Nas entrelinhas: O velho Churchill inspira Alexandre de Moraes

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Todos os envolvidos nos atos de vandalismo de 8 de janeiro serão investigados e, se responsabilizados, devidamente punidos, por vandalismo, instigação ou conivência com o golpismo

Cinco Dias Em Londres (Jorge Zahar Editor), de John Lukacs, narra os bastidores do governo britânico entre 24 e 28 de maio de 1940, dias que decidiram o destino da Inglaterra e a sorte dos Aliados na Segunda Guerra Mundial. No decorrer da crise política que se instalou no gabinete do ministro Neville Chamberlain, sob a liderança de Winston Churchill, o Gabinete da Guerra decidiu que a Inglaterra não assinaria nenhum acordo de paz com Hitler, derrotando a tese de Lord Halifax, o ministro de Relações Exteriores, que negociava um acordo de paz da Inglaterra com a Alemanha.

Desde a invasão da Boêmia e da Morávia, 15 de março de 1939, pelas tropas alemãs, o então chanceler britânico buscava um acordo. A antiga Tchecoslováquia, recém-unificada, não fora capaz de resistir ao avanço alemão, sendo ocupada durante seis anos. “Lord Halifax expressou o desejo do povo britannico de um entendimento sincero e leal com a Allemanha”, publicou o antigo O Jornal, então o porta-voz dos Diários Associados, em 9 de junho de 1939, no Rio de Janeiro. Menos de um ano depois, Neville Chamberlain perderia o cargo de primeiro-ministro.

John Lukacs conta em detalhes o colapso do gabinete liderado por Chamberlain. Íntegro e respeitado, Churchill era considerado velho para a tarefa que lhe era pedida, enfrenta a desconfiança do governo, do presidente norte-americano Franklin D. Roosevelt e do próprio povo inglês. Além disso, bebia muito. E havia o temor da queda da França, única aliada da Inglaterra na Europa, que acabaria mesmo invadida por Hitler.

Foram cinco dias dramáticos. O próprio Adolf Hitler não acreditava em sua sorte ao combater os ingleses e ordenou uma trégua de dois dias em sua marcha para o litoral. Nesse ínterim, Halifax tentou se aproximar de Mussolini através do embaixador italiano Bastianini; Pétains e Weygang, heróis franceses da Primeira Guerra Mundial, desistiram de lutar contra o Exército alemão. A rendição da Bélgica alarmou ainda mais a Inglaterra.

Mesmo assim, no dia histórico de 28 de maio de 1940, uma terça-feira, Churchill decidiu não assinar acordo algum com Hitler e lutar até o fim para defender a Inglaterra e os Aliados. Foi uma decisão muito difícil, porque os ingleses estavam encurralados em Dunquerque. Lukacs explica a importância do fato de Churchill ter mantido suas tropas no litoral, uma decisão muito impopular, mas que resultou no atraso das tropas alemãs, o que seria fundamental para a vitória dos Aliados em 1945, apesar da retirada dramática que se seguiu.

Apaziguamento

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes se inspirou nesse episódio para definir sua postura em relação aos envolvidos na tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro. O fato de quase 1400 envolvidos nas invasões do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo já terem sido denunciados e o avanço das investigações para identificar seus mandantes, nas quais o ex-ministro da Justiça Anderson Torres está muito enrolado, confirmam o que Moraes prometera na abertura dos trabalhos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em fevereiro passado.

“A democracia não suportará mais a ignóbil política de apaziguamento, de ‘deixa pra lá’, de ‘vamos aceitar que eles podem melhorar’. Essa política fracassada de apaziguamento já foi amplamente afastada na histórica tentativa de acordo de Chamberlain com Hitler”, disse Moraes. Era uma referência a postura de Chamberlain em relação à Hitler em 1938, que permitiu a anexação da região dos Sudetos, pela Alemanha e, depois, o avanço nazista sobre a Polônia. Com isso, a Segunda Guerra Mundial se tornaria inevitável.

Segundo Moraes, todos os envolvidos nos atos de vandalismo de 8 de janeiro serão investigados e, se responsabilizados, devidamente punidos, não só por vandalismo, mas também pela instigação ou conivência com o golpismo, como já está acontecendo com mais de mil pessoas presas no acampamento defronte ao quartel-general do Exército. Pelo risco que o Brasil correu, Alexandre avisou que não haverá negociação com criminosos, terroristas e golpistas e resgatou a fase famosa de Churchill: “O apaziguador alimenta o crocodilo esperando ser o último a ser devorado”.

Sua posição continua duríssima: “Todos os envolvidos serão responsabilizados civil, política e criminalmente. Inclusive pela dolosa instigação ou conivência, por ação ou omissão motivada por ideologia, dinheiro, fraqueza, covardia, ignorância, má-fé ou mau-caratismo”. Para Moraes, “a defesa da democracia e das instituições é inegociável. Muito mais do que um compromisso, essa defesa é razão de existência da Justiça Eleitoral”, alertou.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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