São sete as notas musicais. Nós as conhecemos de cor e salteado — dó, ré, mi, fá, sol, lá, si. O nome delas tem origem pra lá de curiosa. Até o ano 1000, a transmissão das músicas se fazia oralmente. O monge beneditino Guido Arezzo não se conformava com a restrição. Queria porque queria que as composições fossem guardadas e reproduzidas. Como? Precisavam ser escritas. Para dar nome às notas, tomou a primeira sílaba de cada verso de um hino de louvor a São João Batista. Do primeiro ao último verso, a 1ª sílaba subia de dó a si. Eis a forma latina:
Ut queant laxis Resonare fibris Mira gestorum Famuli tuorum Solve polluti Labii reatum Sancte Iohannes
Tradução: Para que teus servos/ Possam, das entranhas/ Flautas ressoar/ Teus feitos admiráveis / Absolve o pecado / Desses lábios impuros/ Ó São João.
No século 17, houve a troca de ut por dó, mais fácil de cantar. O si nasceu da abreviação de sancte Iohannes (em português, São João).
“Oba!”, exclamaram as oxítonas. Elas sabem que na natureza nada se perde. Tudo se aproveita. As danadinhas copiaram a acentuação gráfica das notas musicais. Comodistas, os monossílabos não perderam tempo. Seguiram as oxítonas. Vamos às sete notas linguísticas?
Mesmo modelo
Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si. Viu? Ganham acento as notas terminadas em a, e e o. As oxítonas também. Acentuam-se as terminadas com as mesmas vogais seguidas ou não de s: sofá, sofás; você, vocês; cipó, vovó, vovôs.
As terminadas em i e u não querem saber de chapéus ou grampinhos: parti, aqui, abacaxis, caju, urubus.
Lo, la
Desvendado o mistério. Os verbos seguidos de lo, la são oxítonos. Só se acentuam os terminados em a, e e o. Assim: amá-lo, vendê-lo, compô-lo. Mas: parti-lo, dividi-lo, corrigi-la.
Sem confusão
Olho vivo! Nada de confusão com a quebra de ditongo. Sai não tem acento. Saí tem. Varapau dispensa grampo. Baú exige. A razão: o agudo não tem nada a ver com as oxítonas. Ele aparece para evitar que se pronunciem as duas letras numa só emissão de voz. O fenômeno ocorre em ocasião especial. O i ou u têm de preencher três condições. Uma: serem antecedidos de vogal. Outra: formarem sílaba sozinhos ou com s. A última: não serem seguidos de nh: sa-í, e-go-ís-ta, sa-ú-de, sa-ú-va. Mas: ra-I-nha, cam-pa-i-nha, la-da-i-nha.
Monossílabos
Os monossílabos se dividem em dois times. O primeiro: os átonos. Fraquinhos, os membros dessa equipe perna de pau não podem formar frases sozinhos. Precisam de companhia. O artigo, por exemplo, precisa do substantivo (os livros, a casa). O pronome necessita do verbo (pede-me, calou-se). E por aí vai.
Os tônicos, ao contrário, são donos e senhores do pedaço. Figuram sozinhos na frase. Os terminados em i e u são sempre tônicos. Por isso nunca, nunca mesmo, aceitam acento (cru, nus). Os terminados em a, e e o, seguidos ou não de s, precisam do acento sim, senhor: dá, dás; vê, vês; pó, pós.
Nome das letras
O nome das letras é sempre tônico. Ao grafá-las, obedeça à regra dos monossílabos (á, é, i, ó, u): Escreveu as letras de á a zê. Desconhece até o á, é, i, ó, u.
Pegadinha
Concurseiros são vítimas preferenciais dos examinadores. As bancas adoram pegadinhas. Uma delas: o acento de ás (ás de ouro, ás do volante, ás do futebol) é diferencial? Faça a sua aposta:
a. sim
b. não
Escolheu a letra b? Acertou. Ás não se acentua para distinguir-se da sósia — o artigo as (as casas). Acentua-se por ser monossílabo tônico.
Lembrete
Em português, só existem duas palavras com acento diferencial. Uma: pôde, passado do verbo poder (hoje ele pode, ontem não pôde). A outra: o verbo pôr. O chapéu aparece para que não confundamos a preposição por (vou por este caminho) com o verbo (vou pôr o livro sobre a mesa). Duvida? Compare pôr com dor, cor e for. O trio não tem sósias. Dispensa circunflexos e agudos. Xô!