A pesada fatura do desperdício de capital humano

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POR ANTONIO TEMÓTEO E RODOLFO COSTA

Para um país que se ressente de mão de obra especializada, desperdiçar capital humano custará muito caro quando a economia voltar a crescer. “Esse é um dos piores males da recessão e do desemprego”, diz o economista Bruno Ottoni, especialista em mercado de trabalho do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV). Os desocupados deixam de acumular experiência profissional, ficam desatualizados e perdem produtividade. “Em um mundo competitivo, isso significa dizer que ficaremos para trás mais uma vez”, acrescenta.

Os efeitos negativos da crise econômica serão sentidos por anos, reconhece Ottoni. Na construção civil, por exemplo, que tem peso importante para a indústria e os investimentos, a reação será lenta e gradual. Há muita ociosidade, obras paradas e imóveis prontos encalhados. “Não por acaso, os engenheiros encontram dificuldade para encontrar trabalho quando saem da universidade”, destaca. “E vão continuar encontrando, pois estamos longe de uma recuperação consistente da atividade.”

O quadro está tão dramático, acrescenta o economista da FGV, que, além da dificuldade de se conseguir uma vaga no mercado formal, os brasileiros que conseguem emprego estão ganhando menos. Pelas contas dele, o salário médio dos que tem sido contratado está, em média, 15% abaixo frente à remuneração de quem foi dispensado. O cálculo leva em conta os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho. “A mudança desse cenário passa pela retomada do crescimento econômico. Mas as previsões apontam que esse processo será lento”, diz.

Desânimo

Ottoni estima que o desemprego chegará a 12,5% em dezembro próximo e a 13% ao longo de 2017, previsão considerada otimista por muitos analistas, dado o estrago que se viu na economia. Na avaliação dele, quando o país sair do atoleiro, a recuperação do Produto Interno Bruto (PIB) será muito lenta. E não apenas por causa do desastre provocado pela administração de Dilma Rousseff. Também o atual governo tem sua parcela de culpa ao manter uma postura dúbia. Ao mesmo tempo em que promete fazer um ajuste fiscal consistente, aumenta gastos paga obter apoio político. Esse tipo de comportamento adia a retomada da confiança dos agentes econômicos.

Sendo assim, avalia Ottoni, a geração de vagas no mercado formal de trabalho só vai superar os desligamentos a partir de 2018. “No ano passado, os brasileiros passaram a trabalhar por conta própria, tanto que esse tipo de ocupação cresceu 4,4%. Mas, agora, o que vemos é uma tendência redução nesse movimento”, afirma. A recessão também está minando os sonhos de quem acredita que pode se virar sem a tradicional carteira assinada. Empreender ficou muito mais complicado.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), somente nos trimestre terminado em maio, 314 mil pessoas tiveram que fechar o próprio negócio ante os três meses imediatamente anteriores. Agora, são 22,6 milhões de pessoas nessa condição. Diante dessa retração, o rendimento médio real desses trabalhadores caiu 3% em igual período, para R$ 1.504. Quem está nessa situação é o vendedor Patrick Batista, 33 anos, que, desempregado, virou vendedor ambulante. “Se não fosse isso, passaria fome”, diz.

Em 2014, ele trabalhava como ajudante de cozinha em Goiânia, mas pediu as contas e partiu para Brasília imaginando dias melhores. A mudança, no entanto, o desapontou. Na capital federal, passou a trabalhar com bicos de pintor e ajudante de pedreiro, a uma diária de R$ 70. Nos melhores períodos, conseguia R$ 1,6 mil por mês. À medida que a recessão se aprofundava, a renda caía junto. “Chegou um momento que já não tinha como pagar mais as contas”, relata. “O mais triste é que, quando olhamos para a frente, não vemos saída, a não ser andar para trás.”

Brasília, 12h10min

Vicente Nunes