Sobre Aniversário, Despedidas e Demências

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Cosette Castro & Luziney Ferreira

Brasília – O dia em que Brasília completa 65 anos deveria ser um dia alegre. Mas não é. Há uma comoção mundial pelo falecimento do Papa Francisco que extrapola credos, nações, línguas e continentes.

Francisco, o único Papa latino-americano, fez a opção preferencial pelos pobres, pelas mulheres, pelos refugiados, pela população LGBTQIA+ e pelas pessoas idosas.

Foi o primeiro Papa a falar sobre machismo, a chamar atenção sobre envelhecimento, a  se manifestar publicamente sobre cuidado coletivo indo mais além da religião. Também falou sobre solidão e sobre a amizade social como uma forma de amor. Algo que no Coletivo Filhas da Mãe chamamos “família afetiva”.

O Papa Francisco estimulou constantemente o diálogo entre as diferentes religiões, pediu pela paz e defendeu a natureza. Quem diria que no século XXI as pessoas católicas teriam um Papa ecologista?

Não apenas isso. O argentino nascido Jorge Mario Bergoglio abalou as estruturas da Curia Romana ampliando a participação das mulheres e de populares nas esferas de decisão da Igreja Católica. Não por acaso há um ano as alas conservadoras e fundamentalistas da Igreja vêm lançando documentos sobre o que deveria mudar com a chegada de um novo Papa.

No Coletivo Filhas da Mãe não falamos de religião nos grupos de WhatsApp nem em outras redes sociais digitais. Respeitamos todas as religiões, inclusive o direito a não ter religião.

No entanto, algumas pessoas, como o  Papa Francisco, o Padre Julio Lancellotti e o deputado federal e pastor Henrique Vieira, dão exemplo de um humanismo que extrapola igrejas, templos e opções religiosas. Estão entre as pessoas amorosas,  cujos caminhos são movidos pela solidariedade e pelo cuidado coletivo.

Neste feriado brasiliense o Blog abre espaço para a neuropsicóloga aposentada Luziney Ferreira contar sua história e os desafios com a  mãe, D. Lucia.

Luziney Gonçalves Alcará Ferreira –  “Tenho 60 anos e sou mãe de um casal de filhos. Recentemente nos mudamos do entorno de Brasília para o Mato Grosso em função do trabalho do meu esposo. Meus filhos fazem faculdade no Mato Grosso do Sul, cada um em uma cidade.

Venho de uma família com dois irmãos e minha mãe foi diagnosticada com demência precoce  aos 59 anos. O diagnóstico foi Alzheimer. Ela era gêmea e sua irmã também teve demência, mas faleceu no início dos sintomas.

Elas eram filhas de uma mãe que também teve a doença, mas não foi precoce. Minha avó já estava com 80 anos quando foi diagnosticada. Minha mãe é diabética e foi diagnosticada no início da doença. Ela recebeu todo o tratamento disponível para frear o Alzheimer,  mas a doença  seguiu avançando.

Ela foi ficando cada vez mais esquecida,  foi perdendo a capacidade de se comunicar, mesmo fazendo estimulação cognitiva, fonoterapia, fisioterapia. Até parar de falar de vez. Depois ela parou de andar. Hoje, com 80 anos,  se encontra em homecare e cuidados paliativos.

Foi uma fase difícil para a família. Víamos nossa mãe declinar dia a dia. Tínhamos esperança de que a doença estacionasse, mas o declínio continuava e não tínhamos orientação de como lidar com as dificuldades que surgiam.

Com poucas informações, era preciso muita paciência e amor para ir contornando os desafios diários e buscar soluções para as dificuldades. Se não funcionava de um jeito a gente achava uma maneira diferente de solucionar. E tentava, tentava. Assim acabava dando certo. O mais importante para nós era não estressá-la.

Ela era jovem ainda e nós também. Nossos filhos ainda eram crianças e precisavam de cuidados. E todos estávamos  trabalhando. Foi uma fase desafiadora. Ela demitia a cuidadora todo dia e assim íamos tentando lidar.

Era uma época em que nem os profissionais tinham experiência no manejo com esses pacientes e a gente não encontrava muita coisa na literatura. O jeito era usar o bom senso, as nossas experiências de vida e nosso amor por ela. Mamãe sempre foi uma pessoa ativa, dedicada à família, inteligente e a frente do seu tempo.

Até hoje minha mãe recebe todo o cuidado e carinho possível. Eu sou a filha que mora longe. Sou uma co-cuidadora, mas sempre procuro visitá-la e também saber notícias. Participo de todas as decisões e procuramos seguir o que sabemos que ela gostaria. Nos tornamos mais unidos e mais fortes ao decidir tudo em conjunto.

Com a demência percebemos a importância do cuidado com a nossa saúde física e mental. Estamos sempre trocando informações sobre o que é bom para nossa saúde. Meu pai tem 90 anos, é saudável e ainda dirige. Nós cuidamos dele também”.

Na terça-feira, 22, é dia do Programa de entrevista online Terceiras Intenções de abril. Ao vivo das 19 `as 20h. A jornalista Mônica Carvalho vai receber a Secretária Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, Anna Paula Feminella.  Elas vão conversar sobre os “Desafios da Inclusão e da Longevidade”. Link aqui.

 

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