Por Uma Cultura do Cuidado

Publicado em políticas públicas de cuidado

Ana Castro & Cosette Castro

Brasília – Em um país que se nega a ficar velho, apesar de ser o quinto país que envelhece mais rápido do mundo, como pensar em políticas nacionais de cuidado?  E mais ainda, como transformar essas políticas em uma cultura do cuidado?

Este é um grande desafio. O Brasil segue fazendo de conta que é um país jovem. E jovens em geral são donos de si, independentes. Praticamente não precisam ser cuidados. E se seguimos  “jovens”, apesar de nossos corpos envelhecerem, por que se preocupar com cuidado, com cuidar  do outro ou com políticas de cuidado?

Cada pessoa que nega a  sua idade, ainda que não se dê conta, contribui para  aumentar  o preconceito contra as pessoas com  60 anos ou mais. Esse preconceito, chamado velhofobia, ageismo ou idadismo, se manifesta cotidianamente de várias  formas.

Começa pelo próprio nome. Velho. Velha. Cheira a mofo, coisa ou pessoa ultrapassada, fora de época.  Antiquada. Chamar alguém de velho ou de velha no Brasil não é um elogio. É ofensivo. É um palavrão.

Algo similar ao nome do nosso Coletivo: Filhas da Mãe. Até há pouco tempo considerado um palavrão.  Uma ofensa. Só que não. É um orgulho ser uma filha da mãe. E ter mãe. É um orgulho (tentar) desfazer um preconceito  e (muitas vezes) conseguir.

Em um país de tantas desigualdades também  é motivo de orgulho e comemoração  chegar aos 60 anos. E estar aqui para contar as nossas histórias e de muitas outras pessoas.

São histórias anônimas que  tendem a ser desvalorizadas, não ouvidas, deixadas de lado. Deixadas pra depois. Como se pessoas, por sua idade, pudessem ou merecessem ser descartadas.

Como pensar uma cultura do cuidado que integre todas as idades, celebre todas as vidas? Inclusive aquelas que fogem do padrão  e se manifestam em forma de demências?

Talvez um primeiro passo seja parar de celebrar uma juventude que já passou como se fosse um ideal de felicidade e perfeição. Frases como  “Me diverti como se tivesse 30 anos”.  “Dancei horas, como quando tinha 20 anos” são ditas cotidianamente reforçando um ideal de vida eternamente jovem.

Este é um grande desafio. E o Coletivo Filhas da Mãe, nestes dois anos e meio de atuação, tem trabalhado estrategicamente para vencer esses e outros desafios. Para vencer os nossos próprios preconceitos e medos. Inclusive sobre envelhecimento e sobre as demências.

Em 2021 aprovamos a Lei 6926/2021/ DF que institui a política distrital para prevenção, tratamento e apoio às pessoas com doença de Alzheimer e outras demências, aos seus familiares e aos cuidadores e dá outras providências. Uma Lei  construída em conjunto com o Fórum Distrital em Defesa da Pessoa Idosa e com apoio do gabinete da Deputada Distrital Arlete Sampaio. O próximo passo é garantir a implementação da Lei.

Agora estamos acompanhando o Projeto de Lei  4364/2020, de autoria do Senador Paulo Paim, que se encontra em tramitação na Câmara dos Deputados.

Queremos mais do que uma Política Nacional de Cuidado Integral para as Pessoas com Doença de Alzheimer e outras Demências. Queremos, por exemplo,  que as pessoas que cuidam  seja incluídas  em todas as etapas do projeto de lei, inclusive no título.

Isso significa contemplar não apenas a doença, mas valorizar a saúde, pensando em prevenção para toda vida e promovendo uma cultura do cuidado intergeracional, inclusiva, levando em conta os diferentes arranjos familiares.

Uma cultura do cuidado que inclua campanhas  nacionais sobre o  orgulho e a alegria de estarmos  vivos e vivas, de envelhecer com novos sonhos e seguir buscando um país para todas as pessoas, com cidadania.  E que abra espaço para campanhas nacionais informativas permanentes sobre demências já instaladas e processos de prevenção, que nem sempre necessitam de medicamentos.

Temos  outras 10 contribuições ao Projeto de Lei 4364,  como publicamos na edição de 19 de novembro de 2021 e que esperamos levar ao relator da Comissão de Seguridade e Saúde da Câmara Federal, Deputado Alexandre Padilha até o fim do mês.

Em Tempo: Esta semana  Cosette Castro participou como palestrante no “II Fórum Nacional para a Saúde no Brasil: Perspectivas e Desafios” com o tema Políticas Públicas sobre Demências. Para assistir as palestras, clique aqui.

 

 

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