Dizer o que é sem tirar nem pôr

Publicado em Geral
 

O que é isso? O que é aquilo? O que é aqueloutro? Crianças
não se cansam de perguntar. A gente responde o que pode. Muitas vezes não dá
conta. Diz, então, qualquer coisa. Meninos e meninas, que não têm tempo a
perder, fingem que acreditam. Dão meia-volta e partem pra outra.

 
Na vida profissional a história não é tão fácil. Há
momentos em que temos de definir. Precisamos de engenho, arte e, sobretudo
técnica pra dizer o que é que queremos dar a entender quando empregamos uma
palavra ou nos referimos a um objeto ou ser. O desafio: o definido só pode ser o
definido — sem possibilidade de confundir-se com outro.
 
 
Como chegar lá?
 

A definição não é filha de chocadeira. Tem berço,
trajetória e estrutura composta de quatro elementos. É importante respeitá-los e
dispô-los como manda a lógica:

 

a. termo — o ser que será
definido

b. cópula — o verbo ser

c. gênero — a classe (ou ordem) de coisas
a que pertence o termo

d. diferenças — tudo o que distingue o termo definido de outros da mesma
classe

 

Examine os exemplos:

 

Homem é um animal racional.

(O termo é homem. A cópula, é. O gênero, animal. A
diferença, racional.)

Substantivo é a classe de palavras que dá nome aos
seres.

(O termo é substantivo. A cópula, é. O gênero, classe de
palavras. A diferença, que dá nome aos seres.)

 
Quadrado é um quadrilátero de ângulos retos e lados
iguais.
(O termo é quadrado. A cópula, é. O gênero, quadrilátero. A
diferença, de ângulos retos e lados iguais.)

Falar é exprimir-se por meio de palavras.
(O termo é falar. A cópula, é. O gênero, exprimir-se. A
diferença, por meio de palavras.)
 
 
Sem bobeira

Olho vivo. Às vezes o enunciado tem cara de definição, mas
definição não é. Se você pergunta a uma criança o que é chuva, é bem provável
que ela responda “chuva é quando chove”. Será? Quando chove há chuva. Mas chuva,
segundo o Aurélio, “é a precipitação atmosférica formada de gotas de água cujas
dimensões variam entre 1mm e 3mm, por efeito da condensação do vapor de água
contido na atmosfera”.

 
 
Tira-teimas

A definição tem exigências das quais não abre mão. Como
saber se elas foram atendidas? Há jeitos. Ela deve:

 

1. ser breve — formada de uma só frase.

 

2. ser expressa em linguagem simples, familiar ao leitor
ou ouvinte.

 

3. ser afirmativa (dizer o que é, não o que não é). Não há
definição quando se diz que “homem não é cachorro”.

 

4. ser recíproca pra ser completa e satisfatória. O “homem
é um ser vivo” não é definição porque nem todo ser vivo é homem. Peixe é ser
vivo, mas não é homem.

 
 
Mais

5. O termo deve pertencer ao gênero. Homem é animal, não
vegetal ou coisa. Quadrado é quadrilátero, não móvel ou ferramenta. Substantivo
é classe de palavra, não carro ou dicionário.

 
6. O gênero tem requisitos. Deve ser suficientemente amplo
pra compreender a espécie definida e suficientemente restrito pra que as
características do termo definido sejam entendidas sem confusão de espécies.
Dizer que homem é “ser vivo”? Ops! O gênero é pra lá de amplo. Inclui milhões de criaturas que nada têm a ver
com o homem. Dizer que o homem é “animal que vive na cidade” é demasiadamente
restrito. Exclui outros
homens.
 
7. A estrutura gramatical é rígida: o termo e o gênero têm
de pertencer à mesma classe de palavras : homem (substantivo) é
animal (substantivo). Falar (verbo) é
exprimir-se (verbo). Quando agurizada diz que chover é “quando
chove”, “quando chove” não é verbo como chover. É oração. Não vale.
 
8. Não se pode usar no gênero o termo que se está
definindo. Dizer que homem é homem, gato é gato, móvel é movel ninguém discute.
Mas não é definição.
 

Ufa! Definição
é isso.