PELA PORTA DOS FUNDOS

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Foi um longo processo de desgaste e desrespeito, mas, finalmente a dignidade do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que havia se tornado um zumbi, falou mais alto, e ele decidiu sair do governo. Não há como negar que o técnico que, há um ano, desembarcou em Brasília cheio de moral tentou, de todas as formas, mudar um governo fadado ao fracasso. Mas venceram as ideias equivocadas, justamente aquelas que levaram o Brasil a registrar a pior recessão em pelo menos três décadas, a resgatar o fantasma da inflação, a levantar o temor de calote na dívida pública e a provocar o desemprego em massa.

 

Levy, infelizmente, sairá pela porta dos fundos. Sua gestão foi um fiasco. Quase nada do que ele prometeu fazer se tornou realidade. Muitos dos seus defensores dirão que a culpa não foi dele. Foi sim. Na primeira grande derrota que sofreu — a redução da meta de superavit primário de 2015 de 1,1% para 0,15% do Produto Interno Bruto (PIB) —, ele já deveria ter pedido para sair. Ali estava claro que a mudança de pensamento alardeada por Dilma era uma farsa, só repetia as propagandas enganosas que lhe garantiram a reeleição.

 

Mas Levy preferiu insistir no erro. E foi se tornando um remendo de ministro da Fazenda. No mesmo dia em que falava alguma coisa, o Palácio do Planalto e o Ministério do Planejamento — onde está seu grande algoz, Nelson Barbosa — tratavam de dizer exatamente o contrário. Pior: agiam nos bastidores para desqualificar Levy. Não por acaso, o ministro esteve, ao longo do ano, sob intenso bombardeio dentro do governo, no PT, no Congresso e entre representantes de entidades que representam trabalhadores e vivem penduradas no setor público.

 

No governo errado

 

Um dos poucos ministros que ainda defendem a permanência de Levy na Fazenda resume bem a situação: “Levy era o cara certo no governo errado”. O desejo do ex-funcionário do Bradesco, que largou um salário anual de mais de R$ 1,2 milhão ao ano para atender o convite de Dilma, era virar a página de uma administração marcada pela mediocridade. Mesmo estando claro para ele que era um estranho no ninho do PT, apostou todas as fichas de que a presidente da República contaria com a credibilidade dele para resgatar a confiança dos agentes econômicos.

 

Nos primeiros meses do segundo mandato, até que conseguiu imprimir sua marca. Contudo, o populismo voltou a falar mais alto. Sobretudo a partir do momento em que o impeachment entrou no radar de Dilma. À medida que o processo de impedimento ganhava força, mais fraco Levy ficava. Na cabeça da petista e de seus asseclas, consolidou-se a visão de que, para barrar qualquer tentativa de encurtar o mandado presidencial, era preciso deixar os cofres bem abertos para adoçar a boca de políticos rebeldes, postura incompatível com o ajuste fiscal prometido pelo ministro da Fazenda.

 

Apesar de toda a humilhação à qual submeteu Levy nas últimas semanas, em especial, ao enviar para o Congresso a proposta de redução da meta de superavit primário de 0,7% para 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), com a possibilidade de a meta ser zerada, Dilma acreditava que ele lhe seria fiel até a hora de ela definir o sucessor para a Fazenda. Levy estava disposto a pagar esse preço. Contudo, o fato de ninguém do governo lhe estender as mãos para ao menos oferecer solidariedade  o convenceu de que já havia passado a hora de sair.

 

O resto é o resto

 

Dilma já até preparou o discurso para agradecer “os excelentes serviços” prestados por um servidor público comprometido com os interesses do país. Mas, no fundo, ela está agradecendo por, agora, estar livre de qualquer pressão para retomar as maluquices que prevaleceram no primeiro mandato. E que ninguém acredite que o futuro ministro da Fazenda terá autonomia para agir, seja ele quem for.

 

Se Dilma conseguir se livrar do impeachment, o governo não fará ajuste fiscal, mas apenas um disfarce de superavit primário. A petista acredita que, para o país sair do atoleiro no qual ela o meteu, é preciso dar estímulos, como se o Estado ainda tivesse capacidade de intervir na economia. O que a presidente colherá, porém, será mais recessão, inflação e desemprego. O Brasil não aguenta mais esse tipo de política desastrosa.

 

A saída de Levy do governo acende, portanto, todos os sinais de alerta. O governo, que já estava à deriva, tende a afundar de vez e levar o país junto. Não há como esperar bom senso diante de tudo o que já se viu. Para o Palácio do Planalto, o mais importante é garantir o mandato de Dilma. O resto é o resto.

 

Brasília, 08h30min