RESUMO DO FRACASSO

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Nada pode simbolizar melhor o fracasso da política econômica do governo do que o mais recente resultado do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), divulgado ontem pela Organização das Nações Unidas (ONU). O Brasil caiu uma posição no ranking, para o 75º lugar, e foi ultrapassado pelo Sri Lanka, que, há seis anos, estava mergulhado em uma guerra civil. Os dados são de 2014, quando a economia já afundava na recessão. Assim que forem incorporados os resultados deste ano, o desastre será brutal.

É desalentador ver a trajetória do Brasil desde que a presidente Dilma Rousseff chegou ao poder. Quase todas as conquistas sociais que o país acumulou depois da estabilização da economia estão se perdendo. A inflação alta, que já passa de 10%, está destruindo o poder de compra das famílias. O desemprego vem empurrando muita gente de volta à pobreza, e a recessão, jogando por terra o sonho de uma nação mais justa. Olhando para a frente, não há horizonte que nos garanta que o fundo do poço já chegou.

Cada dia de paralisia da economia custa caro aos brasileiros, mas nem governo nem Congresso parecem se importar com isso. Não há hoje um só projeto de peso sendo discutido para tirar o país do atoleiro. E mesmo nos temas que estão em debate, a opção é sempre pelo pior, a começar pela insistência de parlamentares da base aliada de Dilma em reduzir a meta de superavit primário de 2016, de 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB) para zero.

Se aprovada, a diminuição da meta fiscal dará a sentença final para o rebaixamento do Brasil pelas duas agências que ainda mantêm o selo de bom pagador do país, a Moody’s e a Fitch. Mais que isso, deixará a economia brasileira à margem do mercado de crédito internacional e prolongará o processo recessivo que resultará, apenas neste ano, no fechamento de quase 2 milhões de vagas com carteira assinada, o que não se vê há mais de 20 anos.

Fim da trégua do dólar

O clima de caos que se instalou no Brasil contribuiu para o fim da trégua do dólar. O Banco Central vinha contando com a queda da moeda de R$ 4,20 para R$ 3,70, como forma de reduzir a inflação. Além de o custo de vida não ceder, a divisa norte-americana voltou a flertar com os R$ 4 por causa, sobretudo, da crise política que tirou qualquer previsibilidade da economia. Não será o sim ou o não para o processo de impeachment da presidente Dilma que reverterá as incertezas.

A nova arrancada do dólar, acredita o economista-chefe da INVX Global Partners, Eduardo Velho, exigirá uma ação mais rápida do BC. A instituição terá que elevar a taxa básica de juros (Selic), que está em 14,25% ao ano, em janeiro próximo, para tentar ancorar as expectativas inflacionárias. Se não fizer isso, correrá o risco de trazer de volta um forte movimento de indexação, no qual preços e contratos são reajustados automaticamente pela inflação passada.

“Quanto mais o BC demorar para agir, mais custoso será o processo para colocar a inflação nos eixos. A autoridade monetária não pode permitir um quadro em que o piso para a inflação de 2016 está em 7%, acima do limite de tolerância, de 6,5%”, ressalta Velho. Nas contas dele, com as chuvas atrapalhando os produtos in natura, como frutas e legumes, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do primeiro trimestre do ano que vem poderá ultrapassar os 3%, nível incompatível com o que promete o BC — manter a carestia abaixo do teto da meta no ano que vem e levá-la para 4,5% em 2017.

Velho chama a atenção ainda para a incapacidade do governo de tirar proveito da queda do dólar. Em um ambiente tranquilo, a perda de força da moeda norte-americana ante o real ajudaria a desinflar a economia. Mas, com tanta confusão política, uma administração sem rumo e a presidente da República só pensando em salvar o mandato, os agentes econômico não se intimidaram em repassar aos consumidores o aumento do custo cambial que haviam represado.

Sem escapatória

Nesse contesto desolador, além da alta dos juros, o BC terá que contar com uma deterioração maior do mercado de trabalho para conseguir atingir seu objetivo e retomar o controle da inflação. O desemprego deverá aumentar muito — e rapidamente — para que o consumo das famílias desabe. Sem isso, será difícil evitar que o presidente da autoridade monetária, Alexandre Tombini, seja obrigado a passar por mais um vexame de ter que explicar, em carta à nação, os motivos que o levaram a não cumprir sua principal missão, a de manter a inflação dentro da meta.

“A ajuda para segurar o dólar o BC já teve, que foi a manutenção de vetos da presidente Dilma a projetos que acabariam de destruir as contas públicas, a chamada pauta-bomba. Depois da prisão do senador Delcídio do Amaral, no âmbito da Operação Lava-Jato, a trégua acabou”, afirma o economista da INVX. Para completar, há toda a volatilidade provocada pela decisão do Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, de aumentar os juros a partir desta quarta-feira e a demissão cada vez mais próxima do ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Enfim, se alguém ficou desapontado com o resultado do novo IDH, deve ir preparando os ânimos. A tendência de queda do Brasil no ranking dos países com as melhores condições de vida do planeta já está contratada. Não há escapatória.

Brasília, 08h30min

Vicente Nunes