Tesouro continua com dificuldade para vender títulos indexados à Selic

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ROSANA HESSEL

Mesmo ofertando um volume considerado pequeno de títulos indexados à Selic (taxa básica da economia), as chamadas LFTs, o Tesouro Nacional não conseguiu vender todo o lote que anunciou para o leilão desta quinta-feira (05/11). Da oferta de até 750 mil títulos com vencimento em 2022 e em 2027, foram comprados pelo mercado 443,5 mil, pouco mais da metade (59%), com taxas cobradas pelo mercado acima dos valores de fechamento da véspera.

O valor arrecadado pelo órgão do Ministério da Economia com o leilão de LFTs, de R$ 4,7 bilhões, ficou abaixo dos R$ 5,19 bilhões com a venda de títulos indexados à Selic na semana passada, comparou o economista Sergio Goldenstein, ex-chefe do Departamento de Operações de Mercado Aberto do Banco Central e analista independente da Omininvest. 

“As medidas recentes anunciadas pelo Tesouro e pelo Banco Central para estimular a demanda por LFT estão sendo inócuas, porque a demanda por LFT continua baixa e o mercado está exigindo deságios cada vez maiores. Por conta disso, o Tesouro deveria ser mais cauteloso”, afirmou o analista ao Blog. Ele lembrou que as taxas de remuneração adicional para esse papel com vencimento 2027 ficaram em 0,345%, acima do fechamento da marcação do mercado na véspera, de 0,336%. A Selic, atualmente em 2% ao ano, está no menor patamar da história e perde para a inflação estimada pelo mercado, de mais de 3% para este ano e o próximo.

De acordo com Goldenstein, a rejeição do mercado às LFTs continua e é uma estratégia arriscada do Tesouro aceitar deságio crescente. “Se ele continuar aceitando isso, ocorrerá um problema de marcação ao mercado elevando os resgates de fundos de renda fixa”, alertou. Segundo ele, como esses fundos conservadores compram tem praticamente apenas LFT na carteira, os investidores, diante do rendimento negativo crescente, podem sacar seus recursos e os gestores seriam obrigados a vender os títulos indexados à Selic no mercado secundário, pressionando mais os deságios e atrapalhando as colocações dos demais títulos, o que aumentaria o excesso de liquidez bancária, que já é elevada

Esse excesso de liquidez, lembrou Goldenstein, é esterilizado pelo volume crescente de operações compromissadas (conhecidas como overnight) realizadas pelo Banco Central, que é resultado do fato de o Tesouro financiar o rombo fiscal em expansão devido ao aumento dos gastos públicos, com medidas como o auxílio emergencial, com recursos da conta única.

Já o leilão de títulos pré-fixados, as LTNs, foi bem sucedido, porque o Tesouro conseguiu vender praticamente todos os papéis ofertados com vencimentos em 2021, 2022 e 2024. No caso dos títulos maior lote, os 8 milhões de títulos expirando em 2024 foram comprados, remunerados a uma taxa de 6,39% ao ano. O valor arrecadado foi de R$ 6,6 bilhões. Já a oferta de 2,5 milhões de papéis com vencimento em 2022 teve 81% vendidas pagando taxas de 4,9% ao ano. O valor da operação foi de R$ 1,8 bilhão.

O terceiro lote de LTN hoje, de 5 milhões de unidades com vencimento em 2021, foi vendido quase que integralmente, arrecadando R$ 4,9 bilhões para os cofres do Tesouro. Segundo Goldenstein, a volta da oferta de títulos pré-fixados de curto prazo chamou a atenção, porque já existem R$ 290 bilhões desse tipo de papel vencendo em 1º de abril de 2021. “Podemos dizer que o leilão de títulos pré-fixados foi bem sucedido, porque aumentou um volume financeiro mais longo, para 2024, mas, ao voltar a vender papel para abril de 2021, o Tesouro está aumentando a concentração de vencimentos de curto prazo”, avaliou.

O terceiro leilão, de títulos pré-fixados com cupom semestral (NTN-Fs) com vencimentos em 2027 e 2031, chamou a atenção por apresentar taxas cada vez mais altas, apesar do volume pequeno ofertado. Os juros, de 7,25% e 7,82%, respectivamente, pagam mais do que o triplo da Selic. Do total de 1,3 milhão de títulos ofertados nessa operação, foram arrecadados R$ 1,4 bilhão para os 1,2 milhão de papéis vendidos. Segundo Goldenstein, a curva de juros futuros continua cada vez mais inclinada, ou seja, o mercado está cobrando taxas cada vez mais elevadas diante do iminente aumento dos riscos fiscais que devem fazer com que a dívida pública bruta chegue a 100% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano.

Vicente Nunes