Tem chumbo no vinho ou nas taças de cristal?

Publicado em DÚVIDAS MAIS FREQUENTES

O leitor Rudinei pergunta: “já ouvi que algumas cápsulas de garrafas de vinho são ou eram feitas de chumbo ou estanho, e que esse material é tóxico e perigoso para o ser humano, e por isso retirar toda a cápsula talvez fosse até melhor do que cortá-la no gargalo para não correr o risco de algum resíduo do recorte se soltar e ir parar na taça. O que há de verdade sobre isso? Fato ou fake?”

 

 

Na sua origem a utilização da cápsula tinha o objetivo básico de proteger a rolha de cortiça do ataque de roedores ou insetos. Também para evitar que ficassem muito úmidas e mofassem. Posteriormente acrescentou-se uma função estética, como um complemento aos rótulos do vinho.

E o chumbo e o estanho eram baratos, maleáveis e cumpriam muito bem este papel de proteção da rolha. O estanho antigo podia conter quantidades variáveis ​​de chumbo, já o estanho moderno, de fabricantes sérios, geralmente contém pouquíssimo chumbo, mas não confio nos produtos mais antigos.

E estes metais, principalmente o chumbo, foram utilizados durante séculos até o início da década de 1990, quando cresceram os receios sobre a possibilidade de, ao se abrir a garrafa, resíduos de chumbo caíssem no vinho, alterando o seu sabor, sendo que esta absorção prolongada causaria a intoxicação do consumidor com sérios danos à sua saúde.

Em 1996 os EUA proibiram a utilização das cápsulas com chumbo em seu território e a importação de garrafas que o utilizassem. Logo diversos outros países adotaram a mesma postura.

Uma pausa para um momento de nostalgia, lembro de ter cortado o dedo umas duas vezes com estas navalhas de chumbo.

O envenenamento por chumbo geralmente não possui sintomas iniciais, mas a exposição prolongada pode causar problemas significativos com sintomas como fraqueza, fadiga, enjoo, cólicas, vômitos e dores de cabeça. Atacando o cérebro e o sistema nervoso causando letargia, coma e até a morte. A doença se chama Saturnismo ou plumbismo.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima em mais de 5 milhões de mortes anuais por conta da contaminação por chumbo. Mas calma a culpa não é do vinho. O metal está presente, muitas vezes em quantidade acima da estabelecida na legislação nos mais diversos produtos desde maquiagens, enlatados a tintas. 

O limite máximo estabelecido pela Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV) a partir da vindima de 2022 é de 0,10 mg/L. Até 2012 o limite era de 0,20 mg/L, o dobro.

Mas de onde surge este chumbo no vinho se a cápsulas modernas são de outros materiais? O aparecimento dele no vinho se deve a uma conjunção de fatores na etapa da vinificação, desde a absorção do chumbo presente na terra; poluição atmosférica; água; contato com materiais impuros durante as etapas da vinificação e conservação dentro das vinícolas. A utilização de bentonite (um tipo de argila utilizada na filtragem) e a aguardentação dos vinhos fortificados também podem trazer esta contaminação.

Um pouco de história. No Império Romano para corrigir a acidez e adoçar os vinhos era produzido o “sapa” uma espécie de xarope obtido ao ferver o suco de uva não fermentado, até reduzir a um terço do volume inicial. Ficando com uma grande concentração de açúcares. Mas isto era feito em recipientes que continham chumbo e o liquido ficava contaminado com acetato de chumbo com níveis 200 vezes superiores aos hoje aceitos.

Mas tudo que já está ruim pode piorar. Os romanos descobriram uma maneira de transformar este açúcar de chumbo em cristais, como o açúcar cristal. Mas não demonizem apenas o vinho, até quem só bebia água se contaminava, uma vez que os canos que a transportavam também eram de chumbo. Esta herança romana dos canos de chumbo também provocou uma epidemia de contaminação em Londres.

Segundo alguns pesquisadores até a surdez de Beethoven pode ser consequência do envenenamento por chumbo devido ao consumo de vinhos baratos em que eram adicionados chumbo para melhorar o sabor. Para piorar os remédios que tomava para curar os efeitos da intoxicação também continham chumbo.

Como imagino que vocês saibam o cristal é vidro com a adição de algum metal e o chumbo sempre foi o mais utilizado. E o que acontece quando utilizamos taças, decanters ou garrafas de cristal? Vem aí uma má notícia, o cristal libera chumbo nas bebidas. Mas a quantidade vai se relacionar com dois fatores principais.

Primeiro vai depender da porcentagem de chumbo presente no cristal. Depois, muito importante, o tempo de contato com a bebida.

O vinho em um decanter ou garrafa deste tipo de cristal, após uma hora terá o seu teor de chumbo duplicado e multiplicado por três após quatro horas.

Nas taças há a expectativa que não haja tempo para a contaminação. Mas para que se arriscar.

Mas existe uma solução para a utilização tranquila das taças, decanters e garrafas, é o chamado cristal ecológico onde o titânio entra como o metal da sua composição, e ainda são mais resistentes.

Portanto respondendo ao Rudinei: cápsulas de chumbo são prejudicais à saúde? Fato ou fake? FATO!

 

4 thoughts on “Tem chumbo no vinho ou nas taças de cristal?

  1. Parabéns e muito obrigado! Resposta absolutamente esclarecedora e, de certa forma, tranquilizadora: o vinho está bem mais longe do que eu supunha de ser um vilão nesta história!

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