Os erros de Temer, do Congresso, das corporações, de todos nós

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O vandalismo que destruiu a Esplanada dos Ministérios simboliza todos os erros cometidos pelo país. Erra o presidente Michel Temer quando insiste em permanecer no comando do governo mesmo sem ter condições morais para o ocupar o cargo. Erram as centrais sindicais ao defenderem interesses corporativos que não se sustentam mais, por beirarem a aberração. Erram os que foram às ruas defender o Diretas Já, por se juntarem a grupos extremistas. Erra o Congresso ao se recusar a votar temas tão relevantes para o Brasil, como as reformas trabalhista e da Previdência Social.

Enquanto insistirmos nesses erros, serão cada vez mais comuns cenas de violência como as da praça de guerra na qual se transformou Brasília ontem. Portanto, chegou a hora de o país decidir em que caminho quer seguir. Não há mais espaço para interesses específicos. É preciso pensar o país com um objetivo único, que leve à retomada do crescimento, à criação de empregos, à geração de renda e à redução das desigualdades sociais. Só assim poderemos revolver as mazelas que nos assombram todos os dias e tornam o Brasil uma das nações mais injustas do mundo.

Foram os interesses de grupos específicos, cada um querendo defender o seu quinhão, que resultaram no maior esquema de corrupção da história. Todos os que estão em confronto agora usufruíram, de alguma forma, da roubalheira generalizada que parece não ter fim. A percepção clara é de que ninguém quer abrir mão de benesses, mesmo que isso signifique botar fogo no país. É um comportamento absurdo, inaceitável. Esse tipo de postura só empurra o Brasil para o precipício. O risco de mergulharmos no caos institucional é latente.

Legitimidade

Protestos são mais do que legítimos, mas desde que ocorram de forma pacífica. Nunca esse país precisou tanto do debate e do contraditório. O problema é que estamos vivendo tempos de extremos, de que posições contrárias são combatidas com violência. O discurso de muitos de que está se defendendo a democracia não se sustenta. A guerra fratricida que estamos assistindo só abre espaço para oportunistas. Estamos criando um monstro, que, com a pecha de salvador da pátria, poderá governar o país a partir de 2019.

Temos que usar as imagens marcantes das manifestações de Brasília, que deixaram dezenas de feridos e um rastro de destruição em prédios públicos, para refletirmos sobre nossas ações. Está explícito que erramos todos. Organizadoras dos protestos, as centrais sindicais levantam a bandeira contra as reformas trabalhista e da Previdência Social, mas seu objetivo único é manter a farra do imposto sindical que as sustenta e garante privilégios a seus comandantes. Essas entidades precisam deixar de se dependurar em dinheiro público.

Já o presidente Temer precisa entender que perdeu a governabilidade, que já não conta mais com o apoio necessário para comandar o país. A base aliada que o peemedebista ostentava até as delações dos irmãos Joesley e Wesley Batista, do grupo JBS, se esfacelou. Ao que tudo indica, se não sair por vontade própria, o presidente poderá ser retirado do poder pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ao cassar a chapa Dilma-Temer, acusada de abuso de poder econômico nas eleições de 2014.

Sopro de sensatez

Presidente do grupo suíço ABB no Brasil, o espanhol Rafael Paniagua assistiu, atônito, ao vandalismo em Brasília. Ele estava ontem na capital federal para comemorar os 105 anos da chegada da empresa ao país. Para ele, o Brasil é maior do que tudo o que se está vendo, mas é vital que a crise política que faz sangrar a economia seja superada o mais rapidamente possível. “O Brasil tem dado demonstrações claras do quanto suas instituições são fortes. É preciso, contudo, avançar. Não é fácil conviver com esse quadro de turbulência”, afirma.

Paniagua entende que, num clima sem tensões políticas e com um governo forte, o potencial de crescimento do país é enorme. A ABB, maior fabricante de robôs do mundo, tem muito interesse em projetos de infraestrutura, sobretudo em energias renováveis. “Estamos falando de um mercado de 200 milhões de consumidores, no qual há muita coisa por fazer”, frisa. O executivo ressalta que, talvez pelo distanciamento de ser estrangeiro, consegue fugir do pessimismo que tem dominado os brasileiros. “Estamos comemorando, até agora, a inauguração, em janeiro, da nossa quarta planta industrial no Brasil, que consumiu investimentos de R$ 10 milhões”, diz. Talvez Paniagua esteja certo: nem tudo está perdido.

Brasília, 06h30min

Vicente Nunes