Ana Castro & Cosette Castro
Brasília – Em um país que nega a velhice e a morte, a pandemia nos faz encarar esses fantasmas. Nos três primeiros meses de 2021, já houve mais mortes do que ao longo de 2020. Em Porto Alegre e no Rio de Janeiro, no mês de março, foram registradas mais mortes que nascimentos.
O que acontece depois da morte de uma pessoa querida, seja da família ou amiga? Nunca estamos preparadas, seja qual for a causa. Além da dor avassaladora que se manifesta de maneira diferente para cada pessoa, há muita burocracia a enfrentar. Com urgência e insensibilidade.
A Covid-19 levou a novos protocolos, como ensacar a pessoa na nossa frente. Sem delicadeza de nos afastar. E ficamos ali, em estado de choque, vendo a pessoa amada ser tratada como objeto e numerada.
Sem tempo de entender o que está acontecendo, é preciso providenciar declaração de óbito para retirar o corpo quando ocorre no hospital. Há demora se ocorrer durante uma troca de plantões, domingo ou feriado. Ou quando ocorrem mortes simultâneas por Covid-19, pois os médicos preenchem os formulários a mão. Falecimento em casa implica em outras providencias, como registrar o Boletim de Ocorrência (BO) e aguardar a remoção do corpo.
Poucos têm a precaução de orçar e escolher um serviço funerário com antecedência. É preciso respeitar desejos e a religião da pessoa falecida quanto à cremação, escolha de cemitério, cidade ou tipo de cerimônia. E há outros detalhes, como escolha de vestimentas e tipo de cerimônia. A pandemia eliminou a maioria dos rituais necessários para aliviar o sofrimento e inaugurou a era do velório online.
Ligar o piloto automático e ir resolvendo as questões burocráticas enquanto se avisa a família e amigos é uma das saídas nesse momento de choque inicial do luto. Tudo fica mais leve com o apoio de amigos ou parentes para dividir as providências. Como em um momento especialmente doloroso, mas obrigatório: fazer o reconhecimento do corpo. É importante ter alguém para segurar a mão, mesmo em tempos de pandemia.
Pode parecer mórbido falar sobre tais assuntos. Mas, dependendo da doença, a pessoa querida pode estar bem diferente, com tubos, caso não receba cuidados paliativos. Mais tarde, a funerária vai garantir a dignidade do corpo.
Quem optar pela cremação, em tempos de Covid-19 terá de guardar as cinzas e esperar a vacinação, para o caso de uma cerimônia familiar que exija viagens. É difícil, mas vale levar em consideração que a pessoa querida já não está mais ali.
Na maioria dos casos, são os agentes funerários que acabam orientando sobre cada passo. Quem tem orçamento justo, nesse momento descobre que o jazigo custa caro e que não está tendo vaga em cemitério público perto da onde as pessoas moram. Em geral, cada cidade tem um tipo de apoio para quem não pode pagar o enterro.
O tempo corre. Há pressa para tirar a certidão de óbito no cartório. Alguns hospitais de Brasília têm o serviço e há um plantão no IML. Caso o hospital não ofereça o serviço, será preciso agendar hora no cartório.
Depois será necessário comunicar a morte ao plano de saúde, ao local onde a pessoa trabalhava ou recebia pensão. Conferir os direitos a ressarcimentos, como auxílio funeral. Ligar para os bancos e checar seguros e débitos. Os cartórios informam automaticamente aos bancos e a Receita Federal. Mas serão inúmeros telefonemas, troca de mensagens, busca de documentos. Em um momento em que a pessoa está completamente fragilizada.
Se o plano de saúde não cobriu todos os gastos, é preciso negociar dívidas. Vale recorrer a alguém menos envolvido emocionalmente para lidar com essa questão.
Em caso de bens, ação na justiça, dependentes, haverá mais gastos com o inventário. Demanda um inventariante, que pode ser familiar ou alguém escolhido por consenso. E, em geral, será necessário contratar advogado, pagar taxas de cartório e impostos. A parte judicial pode demorar meses ou anos para ser resolvida, sem contar possíveis divergências na família.
Mesmo após o falecimento, é preciso fazer declaração de renda do ano anterior. E é doloroso lidar com documentos e a memória afetiva. Em 2021, o prazo foi adiado até 31 de maio.
A dor do luto inclui também o desafio de se desfazer dos objetos de quem se foi. Roupas, sapatos, materiais de higiene, medicações e equipamentos.
Separar tudo para doação pode ajudar a lidar com a dor. Sempre há pessoas ou instituições que precisam de ajuda. No caso de ser necessário desocupar imóveis, as redes sociais e sites de vendas, garagem sale e brechós podem ajudar nas vendas.
Reconhecer limites é necessário, embora seja difícil para a maioria das cuidadoras. É o momento de acionar familiares e a rede de amizades. Não fique sozinha. O tempo do luto é muito pessoal e pode se estender.
Apesar de cada dor ser única, ela pode ser amenizada pelo afeto e solidariedade das pessoas. Este é o momento de pedir ajuda. Abrir espaço para receber manifestações de carinho e apoio. Ser acolhida. E, principalmente, confiar que não está sozinha.
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