O CUSTO DA ARROGÂNCIA

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A presidente Dilma Rousseff está sentindo o quanto custa caro a arrogância. Mesmo reeleita com uma margem pequena de votos, acreditou que continuaria tendo poder de sobra para manter o modelo de decisão do primeiro mandato: ela e mais ninguém. Foi essa postura que levou o Brasil a mergulhar na mais grave crise econômica desde a edição do Plano Real, em 1994, e a criar um ambiente político totalmente hostil ao governo.

Independentemente dos interesses escusos do senador Renan Calheiros de devolver para o Palácio do Planalto a MP 669, que trata das desonerações, a iniciativa explicitou o quanto Dilma errou a se achar acima do bem e do mal. Como se pudesse inventar a roda na economia e na política. Ao mesmo tempo em que empurrou o país para uma grave recessão, a presidente criou uma crise de governabilidade. Se quiser terminar o segundo mandato de pé, terá de se submeter aos interesses do PMDB, sem o qual não conseguirá levar adiante o ajuste fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Dilma sabe os riscos que corre. E, para não ser engolida de vez pela crise que criou, terá de se afastar de suas convicções de esquerda e migrar mais para o centro-direita. Terá que seguir o caminho trilhado por seu criador, o ex-presidente Lula, que não se intimidou em assumir a postura de um violinista, segurando o instrumento musical com a mão esquerda e tocando com a direita. A presidente sabe que está refém do PMDB e será chantageada pelo partido. Sabe, também, que precisa de Levy para tentar reverter, o quanto antes, o desastre econômico para o qual ela empurrou o país.

Dentro do Planalto, o clima é de tensão. A visão é de que, para recuperar a governabilidade, o governo terá que mexer no ajuste fiscal, talvez até abrandá-lo. Ainda assim, precisará pagar a conta se quiser aprovar parte do arrocho e evitar o rebaixamento do país pelas agências de classificação de risco. Nas palavras dos políticos, o acerto de contas da arrogância virá por meio do rateio de cargos na Esplanada dos Ministérios.

Para assessores de Dilma, o lobby contra o ajuste fiscal está fortíssimo no Congresso. Acreditam que decisão da presidente de segurar os cargos do segundo e do terceiro escalões para ter poder de barganha na votação do ajuste fiscal só piorou a situação, porque, agora, todos estão insatisfeitos. Pior: a petista está com a popularidade em baixa. Não tem mais o argumento de que, com o apoio do povo, não precisa se render à política rasteira da troca de favores que prevalece entre os partidos políticos. O Palácio fraco só faz com que todo mundo queira tirar uma casquinha.

Foi essa visão, por sinal, que levou pânico aos investidores ontem, a ponto de o dólar superar os R$ 3. A fragilidade do governo deixou a sensação de um país sem rumo. Apesar de o ministro da Fazenda ter garantido a investidores e empresários, com os quais se encontrou depois da traição de Renan, que o compromisso fiscal está mantido, muitos saíram da conversa convencidos de que o governo está se desmontando rápido demais. Os mais pessimistas já veem uma possível queda de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano como piso, tamanha a paralisia da atividade e a onda de desconfiança.

Pressão reduz risco de erros

» Os investidores acreditam que pode ser bom para o país ter a presidente Dilma sob pressão. O risco de ela insistir nos erros diminui e garante medidas efetivas para tirar o país do atoleiro. Ninguém espera, porém, uma travessia tranquila até que o ajuste fiscal comece a dar resultados. Ao caminhar mais para o centro-direita, a presidente terá que lidar com a ira do PT. Ao seu partido, restará pouco a oferecer.

BC longe da mira

» Com o Palácio sob pesado tiroteio, ninguém do entorno de Dilma deu atenção à decisão do Banco Central de elevar a taxa básica de juros (Selic) para 12,75% ao ano. Mas esse distanciamento vai diminuir quando aparecerem os números da atividade. Antes da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), no fim de abril, o governo já terá em mãos a queda do PIB no quatro trimestre de 2014 e indicadores preliminares mostrando que os primeiros três meses de 2015 foram terríveis.

Souza Cruz fora da bolsa

» O processo para o fechamento de capital da Souza Cruz está acelerado. “A decisão é da British American Tobacco (BAT), a acionista majoritária, que tem todo o direito de fazer suas avaliações de alocação de recursos”, diz o presidente da empresa, Andrea Martini. A BAT considera, “do ponto de vista estratégico e financeiro”, este o momento mais apropriado para sair da bolsa de valores.

Os reis da cocada preta

» Ao cobrarem reajuste médio de 35% nos salários, os auditores da Receita Federal se autointitulam “a nata da nação”, os “mais qualificados servidores públicos do país” e os “tendões da República”. Em manifestação ontem, afirmaram que não podem conviver com tanto arrocho. Segundo a servidora Adise Bastos, da Bahia, “antes, os fiscais podiam sair de férias e, com o dinheiro recebido, viajar para e exterior e ainda comprar um carro novo”. Agora, o rendimento não chega ao fim do mês.

Brasília, 18h55min