NO VÁCUO DO GOVERNO

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Os investidores estão vendo o impeachment da presidente Dilma Rousseff como um fato cada vez mais distante. Mas isso não impediu o mercado financeiro de se apegar, com todas as forças, ao programa de governo apresentado pelo PMDB, que critica o desequilíbrio fiscal e a indexação da economia — quase 60% do Orçamento da União são corrigidos pela inflação passada. As medidas propostas pelo partido do vice-presidente Michel Temer são forte contraponto à inação do Palácio do Planalto para tirar o país do atoleiro e vistas como uma âncora em caso de os ventos voltarem a soprar contra a petista.

Durante o período mais crítico para Dilma, em que o mandato dela ficou realmente ameaçado, os investidores levantaram muitas dúvidas do que seria um governo de Temer, caso ele acabasse ocupando a Presidência da República. O PMDB é um partido de histórico ruim, com a imagem atrelada ao fisiologismo e à corrupção. Mas, ao propor iniciativas como a reforma da Previdência Social, fixando idade mínima para a aposentadoria, e mudanças na exploração do petróleo, a legenda acaba se aproximando do mercado.

A visão dos investidores é de que Dilma perdeu a capacidade de reconquistar a confiança no país. Como poucos acreditam que ela terá o mandato interrompido, projetam números cada vez piores para a economia. O pessimismo é tanto que nem a perspectiva de permanência do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, no governo até o fim de 2018 anima os especialistas a preverem uma reação consistente da atividade nos próximos anos. A razão é simples: Dilma continua dando sinais de ambiguidade em relação ao ajuste do governo. Ao mesmo tempo em que diz ser necessário arrumar as contas públicas, prega, de forma veemente, o aumento de gastos.

A presidente, por sinal, sentiu o baque do programa apresentado pelo partido de Temer. Mesmo não indo ao lançamento da pedra fundamental de uma empresa no interior de Mato Grosso do Sul, por causa da saúde da mãe, a petista obrigou a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, do PMDB, a ler seu discurso, no qual atacou a legenda do vice: “Não estamos prisioneiros da agenda de ajustes. Temos uma agenda consistente de estímulo ao desenvolvimento”, disse Dilma.

O discurso da presidente é esvaziado pelos fatos. Nada do que o governo propõe é levado adiante, seja porque os projetos não são viáveis, seja porque impera a incompetência. O caso mais gritante é o ajuste fiscal. A promessa de arrumar as finanças do país se transformou em um contundente fracasso, que praticamente tirou do Banco Central a capacidade de controlar a inflação.

Não por acaso, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado como referência para o sistema de metas de inflação, mostrará nova arrancada. Pelos cálculos do economista-chefe do banco Santander, Maurício Molan, o indicador, que será divulgado na próxima sexta-feira, atingiu 0,78% em outubro ante 0,54% de setembro. No acumulado de 12 meses, a taxa cravou 9,89%. A aceleração do custo de vida foi puxada, sobretudo, pelos grupos alimentação, bebidas e transportes.

A carestia será confirmada pelo IGP-DI. Molan projeta alta de 1,69% neste mês contra 1,42% de setembro. A disparada decorreu, principalmente, da valorização do dólar e da alta da gasolina e do diesel. Segundo o economista, a inflação dos produtos agropecuários, que compõem o índice, deve ter ficado acima dos 3%, com destaque para os reajustes dos preços do milho, da soja e dos suínos.

Decepção

Além da inflação apontando para cima, em meio à inação do governo, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontará nova queda da produção industrial. O tombo, acredita Molan, será de 1,7% em setembro em relação a agosto, quando houve contração de 1,2%. Na comparação com setembro do ano passado, a previsão é de retração de 11,5%, que, se confirmada, será o pior resultado desde abril de 2009.

Na avaliação do economista do Santander, tudo piorou, o que explica as revisões, para pior, da recessão que tomou conta do país. Ele destaca o expressivo declínio da produção da indústria automobilística e de aço em setembro, o menor fluxo de veículos pesados nas estradas e a redução do nível de utilização da capacidade instalada. “Se confirmadas as nossas projeções, a produção da indústria mostrará retração de 3,2% no terceiro trimestre frente aos três meses anteriores, reforçando a nossa expectativa de recuo de 1,1% do Produto Interno Bruto (PIB) no período”, afirma.

Para Molan, o setor manufatureiro continuará em rota de deterioração nos próximos meses, devido aos estoques ainda elevados em diversas cadeias produtivas e aos baixíssimos níveis de confiança do empresariado. Nesse período, era para a indústria estar em franco processo de expansão, por conta das encomendas de fim de ano do varejo. Enfim, o que era para ser motivo de comemoração virou decepção. E não será diferente em 2016. Podem preparar os ânimos.