Com x ou ch? S ou z? As dúvidas são muitas. As respostas, escassas. Há poucas regras de grafia. A escrita correta do vocábulo é fruto muito mais de fixação da forma que de memorização de regras. Escrevemos hospital com h não por conhecer a etimologia da palavra ou por termos estudado norma especial. Mas por a vermos grafada dessa maneira.
Por isso, quem lê regularmente escreve os vocábulos do jeitinho que o dicionário manda. Na dúvida, o pai de todos nós socorre. Bem-vindo, Aurélio. Bem-vindo, Houaiss. Bem-vindo Michaelis. Às vezes, porém, a dúvida bate. Mas não há dicionário por perto. O que fazer? O jeito é rezar para que as poucas regras existentes quebrem o galho.
Uma delas, pra lá de produtiva, vale ouro. Trata-se da todo-poderosa família. “Tal pai, tal filho”, prega ela. Em bom português: as palavras derivadas seguem a primitiva. Umas e outras mantêm a grafia original sem tossir nem mugir:
trás, atrás, traseiro, atraso, atrasar, atrasado
casa, casinha, casebre, casarão, caseiro, casamento, acasalar
gás, gasolina, gasoduto, gasoso, gaseificado
cruz, cruzar, cruzinha, cruzada, cruzeiro
exame, examinho, examinador, examinar, examinado
As palavras, como as pessoas, não são todas santas. Entre elas, existem as que pulam o muro. Formam, então, duas famílias. Uma erudita, vinda lá do latim. Outra popular, nascida depois que a língua-mãe se transformou em português. Sobram exemplos de useiros e vezeiros da prática da duplicidade.
Num caso e noutro, a família canta de galo. Se o nobre faz filhos, a criança terá sangue azul. Se o plebeu gerar meninos e meninas, a moçada não negará a raça. Sangue vermelho lhe correrá pelas veias. Veja o exemplo do clã adocicado. Doce, docinho, docemente, adocicar, adocicado, dócil, docilidade são gente como a gente. Dulcificar, dulcificação, dulcificante, dulcífico, dulcíssimo, dulcíssono exibem cetros e coroas.
Moral da história: na língua impera a democracia. A lei da família vale pra todos.