A Páscoa e a língua

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  Os hebreus nos legaram senhora herança. Entre os bens que deixaram, a língua sobressai. Páscoa ganha destaque no dia de hoje. A palavra — tão antiga quanto Adão e Eva — quer dizer passagem. Na origem, não tinha nenhum parentesco com religião. Bem antes de Moisés vir ao mundo, os pastores nômades comemoravam a Páscoa. Cantavam e dançavam pela despedida do inverno e a chegada da primavera. Na nova estação, a neve se ia. Os campos se cobriam de pastagens. Os alimentos abundavam.

Mais tarde, os judeus começaram a festejar a Páscoa. Lembravam, com sacrifícios, a saída do povo de Israel do Egito. Era a passagem da escravidão para a liberdade. No livro Êxodo, a Bíblia conta toda a história. Em 325, os cristãos instituíram a Páscoa. Com ela, exaltam a ressurreição de Cristo. Em outras palavras: a passagem da morte para a vida. Para católicos e protestantes, a Páscoa simboliza a morte vicária. Jesus morreu em lugar dos homens. Para salvá-los.   Os vicários

A religião fala em morte vicária. A língua, em termo vicário. Ambos têm dois pontos comuns. O primeiro: a substituição. A morte de Cristo substituiu a dos homens. O termo vicário toma o lugar de outro citado. O segundo: o objetivo nobre. Jesus salvou os homens. O vicário evita repetição.

É o caso do pronome pessoal da 3ª pessoa. Ele e ela ocupam o lugar de um nome referido. O texto agradece. Escrever a mesma palavra pertinho uma da outra? Valha-nos Deus! A frase fica monótona. O vicarinho quebra o galho. Aprecie:

João, Rafael, Kadu e Carlos estão felizes. Eles descobriram montões de ovinhos no jardim de casa. *Muitas pessoas têm triplo expediente. É o caso de Maria. Ela trabalha das 8h às 18h. Depois, estuda.   Mais exemplos

Verbos também desempenham papel vicário. O campeão da turma é o fazer. Num piscar de olhos, lá está ele no lugar de outro. Observe:

A Polícia Federal anunciou que a Operação Monte Carlo seria uma bomba. Demorou a abrir o jogo. Quando o fez (= abriu o jogo), surpreendeu gregos e troianos. Ninguém esperava que o senador Demóstenes Torres estivesse envolvido com a gangue do Cachoeira

A frase jocosa atribuída a Jânio Quadros entrou no folclore. Nela, o bigodudo abusou do vicário:

– Por que o senhor renunciou?, perguntaram os repórteres.

– Fi-lo (renunciei) porque qui-lo (quis renunciar), respondeu o homem da vassourinha.