SÓ PARA RESPIRAR

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A faca continua no pescoço, mas a Standard and Poor’s (S&P) deu ontem um refresco ao governo ao manter o país como porto seguro para o capital. Havia um temor generalizado no Palácio do Planalto de que, depois de recente passagem pelo país, técnicos da principal agência de classificação de risco do mundo retirassem o grau de investimento do Brasil, o que empurraria a economia mais rapidamente pelo precipício no qual se encontra. Mas a ameaça de rebaixamento continua latente. Bastará um passo em falso da presidente Dilma Rousseff na condução do ajuste fiscal para que o país entre na lista das nações especulativas, com acesso restrito a crédito no mercado internacional.

A S&P, como o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, sabe que a meta de superavit primário de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) é insuficiente para estabilizar a dívida bruta, que está encostando nos 64% de todas as riquezas produzidas pelo país. O importante, porém, é a trajetória, o comprometimento com a arrumação das contas públicas. Ou seja, o governo precisa mostrar que meta é para ser cumprida, sem os truques ou as maquiagens que se tornaram rotina no primeiro mandato de Dilma.

Pelos cálculos da S&P, para que a dívida bruta parasse de crescer em relação ao PIB, o Brasil teria que fazer superavits primários entre 3% e 3,5% do PIB por ano. Contudo, com a economia em retração — a agência prevê queda de 1% em 2015 —, seria necessário um arrocho brutal da atividade, o que tornaria a recessão estimada pelo mercado em brinquedo de criança. O desemprego explodiria. Assim, no entender dos técnicos da Standard & Poor’s, na atual conjuntura, a economia para o pagamento de juros da dívida deve aumentar gradualmente, para 2% em 2016 e, quem sabe, para 2,5% do PIB em 2017.

A expectativa da Fazenda é de que, a partir de agora, os mercados saíam da situação de pânico e botem os pés na realidade. No início da próxima semana, será divulgado o superavit primário de fevereiro, número que deve surpreender os investidores positivamente, pois a arrecadação foi melhor do que a esperada — os dados oficiais saem hoje. Não se pode esquecer, porém, de que o trabalho de Levy só está começando. O crédito da S&P que ele tanto contava foi dado. Agora, precisa que o Congresso Nacional, que anda refratário ao Planalto, lhe estenda as mãos.

É importante ressaltar que a situação da economia brasileira é dramática. A inflação deste ano deve ficar entre 8% e 9%, nível sem precedente desde 2003, quando Lula tomou posse pela primeira vez. O rombo nas contas externas continua muito próximo de 4% do PIB, independentemente da alta do dólar, que deveria estimular as exportações. Nas contas públicas, quando se incluem os juros da dívida, o buraco corresponde a quase 7% de todas as riquezas produzidas pelo país. A desconfiança de empresários e consumidores é enorme. Com os investimentos travados e a demanda das famílias em baixa, a retomada do crescimento, se vier, só ocorrerá em 2016.

À espera da racionalidade

Um técnico do Banco Central lembra que, além da ajuda da Standard & Poor’s, o governo está recebendo total apoio do Federal Reserve (Fed), o BC dos Estados Unidos. Diante da sinalização de que a instituição norte-americana não subirá os juros tão rápido, a tendência é de se amenizar o processo de valorização de dólar, um foco de pressão sobre a inflação. Ele lembra ainda que mais analistas têm demonstrado confiança na permanência de Joaquim Levy à frente da Fazenda. Para completar, parece que a presidente Dilma compreendeu a importância de reconstruir sua base política. “Aos poucos, a racionalidade voltará aos mercados”, diz.

O surto de Tombini

» Assessores mais próximos de Dilma classificam como, no mínimo, desastrada a decisão do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, de bater boca publicamente com o ex-presidente da instituição Affonso Celso Pastore.

Tempos distintos

» O ex-BC disse, na quinta-feira passada, que Tombini sempre promete, mas nunca entrega a meta de 4,5% de inflação. Tombini contra-atacou e afirmou que, na gestão de Pastore à frente da autoridade monetária, entre agosto de 1983 e agosto de 1985, a inflação passou de 134,69% para 224,60%.

Apoio a Pastore

» O bate-boca causou tanto burburinho no mercado que Tombini se disse arrependido do confronto e afirmou respeitar o trabalho e as opiniões do ex-presidente do BC. Pastore, no entanto, manteve a declaração, recebendo apoio maciço de economistas de todas as matizes.

Ela só pensa naquilo

» Com a popularidade no chão, Dilma inicia, amanhã, uma série de reuniões com governadores. Os primeiros a visitarem o Planalto vêm do Nordeste, região que concentra os eleitores que garantiram a reeleição da presidente. No cardápio: ajuste fiscal.

Fora do tiroteio

» Em encontro corporativo do Banco do Brasil, o ex-senador e atual vice-presidente de Agronegócio da instituição, Osmar Dias, disse a uma plateia de 2,7 mil líderes BB estar aliviado por não participar do atual tiroteio político. “Enquanto lá fora os outros estão se apunhalando pelas costas, aqui no BB me sinto seguro.”

Sorte a Abreu

» Em outro momento do evento, o presidente do BB, Alexandre Abreu, foi interrompido para a exibição de um vídeo de Paulo Rogério Caffarelli, que chegou a ser cotado para o comando da instituição. Caffarelli negou qualquer divergência com Abreu, a quem desejou sorte.

Brasília, 00h01min

Vicente Nunes