Ana Castro & Cosette Castro
Brasília – Há uma década o mundo ficou sabendo que o escritor e jornalista Gabriel García Marquez tinha demência. Doença que também acometeu sua esposa, Mercedes, logo depois da morte do escritor em 2014.
Em 2012 para a maior parte dos leitores e leitoras de Gabo, como era carinhosamente chamado o escritor colombiano, foi difícil entender como uma das mentes mais criativas e brilhantes da América Latina poderia ter demência. Além de criar o realismo mágico em seus livros e ter ganho o Nobel de Literatura, Gabo foi referência no jornalismo investigativo e nas escolas de cinema.
Não foi o único caso entre pessoas famosas. De Presidentes da República a artistas. As demências também atingem ricos e poderosos. Atingem pessoas com alto nível de leitura, conhecimento e cultura, assim como pessoas com fragilidade social e baixo nível de escolaridade.
O ex-Presidente Ronald Reagan estava na fase inicial do Alzheimer durante a presidência dos Estados Unidos e seguiu no cargo apoiado por seus assessores. Seus lapsos de memória se tornaram famosos. Em 1994, ele escreveu uma carta aberta revelando que estava enfermo, como contribuição para conscientizar sobre a doença.
No Brasil, houve o ex-vice-presidente Marco Maciel. Diagnosticado com demência em 2001, ainda seguiu por alguns anos no cargo de Senador até os lapsos de memória se tornarem mais evidentes. O ex-governador de São Paulo, Paulo Maluf, também foi diagnosticado com Alzheimer, mas isso não o livrou de, recentemente, ser condenado a pagar mais de 2 milhões aos cofres públicos por mau uso dos recursos públicos.
Em 2020, um vídeo da bailarina principal do Balé de Nova Iorque nos anos 60, Martha Gonzalez, diagnosticada com demência, emocionou o mundo ao lembrar dos movimentos de “O Lago dos Cisnes”, mesmo na cadeira de rodas.
Um ano depois, o cantor estadounidense Tony Bennett, 95 anos, que tem Alzheimer, conseguiu gravar um novo álbum com a cantora Lady Gaga. Ele lembrou das letras das músicas (uma das últimas memórias a serem perdidas) e também do nome da cantora.
Outra referência das artes nos Estados Unidos, o caricaturista Willian Hanna também teve demência. Ele foi o criador de personagens famosos de desenho animado como Tom & Jerry, Scooby Doo e os Flintstones, desenhos que fizeram parte da infância de várias gerações.
Não se trata de uma doença ” democrática ” apenas por ser diagnosticada e existir em diferentes classes sociais.
Famílias de maior nível cultural e financeiro podem garantir melhor qualidade de vida aos pacientes. Seja por estímulos cognitivos, diferentes tipos de tratamento e suporte aos enfermos. Diferente dos 71% da população que utilizam o SUS. Ou da classe média que enfrenta o endividamento e empobrecimento pelo alto custo da doença.
No que diz respeito às pessoas que dependem do SUS e de um governo federal que segue congelando o orçamento do maior sistema público de saúde do mundo, elas precisam enfrentar as filas no atendimento. E mais: a falta de geriatras e profissionais especializados que saibam lidar com pacientes com demência, de equipamentos para exames, muitas vezes quebrados e atendimentos suspensos pelo deslocamento de funcionários para fazer frente a pandemia de Covd-19, como ocorre até agora.
No entanto, independente da classe social, as famílias atingidas pelo diagnóstico de um parente com demência sofrem com a enfermidade e com as perdas cotidianas de identidade da pessoa querida. Democráticas também são a falta de informação generalizada sobre as demências, o preconceito e o estigma social. Muitas famílias se negam a reconhecer os sintomas dos diferentes tipos de demências, entre elas a mais conhecida, o Alzheimer.
Apesar das diferenças de acesso a recursos, a tecnologias, a medicações e dos distintos orçamentos familiares, é possível tentar viver com mais qualidade de vida e estimular o encontro com pessoas queridas, virtual ou presencialmente.
Vale caminhar ao ar livre, fazer exercícios nos pontos de encontros comunitários (PECs) disponíveis em muitas praças nas cidades, se associar gratuitamente a bibliotecas públicas e (tentar) ler ao menos um livro por mês ou assistir filmes divertidos.
Também é possível participar de projetos que incentivem a vida comunitária, com aprendizagem ou encontros musicais, cuidado de hortas, desenho, pintura e artesanato. Talvez aprender receitas da infância aproveitando o que o orçamento permitir comprar. Pode ser divertido pesquisar a história da família pela internet, visitar cidades virtualmente, descobrir coisas interessantes para compartilhar com a pessoa doente e ainda se divertir.
Autocuidado e cuidado coletivo são exercícios diários. E hoje pode ser um bom dia para começar.
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