Pós-verdade e humanismo

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hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade

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Charge do Shovel

 

         Num futuro, não muito distante, quando a poeira do pandemônio das eleições se assentar, alguns filósofos, historiadores e mesmo sociólogos terão, em mãos, farto material para o desenvolvimento de trabalhos teóricos abordando a chamada “pós-verdade”, não apenas referente ao pleito de 2022, mas em torno de todo o modelo de governança política do Brasil contemporâneo.

         De fato, a pós-verdade, mais do que um simples neologismo, retrata o fenômeno atual no qual a opinião pública passa a ter seus critérios subjetivos de avaliação da realidade, modificados por ação de diversos meios e mídias, que passam a insistir na tese de que os fatos objetivos, aqueles que estão estampados na cara de todo mundo, possuem valores e influências bem inferiores aos apelos às emoções e às crenças pessoais.

         É como se alguém insistisse: esqueça os fatos e centre-se nos apelos emocionais e nas crenças, pois aquilo que aparenta ser a verdade é bem mais importante e valioso do que a própria verdade. Como exemplo, temos que a propaganda política e mesmo os debates que, envergonhadamente, assistimos são construídos a partir desse fenômeno denominado política pós-factual.

         Nesse ramo, em que a verdade e os fatos passam a ter uma importância secundária e quase insignificante, estão, ao lado dos políticos, a mídia jornalística, os institutos de pesquisa de opinião, os marqueteiros e outros atores, todos eles empenhados em um processo de dar um novo ou falso verniz aos fatos, colorindo ou tornando-os cinzentos e opacos.

         As consequências desse processo perverso e contínuo são imensas para a sociedade não apenas no Brasil, onde esse fenômeno parece ter atingido os píncaros do exagero, mas em todo o mundo moderno.

         A exemplificar esse fenômeno, temos a estória infantil A roupa nova do rei, do dinamarquês Hans Christian Andersen, publicado em 1837. Fosse transladada para nosso tempo e momento, teríamos uma cena em que um dos candidatos à Presidência, diante das câmeras, completamente nu ou sem as vestimentas da ética, quisesse convencer aos contribuintes e eleitores que é o mais impoluto de todos. Teoria amalucada que seria então reforçada pelos mais empenhados apresentadores e comentaristas.

         Com o título de “Pós-verdade e as Eleições no Brasil”, qualquer pesquisador sério poderá preencher tomos e mais tomos retratando essa meia realidade que parece ter tomado conta do Brasil da relatividade. Em nosso país atual, a verdade foi assassinada bárbara e misteriosamente. As investigações policiais, conduzidas pelos métodos que já conhecemos, chegam à conclusão de que foi um suicídio comum. Para o público, os fomentadores da pós-verdade passam a difundir a ideia de que o importante não foi o crime em si, mas o sentimento de insegurança que despertou em todos e o medo trazido pelo problema da violência em nosso país.

         Em nosso caso particular, as discussões e debates políticos, de baixo nível, com acusações e xingamentos mútuos, seguidos dos comentários dos analistas políticos, formam um conjunto coeso que aponta para os conceitos da pós-verdade, em que os fatos, ou a situação e os meios para enfrentar os problemas nacionais ficam em segundo plano e parecem não possuir importância.

          Pós-verdade pode ser ainda a possibilidade do registro, pelo TSE, da candidatura à presidência da República de personagem impossibilitado legalmente, ou à revelia da lei, de apresentar a documentação completa e básica, como as certidões negativas que provam sua condição de elegibilidade e sua ficha limpa perante a Justiça.

         Dentro de um conceito dessa natureza, tudo torna-se possível, inclusive a tentativa de apagar o passado, acusando os fatos pretéritos de fake news, num movimento atroz de esmagamento do factualismo. Ao construir biografias com versões repaginadas e maquiadas, o que os fomentadores da pós-verdade almejam é a modelação de um mundo de ficção, onde o indivíduo passa de objeto concreto a virtual, e a equiparação do cérebro do homem a uma inteligência artificial, moldável e programável, despida de humanidade e todo e qualquer humanismo.

A frase que foi pronunciada:

“A diferença mais marcante entre os sofistas antigos e modernos é que os antigos se contentavam com uma vitória passageira do argumento em detrimento da verdade, enquanto os modernos querem uma vitória mais duradoura em detrimento da realidade. Em outras palavras, um destruiu a dignidade do pensamento humano enquanto os outros destroem a dignidade da ação humana. Os antigos manipuladores da lógica eram a preocupação do filósofo, enquanto os modernos manipuladores dos fatos se interpunham no caminho do historiador. Pois a própria história é destruída, e sua compreensibilidade – baseada no fato de que é encenada pelos homens e, portanto, pode ser compreendida pelos homens – está em perigo, sempre que os fatos não são mais considerados parte integrante do mundo passado e presente, e são usados indevidamente para provar esta ou aquela opinião”.

Hannah Arendt, filósofa em As Origens do Totalitarismo

Hannah Arendt. Foto: brasil.elpais.com

 

Agora é a hora!

Dos quase R$ 45 milhões de créditos suplementares aprovados pelos deputados distritais ao Orçamento do GDF, R$ 30 milhões serão repassados à Novacap para atender despesas com manutenção de áreas verdes, execução de obras de urbanização, reforma e manutenção de feiras permanentes. Quem tiver cobranças a fazer, agora é a hora!

Foto: novacap.df.gov

 

História de Brasília

Depois de um desentendimento com o dr. José Lafalete, o DNER construirá, agora, a estrada e o campo de pouso da fazenda do presidente João Goulart em Uruaçu. (Publicada em 11.03.1962)