Na Entrelinhas: A imprensa e os militares

Publicado em Economia

LEONARDO CAVALCANTI

Não deixa de ser simbólico que a principal defesa da atividade jornalística, entre os integrantes do governo Jair Bolsonaro, tenha vindo até aqui de militares. Há uma série de motivos para tal ação. O primeiro é o mais óbvio: ao longo do período da redemocratização, o pessoal da caserna, principalmente aqueles que hoje estão no alto comando, conseguiu uma qualificação poucas vezes vistas no serviço público brasileiro.

 

Se ficássemos apenas nesse ponto, teríamos uma tese para desenvolver, sem tempo nem espaço por ora. Mas isso explica de alguma maneira a defesa dos repórteres, pois sabem que não há possibilidade de uma nação desenvolvida sem uma imprensa forte e livre. Vide, por exemplo, o discurso do tenente-brigadeiro do ar Antonio Carlos Moretti Bermudez, que assumiu na última sexta-feira, o cargo de Comandante da Força Aérea Brasileira (FAB).

 

“Quanto maior for o zelo com a higidez e a intelectualidade de nosso efetivo, maior será o retorno para a sociedade que por ele é protegida”, começou Bermudez, valorizando muito mais aspectos de inteligência do que de força. E completou: “Haveremos de continuar incentivando a perfeita relação com a mídia, que tanto contribuiu para a construção da reputação de nossa Força nesses 78 anos de existência, criando conteúdos relevantes, pois relevante é nossa missão, assim como é determinante o papel da imprensa nesta nossa conexão com a sociedade.”

 

A defesa de repórteres é feita por aqueles que sabem que uma nação só pode ser desenvolvida com o jornalismo valorizado

 

Por mais que se possa enumerar uma ou outra tentativa de desestabilização política de generais – elas ocorreram nos últimos momentos do governo Dilma -, o mesmo poderia ser dito de alguns setores econômicos. Na maior parte do período de redemocratização, porém, os militares mantiveram-se no lugar de militares. E só optaram por Bolsonaro de maneira declarada no segundo turno, ao contrário de categorias como a dos policiais federais.

 

Em relação ao pessoal da caserna, o mesmo ocorreu no discurso proferido pelo ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva. “A presença da mídia nos importa e nos conforta. Mais do que reproduzir notícia, ela nos avisa, nos cobra quando é necessário e sempre ajuda a dar transparência a nossas atividades.”

 

De certa forma, o Ministério da Defesa, unindo as três Forças, está consolidado, por mais que Bolsonaro tenha feito questão de esquecer no discurso o criador da pasta, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. A própria ausência na chefia de um civil no comando do ministério parece pacificada, por mais que uma grita tenha sido estabelecida no momento da posse do antigo comandante da pasta, o também general Joaquim Silva e Luna, durante o governo Temer.

 

Por mais que o discurso de Bolsonaro tenha a clara intenção de manter acesa a polarização partidária em benefício próprio, afinal, a oposição ainda aparece perdida, o jogo para torcida uma hora cansa, caso os resultados não sejam alcançados em algum momento. Um fato: uma parcela do eleitorado anti-PT o defende sob qualquer circunstância — aqui, um mérito do capitão da reserva —, mas tal ação pode não manter a popularidade entre os correligionários, quiçá aumentar a margem de apoiadores para quem não votaram nele.

 

O jogo está ainda no início, nada garante que a tônica será a descrita acima durante os próximos movimentos do Palácio do Planalto, pois, como dizem os próprios apoiadores do capitão reformado, o governo é para defender todos os brasileiros.

 

Brasília, 07h05min