Novo auxílio terá impacto de 2% no consumo, diz ex-diretor do BC

Publicado em Economia

ROSANA HESSEL

 

O novo auxílio emergencial, que deve ter valor médio de R$ 250 e está sendo aguardado pelos mais vulneráveis e trabalhadores informais, deverá ajudar muito pouco o processo de retomada da economia, na avaliação de Carlos Thadeu de Freitas Gomes, ex-diretor do BC e economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC).

 

“Vai ajudar muito pouco na retomada do consumo. Os R$ 44 bilhões de gastos previstos com o programa representam apenas 2% do varejo total”, comentou o economista ao Blog. Ele considerou precipitada a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) elevar a taxa básica da economia (Selic) ontem. A medida surpreendeu o mercado e foi na contramão do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), dividindo opiniões.  

 

Ao aumentar a Selic de 2% para 2,75% ao ano, acima do esperado pelo mercado, o Banco Central agradou os agentes financeiros e desagradou o setor produtivo. Como os juros estavam no menor patamar da história, aplicações em títulos públicos e até a poupança não param de perder para inflação. Logo, havia uma pressão do mercado financeiro sobre a autoridade monetária por medidas mais contundentes no combate à inflação que está cada vez mais forte neste início de ano e, consequentemente, melhorar a rentabilidade dos principais credores da dívida pública interna: o mercado financeiro.

 

Logo, a reação à alta mais forte na Selic foi positiva e a Bolsa abriu esta quinta-feira (18/03) em alta e o dólar está em queda. Contudo, vale lembrar que essa antecipação em ritmo mais forte do novo ciclo de da alta dos juros básicos, contudo, pode ter um efeito ruim tanto na recuperação da atividade econômica quanto no endividamento do público, o que não deverá agradar o governo e, muito menos, a população que for buscar crédito ou emprego.

 

Não à toa, apesar de o Congresso Nacional ter aprovado, recentemente, a autonomia do Banco Central, a decisão do Copom de ontem, certamente, vai gerar dúvidas em relação a essa independência de fato.  “O problema é a credibilidade. A autoridade monetária precisa mostrar que é autônoma em relação ao governo e também em relação ao mercado”, aconselhou o ex-diretor do BC.

 

Momento ruim

 

De acordo com Freitas Gomes,  o Copom não deveria começar a elevar a Selic neste momento em que a crise provocada pela covid-19 no país está recrudescendo. O país não para de bater recordes de mortes e já está no epicentro global da pandemia. Ele avaliou que seria melhor o BC esperar, pelo menos, o início do pagamento da nova rodada do auxílio emergencial, que inda não teve a Medida Provisória (MP) para a criação do benefício publicada pelo governo, apesar das promessas de que isso ocorreria “imediatamente” após a promulgação da Proposta de Emenda (PEC) 186/19, a PEC Emergencial. A MP, finalmente, foi assinada pelo presidente Jair Bolsonaro, mas ainda não foi entregue ao Congresso. O pagamento do benefício deverá começar em abril.

 

“O  Copom precificou o fim da pandemia, com certeza de que tudo vai voltar ao normal. Mas o setor de serviços (o que mais emprega e o último que deverá se recuperar da recessão do ano passado) vai levar mais tempo para se recuperar”, lamentou o economista.

 

Para ele, o mais importante no momento é a transparência na comunicação. Tanto o Copom e quanto o governo precisam dar mais sinais claros de que estão comprometidos em reduzir o endividamento público, para melhorar o quadro fiscal, que é o que preocupa os investidores.  A desconfiança nessa questão vem ajudando a valorizar o dólar frente ao real e seu impacto acaba ocorrendo na inflação, que está em escalada e foi o principal motivo para que o Comitê elevasse a Selic, de acordo com analistas.

 

Mas, diante do risco de colapso em vários estados, o governo precisa ser mais expansionista neste momento em que a pandemia faz estrago na saúde da população e tem reflexos diretos na economia, no entender de Freitas Gomes. “O governo vai ter que gastar mais, porque o impacto do auxílio emergencial será pequeno. Será preciso injetar na economia um auxílio como foi no ano passado e ainda adotar as mesmas medidas para as empresas como o BEm (Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda) o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe). Depois ele aciona os gatilhos para cortar despesa”, destacou. 

 

E, nesse sentido, o ex-diretor do BC acha importante também impor um limite para a dívida pública. “É preciso ter regras para o crescimento do endividamento, mas falta vontade política para um aperto nessa direção”, afirmou. 

 

Atualmente, a dívida pública bruta do Brasil gira em torno de 90% do Produto Interno Bruto (PIB), quase o dobro da média dos países emergentes, em torno de 50%.

 

Um levantamento , ontem, feito pelo economista André Perfeito, da Necton Investimentos, mostrava que uma alta de 0,50 ponto percentual na Selic gera um custo de R$ 16,7 bilhões na conta de juros da dívida pública. Logo, a elevação de 0,75 ponto percentual de elevação na Selic, de ontem, mais a de 0,75 ponto percentual contratada para a próxima reunião de maio, devem triplicar essa fatura, chegando a R$ 50 bilhões, ou seja, mais do que a previsão do auxílio emergencial.