DESDE 1960
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com Circe Cunha // circecunha.df@dabr.com.br e MAMFIL
No ciclo eterno, que alterna períodos de bonanças e crises, existe um longo espaço intermediário entre ambos que deve ser obrigatoriamente preenchido com reajustes necessários e adequados ao bom funcionamento da gigantesca roda do destino. Na capa da prestigiosa revista inglesa The Economist veio a imagem de um Cristo Redentor transformado em foguete. O fato ilustra bem os dois momentos distintos de nossa breve história. Num primeiro momento, Cristo decola rumo ao espaço com a manchete “Decolou”(Take off). Era a fase da bonança estampada na revista em 2009. Quatro anos depois (2013), a publicação mostraria o mesmo Cristo como um foguete que, depois de perder o rumo, se arremete contra o solo. A manchete dessa vez perguntava: “O Brasil estragou tudo?” (Has Brazil blown it?).
Entre a subida ao céu e a descida vertiginosa aos vales profundos da terra, houve longo intervalo de quatro anos que, curiosamente, coincide com o primeiro mandato da presidente Dilma. Foi justamente nesse espaço intermediário que não foram tomadas as medidas necessárias para evitar o colapso da grande crise que experimentamos hoje.
Com o afastamento do piloto do comando da aeronave Brasil, voltamos ao ponto de origem, ou seja, vamos reconstruindo, parafuso a parafuso, cada peça da aeronave. Pelas contas da nova equipe, necessitaremos de alguns pares de anos apenas para retornar ao ponto de partida. Perdemos tempo e recursos preciosos. Mas, se os ajustes econômicos adequados estão sendo alinhavados de forma correta por uma equipe de alto nível, o mesmo não se pode dizer com relação aos consertos e reparos urgentes que precisam ser operados na esfera política.
É unânime entre os mais diversos analistas que sem a reforma política estaremos condenados a retornar eternamente ao ponto de partida. Como no mito de Sísifo, levamos a pedra imensa morro acima, e vemos inertes rolar novamente ladeira abaixo. O chamado presidencialismo de coalizão deu seguidos sinais de esgotamento.
“O parlamento e os partidos ostentam níveis baixíssimos de confiança por parte dos cidadãos”, diz o cientista político Nuno Coimbra, ao mencionar a Operação Lava-Jato que desnudou a “distribuição de recursos não legais para se manter bases de apoio”. Para ele, “momentos de grandes crises, apesar dos problemas concretos que geram, podem, entretanto, também ser ocasiões em que agendas críticas são avançadas, conseguindo romper com restrições impostas pelos vários interesses contrários envolvidos”.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) também tem chamado a atenção para momentos como este que vivemos. “É preciso estar atento aos custos das campanhas. O gasto exorbitante, além de afrontar os mais pobres, contradiz o compromisso com a sobriedade e a simplicidade que deveriam ser assumidas por candidatos e partidos,” diz o texto da CNBB, que reforça a tese de que “a crise atual evidencia a necessidade de uma autêntica e profunda reforma política, que assegure efetiva participação popular, favoreça a autonomia dos Poderes da República, restaure a credibilidade das instituições, assegure a governabilidade e garanta os direitos sociais”.
Claudio Abramo, diretor da ONG Transparência Brasil, reforça a tese de que “o sistema político-eleitoral brasileiro inclui distorções que afetam gravemente a representação democrática. As camadas populares são subrepresentadas e as oligarquias são super-representadas. Esse é o problema central. Qualquer debate que se trave em torno do assunto precisa centrar-se nesse tema e apenas subsidiariamente em outros”.
Para o filósofo e professor da Unicamp Roberto Romano, “o primeiríssimo ponto é pela ação da opinião pública e da população mais politizada, radicalizando o que já tem sido feito, por exemplo, com a Lei de Improbidade Administrativa, com a Lei da Ficha Limpa. Mas é urgente democratizar por dentro os partidos políticos”. Há, nas cabeças pensantes deste país, uma unanimidade clara quanto à reforma política. O ponto aqui é, por que então não é levada a cabo de uma vez por todas?