Doze pragas da língua (comentadas)

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Feriado é festa. A folga deixa os compromissos pra lá, reúne amigos, promove bate-papos. No 21 de abril não foi diferente. Jornalistas saíram da redação e foram tomar um chopinho. Na conversa vadia, um deles quis satisfazer velha curiosidade. Qual, na opinião de gente que ganha o pão de todos os dias falando ou escrevendo, seriam as 12 pragas da língua?

A questão incendiou os ânimos. Todos davam palpites. Fala daqui, discute dali, pintou uma lista. Você pode ou não concordar com a seleção. Pode excluir maldições ou acrescentar outras. Mas uma coisa é certa: a turma tem sensibilidade. Boa parte das escolhidas dá otite. Uiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!

Uma

Gerundismo. Trata-se da tal história do vou estar mandando, vou estar providenciando, vou estar aprontando. Quem embarca nessa canoa furada cortou relações com o futuro. O porvir tem duas formas. Uma: o futuro simples (mandarei, providenciarei, aprontarei). A outra: o composto (vou mandar, vou providenciar, vou aprontar). Sugestão: fazer as pazes com o tempo que olha pra frente.

Duas

Eu adéquo, ele adéqua. O verbo adequar joga no time dos preguiçosos. Defectivo, só se conjuga nas formas em que a sílaba tônica cai no q ou depois do q (adequamos, adequais, adequarei, adequasse). Sugestão: deixar o indolente pra lá. Adaptar o substitui com galhardia.

Três

Houveram. No sentido de existir ou ocorrer, o haver não tem sujeito. Impessoal, só se conjuga na 3ª pessoa do singular: Houve distúrbios nas festas. Nunca houve confusões na saída do trabalho. Houve manifestações a favor do presidente. Sugestão: corte o houveram da sua vida. Ele não faz falta.

Quatro

A nível de. O trio não existe. As formas são ao nível de (= à altura de) e em nível de (= no âmbito de) — Santos fica ao nível do mar. Decisão tomada em nível de diretoria. Curso em nível de pós-graduação. Sugestão: abra mão do em nível de. Ele engorda a frase: Decisão tomada pela diretoria. Curso de pós-graduação.

Cinco

Seje, esteje. As formas são seja, esteja. Sugestão: memorize a grafia nota 10.

Seis

De formas que. As locuções terminadas com que são conjuntivas. Conjunção não tem plural. A locução, vaquinha de presépio, vai atrás (de forma que). Sugestão: diante da tentação de pôr o s, pare, pense e desista.

Sete

Pronúncia de gratuito e subsídio. Gratuito se pronuncia como circuito e fortuito. Subsídio, como subsolo. Sugestão: na dúvida, lembre-se de circuito e subsolo. Ou troque seis por meia dúzia. Em vez de gratuito, diga grátis.

Oito

Se eu deter, caber, trazer, pôr, ver. O futuro do subjuntivo se forma do pretérito perfeito do indicativo: detive (detiver), coube (couber), trouxe (trouxer), pus (puser), vi (vir). Sugestão: lembre-se de que os verbos têm pai e mãe.

Nove

Chavões. De tão batidas, expressões perdem o frescor. É o caso de inserido no contexto, pontapé inicial, salvação da pátria, sol escaldante, inflação galopante. Sugestão: Xô, comodismo! Vem, criatividade!

Dez

Formas empoladas, rebuscados ou malformados. Tecnologizado, agudização, consubstanciação, rentabilizar, perdoalizar, problemática, dialogal e outros do time são a receita do cruz-credo. Sugestão: Fora!

Onze

Cacofonias. A sílaba de uma palavra se encontra com a de outra e nasce um mostrengo indesejado. É o caso de por cada, por tão, por tal, boca dela. Sugestão: leia o texto em voz alta.

Doze

Pleonasmos. Vivemos a era do menos é mais. Redundâncias pegam mal. Subir pra cima, descer pra baixo, elo de ligação, sorriso nos lábis, surpresa inesperada, minha opinião pessoal, avançar pra frente, continua ainda, criar novo são exemplos de desperdício. Sugestão: siga o conselho dos mineiros. Quando o filho saiu de casa pela primeira vez, o pai lhe disse: “Meu filho, não saia. Se sair, não gaste. Se gastar, não pague. Se pagar, pague só a sua.