até bater o ponto final. Veja um exemplo. Manuel Bandeira escolheu o passado pra contar a história do João Gostoso. Nós a reescrevemos no presente:
João Gostoso era carregador de feira livre e morava no Morro da Babilônia num barracão sem número. / Uma noite ele chegou no Bar Vinte de Novembro. / Bebeu. / Cantou. / Dançou. / Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.
João Gostoso é carregador de feira livre e mora no Morro da Babilônia num barracão sem número. / Uma noite ele chega no Bar Vinte de Novembro. / Bebe. / Canta. / Dança. / Depois se atira na Lagoa Rodrigo de Freitas e morre afogado.
Viu? É lé com lé, cré com cré. Misturar lé com cré? É a receita do cruz-credo.
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Em que ocasiões devo usar incluído e incluso? (Amanda Silva, 17 anos)
Incluir, Amanda, joga no time dos verbos abundantes. Generosos, eles têm mais de um particípio. Um regular, terminado em -ado ou -ido. Outro irregular, mais curtinho. É o caso de matar e imprimir (matado e morto, imprimido e impresso), Quando usar um ou outro? Depende do auxiliar. Use o regular com os auxiliares ter e haver; o irregular, com ser e estar:
Ele havia (tinha) incluído o documento no processo. O documento foi (está) incluso no processo. O caçador tinha (havia) matado a perdiz. A perdiz foi (está) morta. O advogado tinha (havia) incluído o documento no processo. O documento foi (está) incluído. ***
Quando uso por meio de e através de? (Felipe Yung, 18 anos)
Antes, usava-se através de no sentido de atravessar. Assim: Vejo a paisagem através da janela. O conceito de beleza mudou através dos tempos.
Modernamente, Felipe, usa-se o por meio de mesmo no sentido de através de. O Aurélio e o Houaiss abonam o emprego.
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Minha dúvida é quanto ao uso do hífen na nova reforma ortográfica. Pode me ajudar? (Rafaela Viegas, 21 anos)
O hífen é castigo de Deus. Cheio de regras e exceções, dá nó nos miolos dos estudantes e profissionais. A reforma trouxe alguma simplificação às normas, mas nos obriga a recorrer ao dicionário com frequência. De qualquer forma, vale a pena conhecer as duas regras de ouro. Sobre os prefixos, use hífen:
quando eles forem seguidos de h: anti-hisórico, super-homem, a-histórico, sobre-humano
2. quando duas letras iguais se encontram: micro-ondas, semi-imperialista, sub-bloco
Em bom português: O h é soberado. No mais, os diferentes se atraem. Os iguais se rejeitam: semi-histórico, semi-industrial, semicírculo.
Olho vivo: co– e re– sofrem de alergia. Não aceitam o tracinho nem a pedido dos orixás: coerdeiro, coordenar, reeducação.
Sub é cuidadoso. Pra evitar a formação de encontro consonantal (como em abraçar), pede mais um hífen. O tracinho tem vez quando antecedido de r: sub-raça, sub-região. .