Tem sido comum no Brasil as pessoas dizerem que não se surpreendem com mais nada diante de tantas barbaridades com as quais temos nos deparado no dia a dia. Mas quando o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) entra no circuito, sempre é possível se espantar, sobretudo pelo fato de o parlamentar ainda estar solto, apesar de tantos processos da Justiça contra ele, e, pior, mostrando um poder impressionante no Congresso. Renan realmente é um caso a ser estudado.
O senador alagoano deu, ontem, mais um golpe no governo, o que, se ressalte, tornou-se rotina depois que ele se bandeou para a oposição. A despeito de o Palácio do Planalto bater o pé de que o projeto de reforma passaria pela avaliação de apenas duas comissões do Senado, a de Assuntos Econômicos (CAE) e a de Assuntos Sociais (CAS), Renan praticamente obrigou que o tema também entrasse na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
A estratégia do peemedebista é clara: desgastar ainda mais o presidente Michel Temer ao adiar a aprovação da reforma no plenário do Senado. O governo quer liquidar essa fatura até o fim de maio para concentrar esforços nas mudanças no sistema previdenciário. Travestido de mais novo amigo dos trabalhadores, Renan difunde o discurso de que é preciso debater as reformas por mais tempo, pois a maior parte das mudanças propostas pelo Planalto é nociva à população.
Poderíamos ouvir esse discurso de qualquer um, mas não de Renan, que jamais pensou nos interesses do país. Tudo o que ele sempre fez e defendeu teve como único objetivo atender seus interesses particulares. E é o que continua fazendo. Ao criar obstáculos para Temer, o senador está entregando uma fatura que custará caro aos cofres públicos. Não é só: acredita que está se blindando da Lava-Jato e que ficará mais forte para se reeleger em 2018 e manter seu filho no governo de Alagoas.
Lula
Renan não vem agindo sozinho. Muitas de suas ações contra o governo têm sido arquitetadas com o ex-presidente Lula. O encontro de ontem do senador alagoano com as centrais sindicais teve o dedo do petista. Ante um presidente altamente impopular, Renan acredita que o momento é de colar naquele que aparece isolado na liderança de todas as pesquisas de intenção de votos para a Presidência da República. Mas, assim como Renan, Lula corre sério risco de ir para trás das grades.
Os movimentos de Renan estão tirando o sono do governo, ainda que, publicamente, o Temer diga que a posição do senador não impedirá que consiga cumprir seu cronograma de aprovar as mudanças na legislação trabalhista até o fim de maio e a reforma da Previdência até setembro ou outubro. Até o momento, pode-se dizer que Renan está em ligeira vantagem. O governo parece estar perdido na estratégia de isolar o peemedebista.
Nessa queda de braço de Renan e Temer, quem perde é o país. Quanto maior for a indefinição em relação às reformas, mais demorada será a retomada da economia. Assim que surgem sinais de que a atividade está saindo do atoleiro, vem uma notícia mais forte, mostrando que continuamos afundados no atoleiro da recessão. Vejamos o caso da indústria. Em março, a produção desabou 1,8% ante o mês anterior, o dobro da queda esperada pela média do mercado, de 0,9%.
Políticos como Renan deveriam estar fora da vida pública há muito tempo. São um fardo para o país. Tomara que, em 2018, os eleitores de Alagoas reflitam sobre o mal que, há tanto tempo, impõem ao Brasil e digam não ao senador. Fica a pergunta: você, que não acredita na possibilidade de se espantar mais, já pensou na hipótese de Renan obter mais oito anos de mandato?
Brasília, 09h30min