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com Circe Cunha com MAMFIL
Reportagem de Antonio Temóteo publicada no caderno Economia deste jornal (23/10), sob o título “Um processo por assédio moral a cada 55 horas”, dá uma dimensão atual de um problema muito antigo e que já fez muitas vítimas não só no Brasil, mas em todo o mundo. É importante ter em mente que o assédio moral não é uma bronca ou um ímpeto de grosseria. Segundo Sônia A. C. Mascaro Nascimento, “o assédio moral se caracteriza por ser uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica, de forma repetitiva e prolongada, e que expõe o trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica, e que tenha por efeito excluir a posição do empregado no emprego ou deteriorar o ambiente de trabalho, durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções”.
Importante ressaltar que tanto o trabalhador quanto o empregador desconhecem o teor dessa conduta. São poucas as instituições no país que, efetivamente, lutam pelo fim do assédio moral. Cartilhas, divulgações, reuniões, participação da comunidade são algumas formas de divulgar o assédio. Mas no momento de, efetivamente, combater a prática, agentes políticos e burocráticos se misturam. A consequência da inércia é a falta de reparação dos prejuízos morais, psicológicos e funcionais. Para o empregador, a ignorância sobre as consequências são um catalizador para cometer a prática do assédio.
Para que a situação seja prevista na legislação federal, o senador Inácio Arruda e outras dezenas de deputados prepararam projetos de lei que tramitam nas Casas. A intenção é tipificar o assédio moral no Código Penal, com restrição da liberdade, além da reparação financeira para quem cometer o ilícito. Por enquanto, o suporte para os julgados são a Constituição Federal, a Consolidação das Leis de Trabalho, o Código Civil e parte do Código Penal. Todo dano deve ter uma reparação. A doutrina e a jurisprudência avançam mesmo sem a legislação própria. Marie-France Hirigoyen defende a importância de uma lei própria para o assunto, não só para prevenir novos casos, mas para que a penalização seja tão séria que impeça novas investidas.
Os primeiros estudos sobre assédio moral trouxeram a expressão terror psicológico. Hans Lennen comparou a agressão à investida de hienas contra um leão. Do cerco dessa cena, nasceu o termo mobbing, que traduziram para assédio moral. Ao contrário do que se pode pensar, a modernidade e o conforto introduzidos pelas novas tecnologias, bem como o aprimoramento e preparo nas relações humanas e profissionais, em vez de desanuviar o ambiente trabalho, eliminando figuras do passado como o chefe ignorante e prepotente, só tem feito aumentar os casos de abusos de autoridade e do chamado assédio moral.
A própria modernidade tem cobrado seu alto preço. As novas políticas de gestão e o aparecimento do trabalhador terceirizado só têm feito crescer, nos últimos anos, as pressões por resultado, estimulando as pessoas a empreender uma competição irracional no ambiente de trabalho. Até a chamada meritocracia, tão perseguida hoje nas empresas, tem mostrado seu lado perverso ao induzir, deliberadamente, o enfrentamento entre os trabalhadores, colocando em lados antagônicos pessoas de um mesmo setor. O assédio moral pode ser cometido tanto pelo chefe quanto pelo funcionário. A estrutura é ascendente ou descendente ou, até mesmo, entre iguais na hierarquia funcional.
Nos nove primeiros meses deste ano, somente na Controladoria Geral da União (CGU) foi instaurados novo processo de assédio moral a cada 55 horas. Apesar desse número, a Lei 8.112/1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos da União, das autarquias e das fundações públicas federais, não define e não penaliza a prática do assédio moral como crime. As punições são apenas administrativas. Essa seria a fundamental diferença com uma lei vigindo sobre o assunto.
É sabido que é justamente nos três Poderes da República (Legislativo, Executivo e Judiciário) onde ocorrem os maiores e mais graves casos de assédio moral, dado o ambiente em que as fronteiras da hierarquia profissional muitas vezes são suplantadas pela imposição da autoridade. Neste sentido, ainda está por ser escrito ainda um capítulo especial somente com episódios envolvendo as tensas relações do dia a dia, dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff com seus subordinados imediatos.
Ainda em 2001, a ex-deputada pelo Espírito Santo Rita Camata apresentou projeto de lei federal para suprir a omissão dos assédio no serviço público , o qual, por algum motivo, ainda dorme nos escaninhos da Câmara. Logo no primeiro parágrafo, o tema assédio moral ficou com a seguinte redação: “Para fins do disposto neste artigo considera-se assédio moral todo tipo de ação, gesto ou palavra que atinja, pela repetição, a autoestima e a segurança de um indivíduo, fazendo-o duvidar de si e de sua competência, implicando dano ao ambiente de trabalho, à evolução profissional ou à estabilidade física, emocional e funcional do servidor incluindo, entre outras: marcar tarefas com prazos impossíveis; passar alguém de uma área de responsabilidade para funções triviais; tomar crédito de ideias de outros; ignorar ou excluir um servidor só se dirigindo a ele através de terceiros; sonegar informações necessárias à elaboração de trabalhos de forma insistente; espalhar rumores maliciosos; criticar com persistência; segregar fisicamente o servidor, confinando-o em local inadequado, isolado ou insalubre; subestimar esforços”.
É preciso lembrar que o alvo das situações de assédio moral é individual e personalíssimo e, curiosamente, atinge sobretudo aqueles que demonstram dedicação ao trabalho, não gostam de bajulações e são competentes no que fazem. As estatísticas apontam que as maiores vítimas do assédio moral são mulheres e servidores públicos em geral. Há ainda um longo caminho a percorrer até que o assunto ganhe a publicidade que merece.
História de Brasília
O O Estado de S.Paulo apresenta também a sua versão: a culpa foi de Nostalgia, Brasília, distância dos fatos nacionais, ausência dos sentimentos populares. (Publicado em 16/9/1961)