Ainda os puxadinhos

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VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)

Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade

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Foto: Divulgação/ Seduh-DF

 

Brasileiros, e em nosso caso particular, os brasilienses, quando vão ao exterior, a primeira coisa que notam e admiram é a organização e limpeza das cidades. Na grande maioria dos países do primeiro mundo, suas metrópoles, mesmo com toda sua longa história, complexidade e intenso trafegar diário de pessoas e automóveis, dão-nos a impressão de que tudo parece estar em seu devido lugar, funcionando como um relógio suíço. A questão é: por que nossas capitais, com raras exceções, fogem tanto desse padrão urbano de organização, limpeza e vigilância? Na verdade, nossas cidades são um espelho do que é o terceiro mundo em geral, com suas contradições políticas e históricas, sua miséria e todo esse senso de abandono, que vai envelhecendo precocemente tudo à nossa volta.

Brasília, que até há pouco tempo era uma exceção à regra, também caminha a passos acelerados para envelhecer antes do tempo. A situação, aqui, é mais complexa. Mesmo ostentando o galardão de Patrimônio Cultural da Humanidade, concedido pela Unesco, é visível que a capital de todos os brasileiros e orgulho do modernismo na arquitetura, segue também rumo à condição inexorável de decadência. Não será surpresa se, num futuro próximo, esse título internacional venha a ser cancelado, dada a sucessão de alterações e erros impostos ao projeto urbano inicial, e também à permissividade, como algumas alterações são feitas, estão acelerando o processo de decrepitude de Brasília.

Para ficar apenas num exemplo básico desse abandono visível da capital do país e que vem ocorrendo em toda a área do Plano Piloto, observem como, de uns anos para cá, tem aumentado de forma exponencial o número de barracos de lata não só nas paradas de ônibus, como por dentro de todas das quadras e superquadras, tanto na Asa Sul quanto na Asa Norte. Nesses novos e improvisados estabelecimentos, é comercializado de tudo, desde alimentos até bugigangas eletrônicas. Alguns desses barracos de metal foram transformados, inclusive, em bares e restaurantes. Nos pontos de ônibus, principalmente ao longo das abandonadas avenidas W3 Norte e Sul, há quase uma centena desses barracos que vão se proliferando à vista de todos.

Os comerciantes desses puxadinhos urbanos não escondem que estão espalhados, em número cada vez maior, por todo o Plano Piloto, graças ao lobby e pressão dos deputados distritais junto ao GDF e à política de boa vizinhança entre o governo local e os políticos da cidade. Desse modo cria-se uma situação que, claramente, favorece apenas a classe política local, uma vez que essa é outra modalidade de troca de favores e concessões esdrúxulas, dentro do pernicioso modelo: de um voto e uma autorização. Trata-se aqui do antigo modelo: um lote, um voto, que vai se repetindo sob o olhar displicente dos brasilienses. Quem perde com toda essa descaracterização da cidade é o brasiliense, que assiste à perda paulatina da qualidade de vida da capital.

Infelizmente nossa classe política não possui a capacidade de entender a extensão desse problema no longo prazo para Brasília e seus habitantes. Insensíveis a essa destruição da cidade, aqueles que dizem representar a população continuam utilizando de expedientes populistas, mesmo que sejam nocivos aos brasilienses, apenas para atender seus horizontes curtos que chegam a cada nova eleição.

Infelizmente parece não existir um órgão independente de fiscalização capaz de pôr fim a esse retalhamento da capital em capitanias políticas. O que o brasiliense não pode tolerar é que as regras do bom urbanismo e de toda a urbanidade sejam oferecidas como uma espécie de moeda política, loteando o Plano Piloto com invasões que atentam contra o bom senso e as regras mínimas impostas pelo ordenamento da cidade.

Também não se pode sacrificar o projeto urbanístico de toda uma cidade, no altar do populismo, sob a desculpa de que isso serve como solução para o nosso complexo problema social. Há, sim, que resolver, da melhor maneira possível, o problema social, sem colocar em risco o futuro da cidade e de seus cidadãos. Já estão apontados o problema, seguem também as soluções. Que tal alocar todo esse comércio improvisado em trailer padronizados sob rodas, para que sejam retirados dos logradouros públicos ao fim do expediente? A cidade agradece.

 

 

A frase que foi pronunciada:
“Meu sonho é viver e morrer em um país com liberdade.”
Juscelino Kubitschek

Lúcio Costa e presidente JK. Foto: arquivo.arq

 

Caverna
Uma pena ainda estar desativada a entrada subterrânea do Banco do Brasil no Setor Bancário Sul. Como o banco sempre se mostrou preocupado com a segurança dos clientes, poderia reativar o serviço.

Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

 

História de Brasília
Com 20 mil processos aguardando tramitação, o Serviço de Comunicações do Ministério da Fazenda está com apenas 12 funcionários, quando dispõe de 300 no Rio. (Publicada em 26/4/1962)

As janelas quebradas da capital

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Foto: Carlos Vieira/CB/DA Press

 

Desde os anos sessenta, que o filósofo de Mondubim dizia que a desordem conduz, obrigatoriamente, à desordem. Esse é um tema conhecido de todos aqueles que observam as interações sociais, sobretudo numa cidade populosa, onde a aglomeração de pessoas tem reflexos diretos na qualidade de vida de todos, indistintamente. Não duvide: as atitudes de seu vizinho, ou o que é feito em bairros limítrofes ao seu, tudo possui o poder de repercutir em ações visíveis ou invisíveis na sua própria rua. E tudo será capaz de alterar, significativamente, a qualidade de vida em sua comunidade. O todo está intrinsecamente conectado, numa rede viva e dependente.

O experimento conhecido como “Teoria das Janelas Quebradas”, desenvolvido pelos pesquisadores da Escola de Chicago, nos Estados Unidos, James Q. Wilson e George Kelling, demonstrou, naquela época, que um carro abandonado, num bairro de classe rica ou pobre, tem maiores possibilidades de ser vandalizado ou mesmo furtado, caso uma de suas janelas esteja quebrada. O mesmo ocorre em edifícios, onde as janelas ou partes dele estejam danificadas por um tempo e não passem por pronta manutenção. Logo, logo esse prédio começa a ser depredado, invadido, passando, em pouco tempo, a se constituir em local de moradia de desocupados, sem tetos ou de usuárias de drogas.

A partir desse ponto, toda uma série de crimes passam a ocorrer, afetando não só a população que por ali circula, mas outros pontos da cidade. Exemplo desse fenômeno pôde ser confirmado no antigo Torre Palace Hotel, próximo à Torre de TV, que, a partir de 2014, gerou uma série de acontecimentos negativos e perigosos, não só para o Setor Hoteleiro Norte, onde se localizava, mas para toda a área adjacente. A situação chegou a um crescendo tal que foi necessária uma verdadeira estratégia de guerra para esvaziar o local, com a utilização de helicópteros e de um conjunto de forças de segurança jamais vistas para desocupar o imóvel. Isso depois de muita reclamação, muitos crimes e muitos prejuízos, para o turismo, já que o local onde está a edificação é no Setor Hoteleiro. A imagem de capital moderna acabava por ali.

O mesmo ocorre hoje na conhecida Cracolândia, fincada bem no centro de São Paulo, gerando problemas que nenhum governo foi capaz de sanar nesses últimos anos. O setor Comercial Sul, também possui a sua Cracolândia, sendo formada bem debaixo dos olhos das autoridades e já representa um enorme prejuízo para toda essa antiga e ainda valorizada área da cidade. Também as W3 Norte e Sul, depois da consolidação do modelo dos shoppings fechados, foi perdendo sua importância ao logo dos anos, com muitas lojas sendo fechadas e abandonadas.

A deterioração paulatina dos edifícios nessa localidade também confirma a Teoria das Janelas Quebradas, demonstrando que a falta de zelo e, principalmente, de fiscalização pelos órgãos encarregados desse serviço serviram para aumentar, além da decadência física do local, um atrativo a mais para moradores de rua, viciados e criminosos de todo o tipo que trafegam nessas áreas de dia e de noite.

Nesse particular, a W3 Norte tem sofrido, sobremaneira, nessas últimas décadas, tanto os efeitos da pouquíssima fiscalização pelos órgãos de segurança e vigilância, como dos serviços de postura e de engenharia, que simplesmente deixaram de olhar para essa importante parte da cidade. Outra ilustração clara e oposta à teoria da Janela Quebradas são as estações de metrô da capital. Todas impecavelmente limpas e organizadas e são mantidas assim pela população que, instintivamente, é levada ao desejo de preservação.

Com o desleixo das autoridades em relação aos imóveis da W3 e entrequadras e seguindo a Teoria das Janelas Quebradas, os proprietários desses imóveis passaram a agir e a construir seus puxadinhos à margem do que mandam os códigos de postura e de padrões urbanos, quer expandindo para as áreas públicas seus estabelecimentos comerciais, quer erguendo horripilantes terraços sobre as antigas edificações, não obedecendo questões de gabarito ou mesmo de sobrecargas.

Como resultado desse descaso, há poucos dias um prédio praticamente inteiro na quadra 713 Norte veio abaixo. Por sorte não deixou mortos. Agiriam corretamente as autoridades, se depois desse sinistro e de outros que vêm ocorrendo com certa frequência, mandassem demolir esses andares extras e todas essas obras ilegais, para o bem da população e para o futuro da cidade.

Apenas seguindo o que orienta o código de postura urbana já seria possível frear a decadência dessas vias de comércio. O que ninguém pode permitir, em nenhuma hipótese, é que sejam os próprios donos dessas edificações, junto à omissão da fiscalização, os responsáveis diretos por esses crimes contra a cidade e o futuro dos brasilienses.

História de Brasília

O governador Leonel Brizola chegou ontem pelo Viscount. No mesmo aparelho, viajou, também, o sr. Ranieri Mazzilli, que era o presidente da República à época da Campanha da Legalidade.(Publicada em 06/02/1962)