ROSANA HESSEL
O governo Jair Bolsonaro (PL) não conseguiu arrecadar R$ 1 trilhão com privatizações como o prometido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e, agora, no fim do governo, quer ao menos tirar o pé da lama com o processo de privatização da Eletrobras, engordando o caixa da União com dezenas de bilhões de reais. Mas isso não significa que a transferência do capital acionário da empresa beneficiará os consumidores com tarifas mais baratas.
De acordo com um relatório divulgado na noite desta quinta-feira (28/4) pelo banco suíço UBS, o impacto nas tarifas para o consumidor brasileiro não deverá chegar a 1%. Esse dado é muito abaixo da inflação que não dá trégua e corrói o poder de compra da população. No acumulado em 12 meses até a primeira metade de abril, a carestia já supera 12%, conforme dados do Índice de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), divulgados, ontem, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“Acreditamos que o impacto em 25 anos poderia ser uma redução tarifária de apenas 0,95%, ou um total de R$ R$ 1,9 bilhão”, alertaram os analistas Giuliano Ajeje e Guilherme Reif. Eles escreveram ainda que a contribuição para o GSF (Generation Scaling Factor, medida de risco que analisa a relação entre o volume de energia produzido e a garantia física de cada usina), é maior até o ano de 2027 “e o reajuste tarifário decorrente do fim do regime de cotas só será observado a partir de 2029”.
Procurados, o Ministério de Minas e Energia (MME) e o Ministério da Economia não comentaram o assunto. Em nota, o MME disse não teve acesso ao relatório. “Todas as informações sobre a capitalização estão disponíveis no site do ministério, inclusive sobre o impacto para o consumidor”, acrescentou a pasta.
No documento, os analistas destacaram que, no fim do ano passado, o Conselho Nacional de Pesquisa Energética (CNPE) aprovou a concessão de bônus no valor de R$ 67 bilhões, sendo R$ 32 bilhões serão pagos à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) para mitigar os impactos tarifários em 25 anos, R$ 8,8 bilhões para benefícios e R$ 25,4 bilhões que serão pagos ao Tesouro Nacional. Eles lembraram que o próprio processo de capitalização geraria R 67 bilhões em “bonificação” para o governo federal.
De acordo com o relatório, o governo venderia apenas parte de suas ações se o preço de capitalização não for suficiente para reduzir a participação do governo para menos de 45%. “Assim, acreditamos que o governo provavelmente venderia suas ações se o preço do oferta for maior (acima de R$ 32,15/ação em um cenário de oferta primária de R$ 25 bilhões)”, informou o documento.
Os analistas ainda ressaltaram que se o preço da oferta for de R$ 40 – valor atual da ação da Eletrobras na Bolsa – , o governo pode gerar R$ 77 bilhões (R$ 67 bilhões de bônus de outorga + R$ 10 bilhões da avaliação do patrimônio líquido da Eletrobras, tomando como referência o preço de R$ 28,8 durante a semana em que o ex-presidente Wilson Ferreira renunciou). “Para cada R$ 5 por ação de mudança, estimamos que o valor total para o governo mudaria em até 5%”, destacaram os analistas.
Vale lembrar que, além de atropelado, pois não houve discussão apropriada durante a tramitação no Congresso, o processo de privatização da Eletrobras é cheio de jabutis, que podem custar caro ao contribuinte como a obrigatoriedade de contratação de energia de termelétricas que não estão interligadas ao sistema ou nem foram construídas, e valores controversos que levaram a questionamentos do Tribunal de Contas da União (TCU), onde o processo está travado.