O RUIM E O PIOR

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Que ninguém acredite numa saída fácil para o Brasil caso o Senado decida pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff, que teve ontem uma derrota humilhante na Câmara dos Deputados. A situação em que o país se encontra hoje é dramática e não se reverterá num passe de mágica a partir do momento em que o governo for entregue a Michel Temer. Se realmente chegar ao Palácio do Planalto, o vice-presidente terá que mostrar muito mais do que um discurso de conciliação e de promessas para o resgate da economia. Terá que dar provas de que não estará substituindo a corrupção que jogou os eleitores contra o PT e Dilma pela roubalheira comandada pelo PMDB, que, se ressalte, está envolvido até o pescoço com os desvios na Petrobras desvendados pela Operação Lava-Jato.

 

O vice-presidente não é bem-visto pela maior parte da população. O partido dele simboliza o que há de pior na política: o fisiologismo. Está sempre disposto a usar a máquina pública em benefício próprio, em detrimento da maioria. De nada adiantará Temer apresentar um time de estrelas para formar seu ministério se não houver um compromisso com a ética. A maioria da população que hoje pede a saída de Dilma está vigilante e desconfiada, sobretudo pelas fortes ligações do vice com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que corre o risco de ser cassado por corrupção. As ruas não darão chance para que se repitam no governo todos os males que levaram mais um presidente a sofrer o impeachment.

 

A desconfiança em relação a Temer é grande. Mesmo entre o empresariado e os investidores, que são abertamente a favor da interrupção do mandato de Dilma, há sérios questionamentos se realmente o peemedebista é a pessoa mais indicada para tirar o Brasil do atoleiro em que se encontra. O ideal seria que o país fosse entregue a um líder não vinculado ao atraso, capaz de unir forças e de dar prosseguimento ao irreversível processo de limpeza do poder. Portanto, Temer não terá direito a errar, caso o Senado lhe entregue a Presidência da República. O Brasil já perdeu tempo demais.

 

Arrogância e mentiras

 

Dilma, infelizmente, é a maior responsável por Temer — a quem ela acusa de traidor — estar quase sentado na cadeira presidencial. Desde que tomou posse, a petista trabalhou incansavelmente para destruir as pontes que lhe garantiriam o cumprimento de seu mandato. Desdenhou da política, acreditando que poderia governar sozinha. Colocou-se acima do bem e do mal enquanto o partido dela surrupiava o dinheiro do povo. Destruiu todas as bases da economia, criando a pior recessão em quase 100 anos e levando 10 milhões ao desemprego. Acabou com as finanças públicas.

 

Mesmo alertada para os erros em série que cometia, Dilma permitiu que o Brasil, pouco a pouco, fosse empurrado para a mais grave crise da história recente. Preferiu se apegar à arrogância e atacar os críticos. Não teve humildade para ver que o barco estava afundando. Pelo contrário, recorreu a mentiras para destruir a imagem daqueles que poderiam lhe tirar a reeleição. Iludiu a população por meio de propagandas enganosas mostrando um país em crescimento, gerando emprego e com  inflação sob controle. Assim que as urnas lhe garantiram mais um mandato, descortinou-se uma economia em frangalhos.

 

Já com o impeachment se tornando irreversível, Dilma pouco se preocupou com a opinião pública ao tentar nomear o ex-presidente Lula ministro da Casa Civil para que ele se livrasse das garras do juiz Sérgio Moro, responsável pela Lava-Jato. Até ali, se ainda havia alguma complacência com a presidente, ela se dissipou por completo. O grosso da população passou a avalizar o impedimento apesar de o processo estar sendo conduzido por Eduardo Cunha, acusado de ter contas ilegais no exterior e de ter recebido propina de contratos superfaturados da Petrobras. O discurso que passou a prevalecer entre os eleitores foi o de que a prioridade, primeiro, era afastar Dilma e, depois, o presidente da Câmara.

 

Paciência curta

 

A decisão da Câmara dos Deputados a favor da abertura do processo de impeachment mostra que o país está optando entre o ruim e o pior. Nem Dilma nem Temer são os mais indicados para conduzir o Brasil neste momento. Como diz uma importante autoridade, por tudo o que se revelou pela Operação Lava-Jato, por todas as cobranças que estão sendo feitas nas ruas, pela situação agonizante da economia, o melhor seria entregar à população o direito de escolher quem deve conduzir o país. PT e PMDB representam tudo o que se quer jogar no lixo.

 

É possível que, na falta de opção melhor, os mercados abram hoje em clima de euforia para sancionar o apoio ao impedimento de Dilma. A expectativa é de que parte da confiança perdida retome. Mas a cobrança sobre Temer será enorme. A partir de agora, ele terá que dar respostas claras sobre como conduzirá o país no caso de o Senado lhe repassar a Presidência da República. O capital não aguenta mais promessas vazias. E não perdoará se o vice optar pela travessia mais fácil: o aumento de impostos para tentar ajustar as contas públicas em vez de assumir compromisso pelas reformas adiadas por tanto tempo, como a da Previdência Social.

 

Os investidores também vão monitorar como Temer se comportará caso o Supremo Tribunal Federal (STF) decrete, nos próximos dias, a prisão de Eduardo Cunha. Os dois estão ligados umbilicalmente no processo de afastamento de Dilma. O vice não poderá titubear. Qualquer sinal de apoio ao aliado será entendido como um sinal de que ele pode, sim, atuar nos bastidores para proteger os amigos. Não bastará a Temer dizer que é honesto. Terá que parecer honesto.

 

Brasília, 08h30min