Cancelamento nosso de cada dia

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VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)

Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade

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Ilustração: portaldacomunicacao.com

 

Infelizmente, o século XXI, com todos os avanços na ciência que estamos presenciando, não foi capaz ainda de se livrar dos vícios do mundo antigo. Não do mundo, propriamente dito, mas do comportamento dos homens nas suas relações entre si. Movidos pela força da seleção natural das espécies, herdada de nossos antepassados, prosseguimos ainda em disputas que só nos tem trazido decepções, guerras e mortes.

Movidos por impulsos ainda muito ligados à seleção natural, à hierarquia, ao domínio, seguimos como homens das cavernas. Apesar de termos evoluído das armas convencionais para as digitais, seguimos numa disputa incessante que, ao invés de nos levar à utopia, nos arrasta ao palco de decepções, guerras e mortes. A era da informação de massas, das redes globais, dos algoritmos, nos dotou de poderosas plataformas de visibilidade e de invisibilidade. E é justamente nesse limiar que surge o fenômeno do cancelamento do indivíduo: a exclusão, a “ban” simbólica, a condenação pública que retira a voz, o trabalho, o espaço social, não necessariamente porque se cometeu um ato claro de violência, mas, muitas vezes, porque se ousou questionar o consenso, pôr em dúvida a narrativa dominante, desafiar o que está “aceito”. Com a tecnologia da informação de massas, passamos agora a ter em mãos a mais nova arma de aniquilação do outro, o cancelamento do indivíduo nas redes e no mundo virtual. A arma que mata a voz.

O que hoje se chama de “onda woke” ou “justiça social” emergiu com vocação crítica dirigida aos abusos, às minorias historicamente oprimidas, ao poder que silencia. Contudo, esse impulso tem um lado sombrio: a definição de quem “merece” permanecer ativo e quem deve ser retirado do palco. Basta que alguém postule um pensamento divergente, ainda que legítimo, para que surja o linchamento virtual, a pressão de públicos ou empresas, o “cancelamento”.

Como define de forma generalista o conceito: a retirada de apoio, o boicote, a expulsão social de alguém por algo considerado ofensivo ou incompatível com o discurso dominante. Esse movimento, que muitas vezes nasce com propósitos emancipatórios, corre o risco de se tornar opressor: quando a lógica do punir substitui o diálogo; quando o erro humano deixa de ser oportunidade de aprendizado e passa a ser sentença irrevogável; quando a pluralidade é trocada por conformidade. Em outras palavras: quando o “cancel” (o apagamento) se torna a nova forma de poder silencioso, implacável, mas ainda tão brutal quanto qualquer “carta de execução” do passado.

Vejamos alguns exemplos concretos. A autora J.K. Rowling, mundialmente conhecida, enfrentou boicotes e forte reprovação pública após declarações que muitos interpretaram como transfóbicas. O caso mostra como até figuras de enorme projeção se tornam vulneráveis quando se afastam do discurso aceito. Outro exemplo: o ator Liam Neeson, em 2019, ao contar uma história de intolerância que teve, sofreu forte reação negativa, cancelamento promocional imediato e prejuízos à divulgação de seu filme. E mais: a ativista digital Suey Park, ao lançar a hashtag #CancelColbert, em 2014, tornou-se símbolo de como o “cancel” também se volta contra quem julga expondo-se a represálias, ameaças, perseguição online. Esses casos expõem nuances importantes: nem todo cancelamento é igual, nem todo discurso “cancelado” é injusto, mas o padrão revela algo maior. O padrão de silenciar vozes incômodas, ou simplesmente diversas, elimina o risco, a diferença, a contradição. É uma forma moderna de “apagamento social”.

Em sociedades distópicas (e estamos perto disso), apreender quem pode falar e quem deve calar é um dos modos de controle mais eficazes invisível, digital, rápido. Um clique, um tweet, um julgamento coletivo: e lá se vai o indivíduo. Mais ainda: se considerarmos que a tecnologia da informação de massas está nas mãos de poucas plataformas, algoritmos, corporações percebemos que o poder de “cancelar” não é igual para todos. Aqueles dentro da bolha dominante disciplinam quem sai dela. Ser “fora do consenso” implica risco de exclusão. O “apagado” deixa de existir no feed, no trending, na visibilidade como se sua perda tivesse menos valor que a de uma árvore derrubada no deserto. Isso não significa que não haja responsabilidades ou que tudo deva ser aceito sem crítica. Muito pelo contrário: o combate ao ódio, à discriminação, à injustiça ainda é urgente, necessário, vital. Mas a questão central é: quem decide o que é ofensivo? Qual o critério para exclusão? Qual o direito de redenção, de retratação, de falha humana?

Porque se o mecanismo se torna automático, implacável, sem margem de erro ou recuperação ele cria uma nova tirania moral. E, para quem questiona, o maior perigo talvez seja que esse fenômeno se naturalize. Que a sociedade chegue a um ponto em que o simples ato de pensar diferente ou de questionar o “mainstream” seja suficiente para desencadear seu “apagamento”. A lógica da disputa permanece: seleção, porém, agora digital, social e não evolução. A guerra, não entre exércitos, mas entre narrativas, reputações, visibilidades. E o vencedor é aquele que permanece no palco, não necessariamente o que propõe o melhor argumento. É preciso, portanto, retomar o valor do debate, da heterodoxia, da contradição, mesmo quando incômoda. No fim, fica o desafio: viver sem a máscara do agrado, discordar sem o pânico da exclusão. E lembrar que a maior arma hoje pode não ser o rifle ou a bomba, mas o silêncio imposto. E que silenciados, por vezes, são aqueles que mais precisavam falar.

 

 

A frase que foi pronunciada:

“Eis uma definição de wokeismo: Há pessoas sentadas ali, esperando deliberadamente pela emoção de se sentirem ofendidas.”

John Cleese

John Clesse. Fotografia: Suzanne Plunkett/Reuters

 

História de Brasília

E’ preciso que se esclareça de uma vez por tôdas, que Brasília não pode ser dividida em capitanias políticas, e que interesses particulares não podem prevalecer em administração publica. (Publicada em 11.05.1962)

Cancelados

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Charge do Duke

 

Não são poucas as pessoas que reconhecem, hoje, que o chamado quarto poder passou da imprensa para as mídias sociais, propagadas pelas diversas plataformas que desfilam no mundo digital. Daí porque não são poucas também aquelas elites no poder que anseiam por uma severa regulação nessas mídias digitais. Nos países onde a democracia é uma miragem e mesmo naqueles Estados em que a liberdade de expressão é uma farsa bem montada, as mídias sociais são vigiadas de perto e, não raro, alguns desses programas exibidos por críticos ao governo são postos fora do ar e desmonetizados entre outras ameaças veladas.

Com isso, quer queiram ou não, aqueles que se abrigam à sombra do sistema e do Estado “mídias sociais deram voz aos imbecis”, no dizer zombeteiro de um alto membro do Judiciário. Nesse caso, os imbecis citados formam uma espécie de sans culottes modernos. São os manés que deram certo ou os matutos que não se deixam levar pelas canções de ninar dos demagogos.

Talvez seja essa a causa por trás a explicar porque tantos artistas brasileiros de grande projeção e sucesso no passado recente, hoje, amargam o descaso e mesmo o desprezo por parte do grande público. Trata-se de um fenômeno novo no cenário nacional e de grande abrangência e adesão popular. Produções e shows caríssimos, protagonizados por esses personagens, são abertamente boicotados pelo público, que virou as costas para esses ídolos de pés de barro.

Aqueles que pensaram que os antagonismos políticos e ideológicos fossem ficar apenas no mundo desalmado da política erraram feio. A polarização política, como todo veneno de frasco pequeno, contaminou, com seu conteúdo deletério, famílias, amigos, grupos sociais, chegando até a classe artística.

Tem-se aqui também um fenômeno novo a mostrar um país cingido, desde que alguém, que todos conhecemos, lançou, sobre todos, a maldição do “nós contra eles”. De lá para cá, muita coisa mudou na vida e no cotidiano do país, inclusive a reversão dessa praga política, que, hoje, pode ser dita como “eles contra nós no poder”.

Essa história de que o rei nunca perde a majestade tornou-se falsa no Brasil e aqueles que se consideravam ungidos por uma espécie de coroa eterna, hoje, veem-se despossuídos não só de realeza, como também foram postos na condição de párias.

Aqueles “imbecis”, que ganharam voz por meio das mídias sociais e que nada mais são do que autênticos cidadãos  brasileiros, uniram suas vontades e, simplesmente, passaram a deletar ou cancelar toda uma gama de artistas e atores, cozinheiros, empresas, lojas de departamento, supermercados, produtos que perderam o brilho ou aquilo que de mais precioso tem uma marca, que é a estrela do carisma. Sem essa estrela, que ilumina o mundo do faz de conta, pouca ou nenhuma luz resta no mundo real. O grande público não aceita ser enganado.

 

61992228720

Esse é um dos números de uma organização que usa o telefone para passar golpes. Dizem que seu cartão foi usado, que a ligação está sendo gravada. Dizem que vão pedir uma confirmação para a contestação de cancelamento da compra feita sem sua autorização. Falam por script, enganando quase que perfeitamente. Pedem informações sobre o limite da conta e do cartão. O mais impressionante é que a ANATEL, agência reguladora, não apresenta uma solução para esses golpes.

Foto: Reprodução

 

Mudou

Brasília sofre com a falta de educação no trânsito. Aquela cidade onde buzinar era um absurdo já começa a dar sinais de mudança. Principalmente os motociclistas, que carecem de uma boa aula antes de terem a autorização para fazer parte do trânsito da capital. São uns irresponsáveis. Ultrapassam pela direita, nas comerciais jamais usam as tesourinhas, fazendo a volta no meio da rua, andam pelas calçadas nas quadras. Alguma atitude precisa ser tomada para cortar o mal pela raiz.

Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

 

Dificuldades

Daniel Donizete é o deputado distrital que se elegeu para proteger os animais. Depois disso, quem puxa o carro com os descartáveis é o ser humano, um animal também, mas racional.

Daniel Donizet. Foto: Minervino Junior/CB/D.A Press

 

Chamados

Em Portugal, acontece o seguinte. Todas as chamadas feitas pela população aos Bombeiros, tão logo são atendidas, são seguidas pela polícia. Dados detalhados são cadastrados para as providências às reincidências e investigações.

Foto: observador.pt

 

História de Brasília

Alguém sem escrúpulos salvo justificação em contrário, construiu uma tôrre metálica sôbre a cruz onde foi celebrada a Primeira Missa de Brasília. O monumento está coberto por armações de aço, num visível desrespeito a um dos lugares sagrados da cidade. (Publicada em 09.03.1962)