Prejuízos no Brasil derrubam diretoria da Santa Casa de Lisboa

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Os prejuízos milionários acumulados pela Santa Casa de Lisboa no Brasil estão na base da decisão do novo primeiro-ministro de Portugal, Luís Montenegro, de demitir toda a diretoria da instituição.

As perdas no Brasil chegam a pelo menos 50 milhões de euros (R$ 280 milhões), o correspondente a 80,2% de todo o prejuízo de 62,3 milhões de euros (R$ 348,9 milhões) acumulado pela Santa Casa de Lisboa em 2023. A diferença vem de maus negócios no Peru, em Moçambique e no Reino Unido.

A instituição, que tem importante papel social em Portugal, se envolveu em uma série de negócios suspeitos ao longo de 2021 e 2022, cujos prejuízos foram se acumulando. O buraco era tão grande, que a Santa Casa contratou uma auditoria no ano passado para mapear as perdas, mas os resultados até hoje não foram divulgados.

A Santa Casa estava sob o comando de Ana Jorge, que havia se comprometido a fazer um processo de saneamento na instituição. Mas, segundo o primeiro-ministro, isso não ocorreu e a situação atual da Santa Casa é “dificílima do ponto de vista financeiro e do ponto de vista da garantia e da salvaguarda das suas funções sociais”.

Na avaliação de Montenegro, é preciso que haja total sintonia do governo com a administração da Santa Casa, para que possam ser cumpridas as orientações voltadas para uma gestão que garanta a sustentabilidade da instituição. A troca do comando da Santa Casa não tem, segundo ele, nenhuma conotação política.

Rede de corrupção

Para concretizar seu processo de internacionalização, iniciado na gestão anterior à de Ana Jorge, a Santa Casa de Lisboa criou uma unidade, a Santa Casa Global. O projeto, porém, previa um investimento máximo de 5 milhões (R$ 28 milhões) nos negócios no exterior, segundo um acordo fechado com o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social de Portugal.

O rombo na Santa Casa de Lisboa no Brasil começou com a compra 55% do capital da MCE Intermediações e Negócios por 22 milhões de euros (R$ 123,2 milhões), que é dona da Loterj, a empresa de loteria do Rio de Janeiro, e da Capital de Prêmios, um sistema de capitalização na modalidade filantrópica com forte atuação no Distrito Federal.

Mas, ao longo do caminho, foram surgindo uma série de empresas coligadas, algumas com atuação em São Paulo, que passaram a cometer fraudes em série. Esse movimento despertou a atenção da Receita Federal, que identificou sonegação fiscal e lavagem de dinheiro envolvendo a instituição portuguesa. Não só: correm na Justiça vários processos movidos por apostadores que não conseguem receber seus prêmios.

A administração da Santa Casa de Lisboa que acaba de ser demitida conseguiu evitar que o braço internacional da instituição enterrasse 14 milhões de euros (R$ 78,4 milhões) em uma parceria com o Banco de Brasília (BRB) para a exploração de loterias.

O negócio foi bloqueado pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) e pelo Banco Central. A autoridade monetária, por sinal, exigiu que o BRB refizesse seus balanços de 2022 e 2023 para retirar receitas não recebidas da parceria com a Santa Casa.

Vicente Nunes